quinta-feira, 28 de maio de 2015

Grupo da USP denuncia Abril, Globo e projeto tucano de censura a professores

publicado em 26 de maio de 2015 às 09:26


Grande queima de livros pelos nazistas em 1933


O que seria o “ensino ideológico”? O que seria o “assédio ideológico”?

Estas duas questões se colocam com a tramitação na Câmara dos Deputados do Projeto de Lei (PL) 1411/2015, o qual prevê condenação ao “assédio ideológico” no ensino no Brasil. O PL é de autoria de Rogério Marinho (PSDB). Nas suas palavras: “A escola e o ambiente acadêmico precisam ser blindados de qualquer assédio ideológico e partidário, um crime covarde. É preciso garantir a liberdade de aprender”.

No Rio de Janeiro, o Deputado Flavio Bolsonaro já tinha apresentado em 2014 o PL “Escola sem Partido” para defender o “direito dos pais a que seus filhos menores não recebam a educação moral que venha a conflitar com suas próprias convicções“.

Sabemos que certos “moralistas” querem mesmo é um homeschooling homofóbico e racista. O ridículo das propostas costuma levá-las ao esquecimento em condições “normais”, mas num ambiente político em que o Congresso Nacional reverte até direitos trabalhistas e sociais que também julgávamos conquistados, qualquer pantomima fascistoide de um parlamentar nos preocupa.

O ambiente escolar e acadêmico são alvos privilegiados do assédio ideológico e partidário, ao menos nas gestões tucanas em São Paulo e no Paraná.

O aparelhamento (e sucateamento) da Universidade de São Paulo após vinte anos de governo do PSDB é notável, como, ademais, se dá em outras instâncias do estado. Estão frescas na memória de muitas e muitos as cenas bárbaras protagonizadas pela polícia de Beto Richa nas ruas de Curitiba contra os professores em greve. Não houve qualquer panelaço revoltado em seu nome!

A PM de Alckmin não fica para trás: a forte repressão das greves estudantis de 2009 e 2011 na USP com direito a cavalaria, esquadrão anti-bombas, choque e soldados suficientes para cercarem homem a homem o prédio da reitoria e o CRUSP foi digno da ditadura militar, deixando claro um dos mecanismos de funcionamento da democracia racionada.

Tampouco estes estudantes tiveram qualquer solidariedade, antes sofreram represálias da grande imprensa e dos sensacionalistas! A tática do governador agora é, para além da repressão, a negação da existência da greve de professores (assim como o faz com a crise hídrica). A negação é um dos estágios do luto…

Outra expressão da manipulação ideológica no ambiente acadêmico se dá através dos critérios das agências de fomento à pesquisa.

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), por exemplo, também é uma instituição dos vinte anos de aparelhamento do estado pela direita tucana.

A seleção ideológica de direita ali se vale de camuflagem científica, a qual se opera através da desqualificação de estudos marxistas, os quais são acusados de não serem científicos por conterem princípios ideológicos.

Misturam-se a ignorância e a má fé nesta argumentação!

Toda e qualquer abordagem científica carrega ideologia em seu bojo. O referencial teórico marxista é caracterizado por um severo grau de cientificidade, justamente por reconhecer e assumir que é construído através de uma visão de mundo e com vistas a uma intervenção neste mundo.

Retornemos ao “ensino ideológico”.

De acordo com a direita brasileira, todo e qualquer ensino questionador, orientado teoricamente, com posição política do docente assumida, seria ideológico.

Ora, reproduzir o senso comum e impedir que as coisas mudem, não é um assédio ideológico? Não é uma posição política? A manutenção do status quo, ainda que dissimulada por um falacioso discurso de neutralidade, é sem dúvida um assédio ideológico. A ideologia, como a política, está em tudo!

