domingo, 24 de julho de 2011

O Brasil de Juan Arias, por Marcos Coimbra


Por Marco St.

Atualizado às 16:04

O Brasil Visto de Fora

Marcos Coimbra

Passamos um pedaço da semana ocupados com um assunto menos importante que parece. Foi suscitado pelo correspondente do jornal espanhol El País, em artigo em que discorria sobre sua dificuldade de entender por que os brasileiros não ficam “indignados” com o Brasil. Em especial, por que não saem às ruas para protestar contra a falta de ética e a corrupção.

O texto foi republicado por O Globo, três semanas depois de ter saído na Espanha. Parece que a direção do jornal carioca ficou indignada com a falta de repercussão do texto original. Resolveu traduzi-lo e mandou fazer reportagem de capa a respeito do tema.

O autor, Juan Arias, deve ter ficado satisfeito com a deferência de seus colegas. Voltou à discussão na terça feira, dessa feita em matéria intitulada “A imprensa se converte no paladino contra a corrupção no Brasil”. Titulo tão surpreendente para quem conhece as corporações da mídia brasileira que só pode ser explicado como retribuição ao destaque que recebera.

Suas ideias foram encaixadas no modelo de interpretação de nossa realidade que é típico das redações dos grandes jornais. Nele, tudo é explicado a partir de uma premissa: os males do Brasil são culpa de Lula e do PT.

É fácil interpretar nossa realidade política e social sabendo, de antemão, a resposta a todas as perguntas. Qualquer coisa pode ser assim compreendida, incluindo a “apatia da sociedade” que não se indigna e não reage contra tudo de errado que existe.

Como afirmou o editorial de O Globo: “O fenômeno da inapetência política diante do assalto aos cofres abastecidos pelos pesados impostos pagos pelo contribuinte tem múltiplas raízes. A mais profunda deriva da bem-sucedida execução de um projeto de cooptação com dinheiro público...(através de organizações) convertidas em correias de transmissão do lulopetismo”.

O engraçado no raciocínio é que a “raiz profunda” da pequena disposição contestatória da população teria nascido outro dia. Se foi obra do “lulopetismo”, é de imaginar que, antes que Lula chegasse ao poder, o problema inexistisse.

Na visão singela do editorialista, talvez fossemos, até 2002, uma sociedade de ampla participação popular, onde o povo vigiava os políticos e só tínhamos a corrupção que passava despercebida. Foi quando veio Lula e estragou tudo.

Não parece que Juan Arias concordaria com uma tese tão superficial. Seu texto não atribuía ao “lulopetismo” a responsabilidade pela situação que o deixava perplexo. O que discutia eram os traços gerais de nosso sistema político, em nada circunscritos a um partido ou governante. A “indignação” que cobrava não seria do povo contra o governo federal, mas também o Congresso, a política nos estados e nos municípios.

O texto tratava Dilma de maneira peculiar. Para ele, “(...) curiosamente, a mais irritada com o ataque dos políticos aos cofres públicos parece ser a primeira presidente mulher”. Ou seja, apesar da lamentada ausência do “povo nas ruas”, ela seria “indignada” o suficiente para não aceitar a corrupção e estaria dando mostras disso no modo como enfrentou os casos Palocci e Alfredo Nascimento.

Nem se precisa dizer que essa avaliação esteve totalmente ausente nas repercussões do texto no Globo. Admiti-la implicaria abrir mão do modelo em que o “lulopetismo” é o grande culpado.

O assunto acabou fazendo um percurso curioso. Primeiro, um correspondente estrangeiro escreveu um artigo com o olhar característico de quem vê de fora nossos problemas. Daí, achando que era instrumental, um jornal local o importou, adaptando-o à sua visão.

Foi buscar lá fora argumentos que referendavam suas ideias e lhes davam certo ar cosmopolita, mesmo algumas que o texto inicial não subscrevia. Terminou como se o El País condenasse o “lulopetismo”.

Não era isso, mas quem se importa? Em redações como a desse jornal, a única coisa relevante é combater.

Por Beto Vasquez

Primeiro, importante lembrar que Juan Arias era um velho dinossauro inconveniente e, pra poderem se livrar dele, lhe "promoveram" com a sucursal brasileira do jornal El Pais (se fosse político, diríamos que se trata de uma embaixada).

