terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

O “mini-crash” e nós



POR FERNANDO BRITO · 05/02/2018




Afora o óbvio de que os mercados de câmbio e a Bolsa, amanhã, abrirão em forte baixa, é claro que ninguém pode prever com exatidão o que vai se desenhar depois do terremoto desta segunda-feira na Bolsa de Nova York.

É muito pouco dizer, como fazem alguns comentaristas, que foram as estatísticas de emprego, melhores do que as previsões, as responsáveis pela queda abrupta dos preços das ações, pelo medo de que isso gere inflação interna nos EUA. Embora em alta, a subida tem sido sua e a taxa anda por volta do que, para os padrões locais, está dentro do normal, algo em torno de 2% ao ano.

Também é precipitado dizer que o desabamento das ações deveu-se à saída de Janet Yelen , hoje cedo, da presidência do Federal Reserve, o poderoso Banco Central dos EUA. Afinal, seu sucessor, Jerome Powell, até agora não tugiu nem mugiu sobre a mais que esperada alta dos juros.

Há outros fatores, a começar pela aparente bolha de otimismo que a reforma fiscal de Donald Trump – que cortou os impostos sobre lucros – criou na valorização das ações de empresas norte-americanas. Desde que ele a anunciou, no final de abril de 2017, o índice Dow Jones subiu – até quinta-feira passada – mais de 25%. 25%, em dólar, é uma enormidade.

Um alta deste tamanho, como sangue na água, coloca os tubarões do mercado em frenesi alimentar.

O baque da bolsa nova-iorquina, hoje, não se deveu a algum incidente: uma ataque terrorista, o início de um conflito, uma decisão da Opep elevando preços de petróleo, a eleição de um governo hostil aos EUA, nada deste tipo.

Ele navega em águas mais profundas, que não é possível divisar perfeitamente até aqui, exceto para dizer que o fluxo de capitais passa a ser mais de cá pra lá do que, como antes, de lá pra cá.

A primeira consequência é – ou deveria ser – uma decisão prudente do BC brasileiro de interromper a sequência da taxa de juros, o que não parece provável, dado o engajamento da equipe econômica deste governo no “agora a coisa vai” da tal retomada econômica.

Seja para investir em ativos acionários subitamente desvalorizados nos EUA, seja para os títulos com juros turbinados (ao menos um pouco) lastreados em dólar, a tendência é que aqui passemos a ter de dar mais, muito mais, para atrair o capital estrangeiro.

O BC terá que fazer de tudo para manter o real estável, sem o que as privatizações anunciadas tornam-se caras: estamos vendendo em real e os compradores são em dólar.

Como disse ao início, não dá para fazer previsões antes de saber que o mercado norte-americano vai se acalmar ou se o que aconteceu sexta e hoje são as linhas de uma espiral.

O fato é que uma perda de tamanho valor num mercado gigantesco como o norte-americano significa fazer “desparecer” dinheiro, numa ideia estranha a nós, mortais, que achamos que ele sai de uma mão e vai para outra, mas continua a existir fisicamente. No mercado de papéis, ao se vender na baixa, ele desaparece de imediato da conta de quem vende e só surgirá na mão de quem compra se e quando se revalorizar.

Capital financeiro é como “bitcoin”: só existe quando você acredita nele e negocia com ele.


Tijolaço

Nenhum comentário:

Postar um comentário