Na justificação do PL 1411/2015, assim escreveu o deputado Rogério Marinho:

“A forma mais eficiente do totalitarismo para dominar uma Nação é fazer a cabeça de suas crianças e jovens. Quem almeja o poder total, o assalto à Democracia, precisa doutrinar por dentro da sociedade, estabelecer a hegemonia política e cultural, infiltrar-se nos aparelhos ideológicos e ser a voz do partido em todas as instituições. Para eles, é preciso calar a pluralidade, a dúvida saudável e substituir a linguagem, criando um ambiente onde proliferam mitos, inversões, clichês, destruição de reputações e conflitos desnecessários. Para o totalitarismo vingar, é preciso destruir a coesão social e as tradições da sociedade. Por isso, partidos autoritários necessitam calar a imprensa e os meios de comunicação, dominar o sistema de ensino, estabelecer a voz única, enfim, a hegemonia decantada por Antônio Gramsci (filósofo e político Italiano – 1891-1937). Esse expediente estratégico foi utilizado para a conquista e manutenção de poder dos fascistas, nazistas, comunistas e ditadores por várias nações. Hegemonia política significa que a voz do partido deve ser ecoada em todos corações. Por isso, a propaganda desonesta, o marketing mentiroso, a idolatria por indivíduos, a falsificação da realidade e a tentativa de reescrever a História, forjando o passado.” Narciso apenas consegue enxergar o seu espelho!

O projeto de lei deste parlamentar tucano não se caracteriza, justamente, por calar a “pluralidade” e a “dúvida saudável” ao censurar os profissionais formados para suscitar o espírito crítico na escola, seu lugar de excelência?

Talvez a tarefa de pensar e intervir na sociedade para o deputado caiba apenas aos meios de comunicação amigos de seu partido. O pensamento único se manifesta neste assédio ideológico que é tal PL!

É a “falsificação da realidade” que Marinho acusa. Assalto à democracia através da mentira e deturpação conceitual (comentar a sua leitura capciosa de Gramsci seria desperdício de tinta).

A Revista Veja, anos atrás, veiculou matéria denunciando o que chamou de “doutrinação marxista”.

Quando tentaram restringir a sala de aula brasileira de “conteúdos políticos”, em nome da defesa nacional contra “o perigo vermelho”, o que se viu foi a exclusão da Filosofia e da Sociologia do currículo, bem como a deturpação da disciplina de História, em nome das intervenções ideológicas, travestidas de disciplinas escolares, chamadas de Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política Brasileira.

Duplo assédio: ideológico no colégio, físico e direto nas ruas! Aquelas disciplinas só serviram a um fim: produzir livros didáticos de baixa qualidade escritos por militares que se locupletaram juntamente com empresas editoriais.

A Rede Globo, com as palavras de Ali Kamel, também denunciou “conteúdo subversivo” em seus órgãos. Os interesses da Editora Abril e da Globo conseguem ser menos nobres ainda do que os dos setores golpistas em 1964!

A sua estratégia macarthista, para além de agradar o gosto de seu público imbecilizado, corresponde aos interesses de grandes grupos produtores de material didático, em que se incluem os próprios conglomerados citados, tendo em vista retirar de mercado livros já consolidados no Ensino de História.

A escola também é, por definição, um espaço de formação, tal qual a família ou a religião do aluno (para aqueles que professam alguma fé). E formação é um momento de construção de pensamento crítico.

Enganam-se, e enganam aos outros, aqueles que acreditam que a liberdade de aprendizado se opera em uma sala de aula censurada. A ideologia hegemônica não é imposta por professores e professoras, de resto espancados e mal pagos, mas sim por organismos midiáticos que, apoiados em concessões públicas ou em vultosas assinaturas para distribuição de seus escritos no ensino básico, possuem a plena liberdade para a mentira. Eis o real assédio!

Contra a escola sem partido, preferimos a sala de aula sem censura!

PS do Viomundo: O Gmarx surgiu em 2009 como grupo de pesquisa com o objetivo de discutir os vários marxismos no âmbito da Universidade. Ele congrega estudantes de graduação e pós-graduação, professores universitários, mas também estudantes ou autodidatas de fora da universidade.

O Gmarx se posiciona publicamente na defesa dos valores humanistas, da educação pública gratuita para todas as pessoas, a favor de cotas e procura integrar prioritariamente mulheres e negros, reconhecendo suas dificuldades em atingir tais objetivos.



Viomundo

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