sexta-feira, 29 de julho de 2016

Ciro: sou candidato

Como Cunha e Temer operavam os jabutis das medidas provisórias


publicado 28/07/2016


O Conversa Afiada reproduz trechos da entrevista que Ciro Gomes deu a Mino Carta, no Facebook da Carta Capital.

Foi um relançamento do programa "Cartas na mesa", que Mino dirigiu e apresentou na TV Record - e que saiu do ar no glorioso período da “redemocratização”, por ordem do então ministro das Comunicações, Antônio Carlos Magalhães, que Tancredo escolheu e Sarney manteve:


- Eu sou candidato. Sou candidato a presidente do Brasil. Quero ser. Acredito que amadureci, tenho condição de servir ao país oferecendo uma alternativa de projeto ao país e, naturalmente, uma vivência com a experiência que eu já tenho. Eu sei que esse "querer forte" que eu tenho de ser presidente do Brasil não é suficiente. É preciso que a candidatura tenha alguma naturalidade, que ela seja recebida pela sociedade brasileira como útil à construção de um debate. Mas a minha vontade firme é de ser.

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- Eu luto pelo dia em que nosso povo acorde, levante-se. E ainda tá em tempo. Não estamos defendendo o governo Dilma. Nós estamos defendendo o direito de nós, o povo, mandarmos no nosso destino.

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- O PT tá paralisado. Tá meio catatônico, meio paralisado, porque você tem um lado que, infelizmente, chafurdou no pragmatismo irresponsável e corrupto. E esse lado se sente autorizado a isso, porque testemunhou a vida inteira o outro lado fazer. Só que ele nunca aprendeu duas coisas. Primeiro, que o outro lado fazia porque fazia parte do grande lado plutocrata brasileiro e era por ele protegido. (...) A turma do PT, de um certo momento, se imaginou sócia também. Foi um ledo engano. Porque o pecado do pecador, você desculpa, você perdoa. Mas o pecado do pregador, que passa o dia inteiro falando da moralidade, da lei, se oferecendo como vestal e exemplar... Esse é um lado. O outro, sofre o constrangimento da solidariedade com esse primeiro. Então eu imagino companheiros queridíssimos meus, gente séria (...) estão comendo o pão que o diabo amassou, envergonhados. Mas a saída não é essa catatonia. É ir à luta!

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Mino: Digamos que Dilma volte à presidência. O que a espera de fato? A possibilidade de governar é remota...

Ciro: Não remota. Há uma aversão muito poderosa na medida que ela, no primeiro dia de governo, num presidencialismo altamente patológico como o nosso, ela não consegue juntar um terço dos deputados, ficou essa sensação de que ela não é capaz de governar. Mas o presidencialismo, que tem todos os seus defeitos, tem essa virtude: se ela volta, ela terá voltado porque a maioria do povo constrangeu o Senado Federal a recuar desta aventura golpista.

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- Tenho três razões para não me entusiasmar com essa ideia do plebiscito. Embora compreenda a nobreza que é trazer o povo para resolver este colapso que a elite política brasileira está produzindo de forma absolutamente enojante. É simpático, é charmoso, mas quais são as três ideias? Uma, é objetiva (...) Eu sou um possível candidato? Como é que eu vou, agora, sendo interessado no assunto, defender que se antecipem eleições? Eticamente eu me sinto inibido de defender uma coisa que parece que atende ao meu interesse, ser candidato. Segundo, o que importa nestas questões de confusão é o apego à regra. O apego à regra não é irrelevante. Suponha que amanhã o brasileiro me escolha a ser o presidente. Portanto eu preciso da regra muito forte, muito respeitada, para eu encostar minhas costas e brigar só pela frente. E terceiro, vamos ao pragmatismo de quem conhece o ramo: para isso passar, teria que o congresso por dois terços, ainda fortemente influenciado pela picaretice do Eduardo Cunha. Isso não passa. (...)

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- O que tá armado é que esse golpe não foi feito a favor do Michel Temer. Foi feito contra nós. Contra a Dilma. Contra o povo brasileiro. Contra o interesse nacional. Se o Michel Temer fracassar, como é provável, eles vão é cassar a chapa Temer-Dilma de dezembro pra frente, e vão fazer esse Congresso votar pela via indireta.

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- Isso tudo está aí porque o que tá aí atende aos interesses da minoria organizada, ativa, informada, e nós outros somos o povo que só serve na véspera da eleição. Aqui está a chave: você tem que fazer duas ou três reformas só, convocar a sociedade diretamente para ajuizá-las através de coisas que estão previsas na constituição - plebiscitos e referendos, que são a prática moderna no mundo inteiro, e que a elite brasileira, para manter as coisas como estão, estigmatizou como chavismo.

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- Agora, o monopólio das mediações midiáticas já não existe mais. Nós estamos falando aqui e, se eventualmente houver alguma coisa mais interessante, as pessoas vão replicar essa nossa conversa por todo o mundo. Ou seja, não estamos mais vulneráveis ao que a Dona Globo mandou dizer e engolimos à força. 

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Sobre o Judiciário:

Mino: Não lhe caberia defender a lei? Ser uma espécie de sentinela da Constituição?

Ciro: Essa é a grande tarefa do Supremo, que é o guardião da Constituição. (...) Porém, eu o absolvo relativamente, porque eu não gosto da ideia de judicializar a política. Agora, é fato claro que, se se está cassando uma Presidenta da República sem o cometimento de crime de responsabilidade, claramente é tarefa do Supremo Tribunal Federal esclarecer isso. Nem que seja para afirmar que isso é crime de responsabilidade e mudar a orientação da lei. Mas hoje, é preciso não culpar ainda o Supremo, porque isso será apresentado ao Supremo se o Senado consumar esse desatino.

