"Convulsão social haverá, não se Lula for libertado, mas se este estado de completa anomia social, implantado no país pela nova ordem, não for contido a tempo, para impedir que o desespero provocado pelo desemprego e pela fome leve a população a fazer justiça com as próprias mãos", escreve o jornalista Ricardo Kotscho sobre o julgamento pelo STF da prisão em segunda insstância. "Só Lula inocentado e livre, com todos os seus direitos políticos, poderá ainda evitar o pior"
17 de outubro de 2019
Por Ricardo Kotscho, no Balaio do Kotscho e para o Jornalistas pela Democracia
“Não estou reivindicando essa discussão de segunda instância. Não estou interessado nisso. Não quero progressão de pena, quero a minha inocência. Não tem meio termo comigo. O que eles vão fazer? Antigamente, era mais fácil. Mandava esquartejar, salgar, pendurar no poste. Cometeram a bobagem de me prender, cometeram a bobagem de me acusar, agora vão ter que suportar esse peso aqui dentro”, desabafou Lula, em entrevista ao UOL, publicada nesta quinta-feira.
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Manter Lula preso ou libertar Lula é o que está em jogo, mais uma vez.
No julgamento que começa esta tarde em Brasília, o Supremo Tribunal Federal terá que decidir se cumpre a Constituição ou cede novamente às ameaças tuiteiras do general Villas Bôas.
Como fez antes da eleição, às vésperas do julgamento de um habeas corpus para Lula, este general de pijama, gravemente enfermo, voltou a acenar com o risco de “convulsão social” e colocar as tropas nas ruas, se o ex-presidente for colocado em liberdade, como manda a lei.
Quem Villas Bôas pensa que é, para dar ordens a um país de 208 milhões de habitantes, intimidando os ministros do STF, como se estivesse lidando com tropas inimigas numa guerra sem quartel?
Desde o fim da Guerra do Paraguai, as Forças Armadas brasileiras só se mobilizaram para combater o “inimigo interno”.
Foi assim em 1954, com Getúlio; em 1964, com o golpe militar e, em 1968, com o golpe dentro do golpe do AI-5, que agora os bolsonaristas querem de volta.
Mero assessor do Gabinete de Segurança Institucional do general Augusto Heleno, uma boquinha que lhe arrumaram quando passou para a reserva, Villas Bôas deveria ser preso e processado por insubordinação, se ainda vivêssemos numa democracia, como foi o então tenente Jair Bolsonaro, pelo mesmo motivo.
Para se entender o poder que o general aposentado ainda tem, é preciso lembrar o que lhe disse o presidente Bolsonaro, ao se agachar diante dele, na posse do ministro da Defesa, Azevedo e Silva:
“Meu muito obrigado, comandante Villas Bôas. O que nós conversamos morrerá entre nós. O senhor é um dos responsáveis por eu estar aqui”.
Se chegamos a essa situação hoje, em que o Supremo julgará se o preso tem direito a recorrer em liberdade até o processo transitar em julgado, na última instância, uma cláusula pétrea da Constituição, que vem sendo desrespeitada, é porque os que são “responsáveis por eu estar aqui” pavimentaram sua vitória, como o professor Eduardo Costa Pinto, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, relata no artigo “Bolsonaro e os quartéis: a loucura como método”, publicado em abril deste ano.
Costa Pinto mostra como Villas Bôas foi o mentor do “golpe branco” que levou Bolsonaro à vitória, ao emparedar o STF e o TSE para que Lula não pudesse ser candidato.
Os 11 ministros do STF terão agora uma oportunidade histórica neste julgamento, e nos outros que envolvem a libertação de Lula, de dar um basta às ameaças dos militares e aos desmandos da Lava Jato, que rasgaram a Constituição e deixaram as instituições em frangalhos.
Convulsão social haverá, não se Lula for libertado, mas se este estado de completa anomia social, implantado no país pela nova ordem, não for contido a tempo, para impedir que o desespero provocado pelo desemprego e pela fome leve a população a fazer justiça com as próprias mãos.
Só Lula inocentado e livre, com todos os seus direitos políticos, poderá ainda evitar o pior.
Vida que segue.
Brasil 247
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