Despencou a popularidade do presidente chileno Sebastián Piñera. Com os jovens na rua contra o plano educacional do governo, ele conta hoje com apenas 30% de aprovação nacional. Um índice amargo para a direita chilena, que voltou ao poder no ano passado e interrompeu a 20 anos de hegemonia dos partidos progressistas da frente Concertácion no Palácio de la Moneda (sede do governo). Para reverter a situação, Piñera trocou oito ministros nesta semana.
No entanto, em entrevista exclusiva para este blog, o ex-senador Carlos Ominami - pai de Marco Enríquez-Ominami, candidato independente em 2010 e que conquistou 20% dos votos nas eleições presidenciais no ano passado - afirma que a reforma ministerial de Piñera é apenas de uma improvisação. Não enfrentaria as mudanças de fundo reivindicadas pela sociedade chilena. O país arca com as dramáticas conseqüências do terremoto de 8,8 graus na escala Richter no final de fevereiro de 2010 que comprometeu, segundo os analistas, até 18% do PIB nacional.
A insatisfação dos movimentos populares contra as tímidas respostas do presidente à crise alastra-se. Na contramão das coligações de centro-esquerda que venceram no continente nos últimos anos, o governo chileno tem sido incapaz de dialogar com seus opositores. Piñera desagradou, sucessivamente, a ambientalistas, sindicalistas, e estudantes de seus país, frustrados por não conseguirem mais arcar com as mensalidades das universidades. Confira abaixo esta entrevista com o economista e político chileno.
Pouco tempo após ser eleito Sebástian Piñera se tornou o mais impopular dos presidentes do Chile nos últimos anos. Por quê?
Durante 20 anos, o Chile esteve nas mãos dos partidos da Concertación [Partido pela Democracia (PPD), Partido Socialista (PS), Democracia Cristã (DC) e Partido Radical Social Democrata (PRSD)]. Sem maioria no Parlamento, o atual governo é o primeiro eleito pelas forças da direita e se vê diante de um acúmulo de forças políticas e, também, de dificuldades.
Além disso, a campanha eleitoral de Piñera prometeu grandes mudanças. Elas não foram levadas adiante. Isso provoca grande descontentamento. Sem falar que os chilenos ainda sofrem as conseqüências do terremoto que destruiu regiões importantes para a economia do país, o qual gerou muita pobreza e agravou a situação econômica. Alia-se a isso a imagem pública de Piñera, que se apresenta como um milionário, um homem de negócios e do mercado, em contraste com a realidade da população. Uma imagem oposta ao da sua antecessora, Michelle Bachelet, que obteve alta aprovação popular (84%) no final do seu mandato.
As alternativas apresentadas por Piñera para resolver a crise são suficientes? Como o sr. analisa a reforma ministerial anunciada pelo presidente chileno?
[ Ominami ] São improvisações apenas, propostas que não dão conta dos problemas de fundo do país. É uma tentativa de conter e contornar os movimentos sociais e setoriais que denunciam o que importa para o governo Piñera: o lucro. O presidente acredita que tudo deve passar pelo mercado. No caso da educação, isso fica muito claro. A educação é vista como um negócio. O diálogo com a sociedade, no contexto de uma mobilização deste tamanho, está bastante complicado.
Como você analisa as manifestações populares?
[ Ominami ] O que temos, hoje, é uma mobilização social que não se via desde o fim da ditadura no país (1973-1989). Começou com os grupos de defesa ambiental e se espalhou para os demais, que se levantaram contra as decisões do governo Piñera. Primeiro, os ambientalistas reagiram contra a construção de cinco usinas hidrelétricas na Patagônia. Tivemos, também, uma grande manifestação contra a instalação de um complexo termoelétrico em Punta de Choros, próximo a uma reserva marinha, ecologicamente protegida.
Além disso, houve uma importante greve geral no setor de cobre do país, que responde por 53% das nossas exportações. Em uma paralisação histórica, 100% dos trabalhadores da Corporação Nacional do Cobre (CONELCO), uma das principais empresas de minério do mundo, cruzaram os braços para denunciar as intenções privatistas de Piñera e dar seu recado ao governo. Agora, os jovens tomam as ruas contra a política educacional. Essa questão envolve todos os segmentos sociais e coloca os estudantes na cena nacional novamente. O atual sistema educacional é fortemente privatizado e muito caro para as famílias. Elas já não conseguem mais pagar altas mensalidades. Mães e pais dos estudantes saíram às ruas em uma manifestação que conta com o apoio da maior parte da sociedade.
Exigem seus direitos e mudanças neste sistema, que afeta diretamente o futuro de seus filhos e do país. Na última semana, o governo anunciou que trará mudanças.
O ministro da educação já foi transferido do cargo. E os reitores estabeleceram uma interlocução com o governo. É provável que tenhamos um certo respiro, mas um consenso parece bastante difícil, já que se trata de mudanças de fundo, que mexem com diferentes concepções sobre a educação. E o governo não as compartilha com os grupos que estão protestando. Não é um conflito fácil de resolver. Quais são as características dos movimentos de oposição? O movimento social chileno está mostrando a sua força para todo o mundo e de forma autônoma da política. Este movimento não tem nenhuma representação política e não a reconhece, o que pode levar a uma situação em que as mudanças pretendidas não sejam asseguradas politicamente.
Qual a sua avaliação sobre a política institucional chilena?
[ Ominami ] Os partidos lutam para construir uma nova opção para o quadro político do país. Vivemos um momento de reflexão sobre a representação política. Durante 20 anos, o Chile foi governado apenas por dois grupos - o da aliança conservadora que elegeu Piñera e o dos partidos que compõem a Concertación.
O Partido Progressista (PRO), por exemplo, luta para abrir um novo cenário na política chilena. Ele encontra-se em fase de licenciamento e conta entre suas lideranças com o Marco Enríquez-Ominami [candidato independente em 2010 e filho de Carlos Ominami] que conquistou 20% dos votos ano passado nas eleições presidenciais. Para situar o PRO para os leitores brasileiros, o novo partido se identifica com as experiências do PT e de seu governo.
Como o governo Piñera se posiciona em relação à integração latino-americana?
[ Ominami ] Piñera é um produto raro na América do Sul. Temos hoje o governo mais conservador da região, na contramão das coligações de centro-esquerda que venceram no continente nos últimos anos. Há problemas e uma forte falta de sintonia com países como a Bolívia e o Peru.
Blog do Zé Dirceu
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