- Juiz bom não é juiz xerife. Juiz bom é o juiz severo, que fala nos autos, que sustenta suas decisões com base na lei interpretada de forma absolutamente clara e transparente, que obedece aos princípios gerais do Direito.

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Mino: Quem manda mais: Cunha ou Temer?

Ciro: Cunha. Tá em declínio, decadência franca, o Temer já o está traindo, como é da natureza de um traidor - trai um, trai mil. Mas ele é homem do Cunha. Eu sei bastante bem o que tô lhe dizendo.

Mino: Me diga mais, então.

Ciro: Se quiserem, qualquer pessoa pegar na internet e procura, no período que eu fui deputado. Eu fui colega do Michel Temer, então presidente da Câmara, e colega - olha como eu me odeio, fui obrigado a chamar o Eduardo Cunha de Vossa Excelência, colega dele. Mas também chamei ele de ladrão a uma distância menor que essa. Fui processado por ele, sustentei na Justiça, porque eu sei que ele é, e hoje o Brasil inteiro tá sabendo, e ele usou o Michel Temer como testemunha dele, no processo. Não por acaso, o sócio dele. Mas eu também sei dele andando aqui em São Paulo com saco de dinheiro, os dois juntos, resolvendo problemas de políticos e etc. Essa equação basicamente funcionava, antigamente, assim: o Michel pegava uma Medida Provisória que o governo mandava - ele presidente da Câmara - entregava pro Eduardo Cunha relatar, Cunha pegava qualquer interesse dos lobbies plutocratas do Brasil, enxertava em assuntos absolutamente impertinentes uma emenda que atendia aos interesses desses grupos plutocratas, e recebia o dinheiro e distribuía pros colegas. (...) Eles chamam de jabuti, na Câmara. No Minha Casa Minha Vida, acho que foi, ele apresentou uma emenda - foi quando eu chamei ele de ladrão - criando um crédito retroativo de devolução do IPI-Exportação, com lobbista da FIESP andando lá dentro - eu apontei ele lá - equivalente a quase 80 bilhões de reais. Deve ter levado aí uns 500 mil ou 50 milhões, eu sei lá quanto. Embora tenha sido vetado depois, eu pressionei, fui à tribuna, esculhambei e tal. E ninguém liga. Mas depois ele foi se especializando. Aí ele foi replicar o que ele já tinha feito lá atrás, com Collor, em que ele teve a TELERJ no Rio e saiu debaixo de escândalo. Conseguiu do Lula, na chantagem - e isso eu não perdoo o Lula - dominar Furnas.

Mino: Mas por que chantagem?

Ciro: Chantagem porque forçou a mão. O Lula me disse. Eu disse pra ele, "Lula, esse cara é um bandido, cê não vai entregar Furnas pra ele que ele vai dominar a Câmara". Esse é o meu sofrimento. (...) Ele falou "não, não vou dar de jeito nenhum". No dia seguinte, nomeou. Nomeou o cara pra Furnas. Aí... Furnas distribuiu 60% da energia brasileira.

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Mino: Mas o que ele tinha na mão?

Ciro: Não creio que no caso do Lula fosse uma denúncia, não. Agora, do que ele tem na cozinha pro Michel Temer, ele tem o Temer na mão. E ele sabe de 1500 coisas imundas do Michel Temer que o derrubariam. (...) No caso do Lula, acho que foi (...) apoio no Congresso.

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Sobre Temer:

- Ele é uma grande mentira. (...) E ele é basicamente o representante desse lado fisiológico, clientelista e corrupto do PMDB. E o país precisa de uma coisa oposta. Parte da decepção do povo com Dilma é a frustração em função de escândalos. Ele vai responder pela decência? Só ver o Governo que ele montou, é uma quadrilha! Com exceções aí, o Meirelles não é da quadrilha, tem alguns que não são, mas o resto é quadrilha. (...) Mas se você olhar Moreira Franco, Romero Jucá, Eliseu Padilha, isso é gente de coisa muito ruim. Coisa muito ruim e velha, antiga, sabe? Manjada. Não é possível esperar daí nada se não escândalo, falta de austeridade e tal.

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O Meirelles é, basicamente, um homem de banco. Boa pessoa, não o vejo numa categoria tão deplorável como o conjunto do Governo - a partir do próprio Temer.

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Se a população não quer defender a Democracia em abstrato, venha defender o seu emprego, seu direito de ir pra casa depois de 8 horas de trabalho, de ser remunerado por hora extra, de receber licença-maternidade... Tudo isso pode ser revogado e você terá que trabalhar 12 horas por um salário menor.

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Esse neoliberalismo mofado do Brasil quer repor a ideia do trabalho como uma commodity. 

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Precisamos cobrar um tributo - que FHC revogou - sobre heranças e doações e um tributo sobre lucros e dividendos - o Brasil é o único país da OCDE que não tem.

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O melhor é criar um mecanismo de financiamento de cooperativas de jornalistas, produtores culturais, mudar a lógica de distribuição da verba publicitária - para que ela não seja proporcional à audiência, mas crie estímulos à inovação, à rebeldia. Isso tudo eu sei fazer e funciona.

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A propriedade cruzada de meios é uma perversão que o país precisa interromper.


Conversa Afiada

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