No mais, o "neutro" Arias, foi o mesmo que ano passado, 6 meses antes da eleição escreveu um artigo dizendo que o Serra, e não Dilma, seria o verdadeiro candidato de Lula...sei, sei, sei...visão imparcial e justa. Neutralidade e ascepcia típicas de um analista internacional que vë com "distanciamento" os problemas tupiniquins...conta outra. É tudo farinha do mesmo saco. Só faltava agora o Coimbra tentar aliviar a barra do Arias como se ele fosse o bom e ingenuo gringo que apenas relata a "verdadeira realidade" brasileira.

Después de Lula ¿qué?

O presidente brasileiro renunciou a disputar um terceiro mandato que poderia ter ganhado facilmente. Seus possiveis sucessores, a ex-guerrilheira Dilma Rousseff e o social-democrata José Serra, seguirão seu caminho

Juan Arias 15/02/2010

A pergunta: depois de Lula, o que?, ou seja, como será o Brasil sem Lula, não é retórica. É uma pergunta que começa a ser feita não apenas por analistas políticos, mas pelo homem comum. Uma coisa é certa: vai haver, historicamente, um antes e um depois de Lula, o ex-torneiro mecânico que tomou o controle do país faz oito anos e conseguiu colocar o Brasil entre as potências emergentes do mundo junto com a Índia e a China.

Lula deixa um país com 20 milhões a menos de miseráveis que ascenderam à categoria de cidadãos e entraram no mercado de consumo. Hoje, o Brasil, com seus quase 200 milhões de habitantes, pretende ter um assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Lula tornou visível o Brasil e suas possibilidades econômicas e culturais no cenário mundial.

Não se deixou levar pelo sonho de tentar uma terceira vitória eleitoral, modificando a Constituição, alegando, em claro espírito democrático, que "melhor que a continuidade do poder é a alternância, para a saúde da democracia". Se pode afirmar sem dúvida que se trata de um gesto de generosidade político levando em conta que, se tivesse se apresentado para um terceiro mandato, teria ganho plebiscitariamente.

O presidente ex-sindicalista conseguiu algo que, quando chegou ao poder em 2003, parecia impossível: descolar-se da esquerda de seu partido, o Partido dos Trabalhadores (PT) e por em marcha, durante seus dois mandatos, uma política econômica neoliberal que deu segurança e outras garantias aos investidores estrangeiros. Às vezes -- em uma espécie de quadratura do círculo -- tem sabido conjugar essa política, aplaudida pelos banqueiros, com fortes e vistosas políticas sociais, com as quais conquistou milhões de pobres, diante dos quais se apresentou como um bom pai, ainda que a oposição classifique isso de assistencialismo. "Hoje os pobres tem mais comida na mesa e podemos ter um cartão de crédito", me dizia um jardineiro, orgulhoso de ter podido abrir uma conta no banco com 10 reais (4 euros).

Lula sai de cena, mas sabe que voltará, talvez já em 2014. Mas no momento sai. E a partir de primeiro de janeiro próximo o Brasil será um Brasil sem Lula. O que vai acontecer? Nada. Seguirá sendo um país com instituições democráticas consolidadas; um país que não só conseguiu sair, sem quebrar, da crise financeira mundial, mas que já está crescendo; um país sem possibilidade de golpes de qualquer tipo e, apesar de alguns impulsos populistas em alguns momentos -- pela influência sobretudo do chavismo -- que não se deixou arrastar pelo populismo em voga na América Latina.

O Brasil é um país que vai continuar sendo respeitado e admirado no mundo, inclusive sem o Lula, porque foi ele quem teve coragem de respeitar as bases democráticas construídas pelos oito anos do governo antecessor, o do social-democrata Fernando Henrique Cardoso.

Faltam quatro meses para uma contenda presidencial que vai ser dura e disputada, mas democrática. Se não houver surpresas de última hora, nenhum analista político apostaria em um cenário diferente do que está se formando, com duas únicas candidaturas capazes de ganhar as eleições de outubro: a da ministra e ex-guerrilheira, Dilma Rouseff, de origem húngara, que é a candidata preferida de Lula, uma espécie de sombra. Se ela vencer as eleições, será na realidade um terceiro mandato de Lula e asseguraria a continuidade de um certo lulismo, a política pessoal que Lula levou a cabo, afastando-se inclusive das diretrizes de seu partido.

