terça-feira, 19 de agosto de 2014

DILMA TEM MAIS A GANHAR NO HORÁRIO POLÍTICO


 
19 de agosto de 2014


por Paulo Moreira Leite


O início da propaganda política, hoje, abre uma etapa decisiva da campanha eleitoral de 2014.

A importância do horário político não deriva do excesso de magia da publicidade mas das carências e omissões do jornalismo brasileiro.

Minha opinião é que o horário político irá permitir a Dilma Rousseff ampliar suas intenções de voto. As últimas pesquisas já mostraram que a presidente está em recuperação junto ao eleitorado. Conforme o DataFolha, ela cresceu 6 pontos na avaliação positiva — e diminuiu 6 pontos na negativa. Estes novos números não apareceram nas intenções de voto, o que é estranho mas pode ser compreensível. O mesmo eleitor que passou a reconhecer méritos no seu governo ainda quer mais um tempo para traduzir essa opinião em intenção de voto. Resta ver como essa melhora de avaliação será traduzida nos próximos levantamentos.

Outro aspecto envolve uma espécie de compensação. Não se trata, apenas, de um maior tempo na TV, o que só costuma ajudar quem tem o que mostrar.

Tratados de forma benigna — para falar o mínimo — pela maioria dos meios de comunicação, a maioria dos candidatos de oposição não deve esperar maiores benefícios a sua imagem em função da propaganda. Há uma certa continuidade entre os dois discursos, mesmo lembrando que são linguagens diferentes. No caso de Dilma, a candidata pode se beneficiar do efeito surpresa, de uma certa novidade. Seu governo não é uma sucessão de maravilhas e pode ser criticado por falhas e defeitos. Mas é, com toda certeza, muito melhor do que o retrato produzido pelos meios de comunicação até aqui.

Não vamos nos iludir. Vivemos num país onde a sociedade não tem direito aos serviços de um jornalismo plural e equilibrado, capaz de respeitar os fatos e retratar a realidade do país de forma isenta. O Brasil está entre as dez maiores economias do mundo, conheceu progressos sociais aplaudidos em toda parte mas tenta-se manter sua população no cativeiro da informação dirigida, da opinião sob encomenda, do pensamento único e da análise unilateral.
Empenhados abertamente em impedir uma quarta vitória consecutiva do bloco Lula-Dilma, que realizou pequenas, quem sabe ínfimas, mas necessárias mudanças numa estrutura de quase cinco séculos, nossos jornais, revistas e emissoras de TV inverteram a fórmula consagrada no lançamento do Plano Real por um ministro do PSDB. Mostram o que é ruim e escondem o que é bom.

Foi possível assistir a uma amostra da postura padrão de nossas emissoras na entrevista de Dilma Rousseff ontem, ao Jornal Nacional. Num esforço para prestar contas a 55,7 milhões de brasileiros que lhe deram seu voto há quatro anos — desculpe, mas não acho que uma presidente é igual a garota propaganda de marca de sabonete — Dilma ouviu questões quilométricas e foi recriminada porque não dava respostas curtas. Várias vezes teve a palavra cortada pelos entrevistadores, a tal ponto que foi obrigada a continuar uma resposta na pergunta seguinte. Chegou a ser advertida de que deveria guardar tempo porque os jornalistas queriam mudar de assunto antes do programa acabar.

Os brasileiros chegam a campanha presidencial depois de passar os últimos meses sendo ameaçados por uma hiperinflação que deveria vir e não veio, por uma Copa que não deveria ser mas foi, por um desemprego que iria explodir mas permanece entre os menores do mundo. A população não sabe o que aconteceu com o programa Mais Médicos. Não foi informada sobre o avanço de obras de infra estrutura de valor histórico, a começar pela transposição do São Francisco, a Transnordestina.

Ouve falar que é preciso investir em educação mas não teve direito a saber o que é Pronatec nem tem um balanço do Pro Uni.

O jornalismo em vigor na maioria das emissoras brasileiras mudou o caráter do horário político. Ele oferece, hoje, informações sobre seu país que o noticiário padrão só apresenta de forma distorcida ou simplesmente omite.
É ali que se pode encontrar o contraponto ao pensamento único.

Tenho certeza de que muitos eleitores serão surpreendidos com novidades que irão aparecer durante a propaganda política. Irão descobrir um país que desconheciam.
Muitas pessoas acham o horário político uma chatice insuportável — eu concordo muitas vezes — mas convém lembrar: é só ali que candidatos a governar o país têm direito a palavra sem restrições de qualquer natureza. Seu limite é o tempo, que varia conforme a representatividade eleitoral de cada um, o que é um critério bastante razoável, vamos combinar.

Também é ali que o eleitor exerce direitos que deveriam ser elementares numa escolha democrática: ouvir os candidatos, conhecer suas realizações e propostas, comparar. É, a rigor, uma liberdade com poucos paralelos no mundo, onde a propaganda política deve ser paga, e cada minuto precisa ser comprado como qualquer anuncio comercial — o que assegura ao poder econômico privado um papel determinante sobre o debate político, os rumos da democracia e do futuro dos cidadãos e suas famílias.

Conquista do país após a democratização, a propaganda política é alvo permanente de ataques das próprias emissoras, o que chega a ser espantoso. Elas não têm prejuízo, recebendo uma espécie de indenização pelo dinheiro que, em teoria, iriam de receber caso pudessem explorar aquele horário com propaganda.

Titulares de uma concessão pública, há emissoras que empatam seus ganhos e perdas durante a campanha. Algumas até recebem, como indenização, mais do que teriam direito no mercado — pois jamais seriam capazes de faturar o prejuízo declarado.

Mas não se conformam, o que só revela a dificuldade de conviver num ambiente no qual a população tem o direito de ouvir, sem intermediários, a voz daqueles que são representantes dos poderes soberanos da nação.




Paulo Moreira Leite é diretor do 247 em Brasília. É também autor do livro "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA, IstoÉ e Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa". 
 
 
Brasil 247

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