segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

O Estadão reedita o “boimate” para atacar o Prerrogativas


Aí o repórter pega o seu “suponhamos” e vai consultar a assessoria de Lula, que diz que ele sequer confirmou sua candidatura, muito menos iniciou a construção do governo.


Publicado em 17 de janeiro de 2022


A história se tornou um clássico do jornalismo. Veja acredita em um primeiro de abril de uma revista científica europeia, que anuncia o cruzamento de boi com tomate que gerou um hambúrguer suculento. Pede ao jovem repórter para repercutir com um especialista. O especialista diz que é impossível. enrolado, o repórter insiste: “mas se fosse possível?”. O especialista ironiza: “Então seria a maior revolução na história da biologia”. Na edição publicada, atribui-se a frase ao especialista, sem explicar que era ironia.

O “boimate” ressusgiu hoje, nas páginas do Estadão.

O grupo Prerrogativas é um conjunto de advogados, a maioria criminalistas, criado em reação à Lava Jato.

O Estadão é um jornal que critica a Lava Jato nos editoriais, mas é o principal instrumentalizador da operação, publicando com destaque – e acriticamente – seus releases.

Recentemente, o Prerrogativas bateu pesado em Sérgio Moro, por sua proposta de reforma do judiciário. O aquário do Estadão planejou, então, uma reportagem para atacar as propostas do Prerrogativas de reforma do Judiciário e do MInistério Público. Havia só um problema: o grupo jamais elaborou uma proposta nesse sentido.

A maneira como o jornal resolveu o dilema será conhecido, no futuro, como um clássico desses tempos bicudos.

A ordem foi:
Vamos cair matando em cima do projeto de reforma do Prerrogativa.
Mas se ele não tiver?
Basta supor que tenha.

E foi assim que a segunda matéria mais relevante da home do Estadão tem por título “Advogados anti-Lava Jato propõem a Lula reforma dos conselhos da Justiça e do MP”. E a adoção do juiz de garantias.

São temas caros aos advogados, sim. Mas que nunca foram transformados em propostas.

Mas, supondo que existisse a proposta, o jornal foi ouvir o ex-ministro Carlos Velloso – fonte em permanente disponibilidade, quando se necessita de alguém para defender a Lava Jato.

Velloso disse desconhecer a proposta que não existia. Mesmo assim,

“Não conheço os termos da proposta. Assim, não tenho o que opinar relativamente ao seu mérito. Todavia, sempre receio proposta de reforma de órgão de controle do Ministério Público, do Judiciário, dos advogados e da imprensa. Sempre há um desejo oculto por trás. E é surpreendente que uma tal proposta venha de associação de advogados”, afirmou.

Mais surpreendente foi a sequência da reportagem:

“Após formulada, a proposta de mudanças no sistema de Justiça será sugerida e poderá integrar o plano petista para 2022”.

Como assim? Se ainda não foi formulada, significa que não existe. Mesmo assim, o repórter afirma que participarão das discussões “criminalistas sem filiação partidária ou ligação com o PT, como Alberto Toron, que defende o deputado Aécio Neves (PSDB-MG), e Antônio Claudio Mariz de Oliveira, advogado do ex-presidente Michel Temer (MDB)”. E com base nesse “suponhamos”, foi pedir a confirmação de Mariz que respondeu que

ainda não foi chamado, mas que o Prerrogativas tem “muito a colaborar para qualquer governo que entrar, quer seja do Lula, quer seja de outro candidato”.

Para engrossar o caldo, o repórter “supôs” que a base do projeto que não existe será a proposta de PEC do deputado Paulo Teixeira (PT-SP). E joga a armadilha do “suponhamos” para o pobre presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Ubiratan Cazetta.

Sem conhecer o projeto que não existia, Cazetta diz o debate sempre é bom, mas as premissas do projeto que não existe, mas o jornal supõe” que existe, são erradas.

Outro entrevistado, o impetuoso procurador Bruno Calabrich – que acreditava tanto na mídia quanto a mídia na Lava Jato – aproveita o “suponhamos” levantado e bate de prima em uma narrativa com tanta credibilidade quanto uma delação premiada:

“Merece nosso repúdio, tanto como procurador como cidadão. Essa proposta não atende o interesse público, mas pode atender o interesse de réus investigados que temem um MP independente”

Pensam que parou por aí?

Segundo advogados do Prerrogativas, de acordo com a suposição do Estadão, outro ponto a ser levado adiante é a incorporação do juiz de garantias ao Código de Processo Penal.

Aí o repórter pega o seu “suponhamos” e vai consultar a assessoria de Lula, que diz que ele sequer confirmou sua candidatura, muito menos iniciou a construção do governo.

Finalmente, foi ouvir Sérgio Moro:

Sérgio Moro disse desconhecer detalhes de “qualquer proposta do PT para a reforma do Judiciário ou do Ministério Público”, mas chamou a iniciativa de “ameaça à democracia”


GGN

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