Mas Dilma, ao mesmo tempo, não é Lula. É quase um anti-Lula, porque mais que uma iluminada ou uma improvisadora como ele, é uma gestora, que carece do carisma de seu chefe, que nunca disputou anteriormente eleições, nem para prefeita, e que chegou tarde ao Partido dos Trabalhadores, que oficialmente vai escolhê-la como candidata nas próximas semanas, ainda que não fosse Dilma a sua escolha preferida. Foi sempre e somente de Lula, que a escolheu por ser mulher, por ser dura e forte de caráter. O mandatário pensa que se Dilma foi capaz de sobreviver à tortura, poderá ser firme na direção do país. Além disso, vai seguir mais a direção de Lula que a do seu partido [o PT].

Dilma é mais de esquerda que Lula, que na verdade nunca foi de esquerda. Dilma militou nos movimentos revolucionários de extrema esquerda que lutavam em favor da ditadura do proletariado durante a ditadura militar. Foi encarcerada e torturada pelos militares e hoje daquele passado resta apenas um forte sentido social. Sua paixão é a gestão do poder.

Se ganhar Dilma, dizem os especialistas, terá ganhado Lula, sua força de convicção. Se perder, seria a perda dela, que não teria sabido capitalizar o apoio de Lula que, faz um ano, a leva pelo braço por todas as partes, até a uma audiência, no ano passado, com o papa Bento 16.

Hoje, as pesquisas dão Dilma como perdedora ante o social-democrata e governador de São Paulo, José Serra, ainda que a cada mês ela vá aumentando seu índice de aprovação, que está em torno de 30% diante de 40% de seu adversário. Dilma cresce à medida que os pobres descobrem que ela é a candidata preferida de Lula.

Serra representaria a alternância normal do poder, interrompendo de alguma forma a continuidade do PT no poder e do lulismo. Como Dilma, o governador de São Paulo, um fã da política que foi parlamentar e duas vezes ministro, além de prefeito da cidade de São Paulo e hoje governador do dito estado com altíssimos índices de aprovação, é também mais um gestor que um carismático. É uma pessoa séria, ainda que afetuosa, nada populista, que já disputou em 2002 as eleições presidenciais com Lula, que levou ao segundo turno e de quem sempre foi amigo pessoal. Sua campanha não seria "contra Lula", mas "depois de Lula". Se situa à esquerda de Lula e acentuaria algumas políticas deixadas pelo governo atual.

Com Serra, o Brasil seria um país sem Lula, mas ainda com Lula, no sentido de que o governador paulista não nega nenhuma das conquistas sociais de seu governo, nem o brilho que o ex-metalúrgico deu ao Brasil no mundo. Serra lutou nos movimentos estudantis durante o tempo da ditadura e teve que exilar-se por vários anos.

Lula deseja que a campanha seja uma espécie de plebiscito entre o que fez pelo país e o que fez seu antecessor por oito anos, o que já conseguiu. Seria como perguntar às pessoas se querem seguir com as conquistas conseguidas por ele ou voltar ao passado. Sem dúvida é uma falso dilema que Serra, se aceitar ser candidato, se encarregará de desmascarar.

Para Serra, seu governo não seria uma fotocópia do passado social-democrata de Cardoso, mas uma página nova. Seu programa, que estaria sendo preparado por uma equipe de sábios, teria como foco "aperfeiçoar" o que Lula começou e não quis ou não pode levar a cabo, e em melhorar aqueles campos nos quais os cidadãos se sentem mais frustrados e ainda insatisfeitos, como a educação, a saúde, a segurança cidadã, a reforma política, a reforma fiscal, a luta contra a corrupção, sem contar a ainda grande injustiça do Brasil: a tremenda disparidade entre ricos e pobres, entre os brancos e os de cor, entre escolarizados e analfabetos.

Sem Lula agora e quem sabe com Lula amanhã de novo, o Brasil é um país que escolheu o caminho certo, que o levará a consolidar o milagre de seu desenvolvimento. As diferenças do possível sucessor de Lula, que não será um líder carismático, não vão afastar o Brasil de seu objetivo de ser levado em conta no cenário mundial, de sua aposta na democracia e de uma certa e indiscutível liderança na América Latina e, quem sabe, algum dias, mais além.

Blog do Luis Nassif

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