24 de Março de 2019
Por Leonardo Attuch
O maior problema da elite brasileira hoje se chama Jair Messias Bolsonaro. Sim, Bolsonaro não é um problema apenas para o povo brasileiro, que sofre com o maior desemprego da história e um governo que parece ser incapaz de apresentar qualquer proposta capaz de viabilizar a retomada do crescimento. Bolsonaro é um problema sobretudo para as forças que o colocaram no poder.
Comecemos pelos produtores rurais, que se animaram com a possibilidade de "fuzilar a petralhada", acabar com a fiscalização ambiental e enquadrar como "terroristas" movimentos sociais como o MST. O instinto selvagem da turma deu com os burros n'água. A União Europeia já avisou que não avançará em acordos comerciais com o Brasil, em razão da perplexidade que o bolsonarismo provoca no mundo civilizado. Acossada pelos Estados Unidos, a China trocará a soja brasileira pela dos produtores americanos. E os países árabes já começaram a retaliar o Brasil em razão da nova política externa, que quebra a tradição do Itamaraty e chancela agressões do governo de Israel aos palestinos. Hoje, Bolsonaro é o maior inimigo do agronegócio brasileiro. Ernesto Araújo, o chanceler, apenas segue suas ordens.
Passemos, pois, ao sistema financeiro. Toda a aposta da Avenida Faria Lima em Bolsonaro estava ancorada numa premissa falsa: a de que ele comandaria a chamada 'reforma da Previdência', que transfere a poupança pública do INSS para os bancos privados. Depois do embate deste fim de semana entre Bolsonaro e Rodrigo Maia, já está mais do que claro que o presidente não tem nenhum interesse em aprovar uma reforma que é extremamente impopular. Bolsonaro já disse que não foi eleito para mexer nas aposentadorias e apenas mantém as aparências quando sinaliza apoiar o plano de Paulo Guedes. Dentro de algumas semanas, cairá a ficha e até seu superministro da Fazenda perceberá que foi usado.
Os meios de comunicação conservadores também merecem um capítulo à parte. Todos endossaram a farsa, criada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de que o segundo turno da eleição seria disputado entre dois extremos, quando a realidade opunha um professor moderado, já testado na prefeitura de São Paulo, e um candidato de extrema-direita. Em peso, a mídia fechou com Bolsonaro porque temia a 'regulação dos meios de comunicação' proposta pelo Partido dos Trabalhadores. O que faz Bolsonaro? Corta a publicidade, avança na comunicação direta com o público e elege grupos de comunicação e jornalistas como seus principais inimigos.
O Congresso Nacional também sai extremamente fragilizado da eleição de Bolsonaro. Hoje, todos aqueles que endossaram o atentado à democracia comandado por Eduardo Cunha, Aécio Neves e Michel Temer e deram "tchau, querida" devem estar arrependidos. A política foi criminalizada, não existe mais o chamado presidencialismo de coalizão e quem quiser algum cargo terá que negociar com o general Santos Cruz. Cunha e Temer estão presos. Aécio virou um zumbi no parlamento.
Chegamos então aos militares. Em tese, foram os grandes vencedores. Ocupam hoje os cargos abertos com a chamada "despetização" da máquina pública e estão praticamente fora da reforma da Previdência (que não passará), mas o Brasil nunca foi tão subalterno como agora. Se antes do golpe os militares ainda desfrutavam de uma boa imagem na sociedade, o risco que correm hoje é gigantesco. Bolsonaro é o presidente pior avaliado em seus primeiros meses e a corrosão de seu capital político se dá numa velocidade inédita.
Diante desse quadro, o Brasil já voltou a funcionar em modo golpe. No sábado, Merval Pereira, principal colunista do Globo, disse que Bolsonaro é um "sem-noção" e avisou que placas tectônicas da política começaram a se mover – o que talvez signifique que a Globo esteja se movendo. Na terça-feira, a Federação das Indústrias reunirá 500 empresários em torno do vice Hamilton Mourão. Aliás, os empresários industriais também sofrem com a estagnação econômica de um país que não cresce há mais de quadro anos – ou seja, desde quando começou a ser tramado o golpe contra a ex-presidente Dilma Rousseff.
O fato é que a elite já busca um caminho para se livrar de Bolsonaro, que, por sua vez, tentará se segurar nas redes sociais e também com o apoio que tem da administração de Donald Trump. Hoje, Bolsonaro só não é um problema para os Estados Unidos.
Brasil 247
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