Publicação dos EUA sugere que Casa Branca apoie pleito brasileiro por vaga no Conselho de Segurança e considere o país como ator global
Por: Virginia Toledo, Rede Brasil Atual
São Paulo - Cadeira no Conselho de Segurança na Organização das Nações Unidas (ONU), protagonismo nas resoluções de assuntos internacionais, barreiras protecionistas e liberdade comercial estão entre os assuntos que envolvem o Brasil nos meios acadêmicos dos EUA. O envolvimento vem com certa dose de preocupação dos americanos, por estarem convencidos do avanço do Brasil como potência global.
"O Brasil construiu uma política externa do tamanho do país, o que não era feito antes de 2002. A política externa brasileira adequou o país à sua capacidade de projeção internacional. Tanto do ponto de vista econômico, quanto o político", defende André Reis da Silva, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
A sinalização de que o Brasil vem ascendendo no cenário mundial, mesmo que por muitas vezes em meio a atritos com o próprio Estados Unidos, foi sustentada após a publicação de um estudo cujo título afirmava que os americanos devem desenvolver uma parceria mais madura e forte com o Brasil. Trinta especialistas assinaram o texto na publicação "Council on Foreign Relations (CFR)".
O texto destacou, entre outros pontos da política bilateral entre os dois países, a necessidade de reconhecer o Brasil como um ator internacional cuja influência nas questões mundiais só deve aumentar. Evidenciou, também, a recomendação ao presidente Barack Obama em apoiar a candidatura do Brasil a uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU e o peso de decisões brasileiras em conflitos internacionais, principalmente os relacionados aos direitos humanos.
Cristina Soreanu Pecequilo, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), considera o documento importante, sob a ótica do governo dos Estados Unidos. Apesar de não poder ser entendido como posição consensual dentro da lógica da política externa americana, a publicação é, de fato, relevante para a Casa Branca e para o Departamento de Estado americano.
"Dentro do govermo americano, têm-se grupos que são mais simpatizantes ao reconhecimento do poder do Brasil, como também aqueles que não veem com bons olhos essa questão da multipolaridade. Ou seja, essa posição existe, porém com intensidade diferente entre alguns setores", destaca a professora.
Conselho de Segurança
Assim como foi levantado no texto da publicação Council on Foreing Relations (CFR), o apoio ao Brasil por uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU recebe crescente apoio, mas ainda enfrenta resistências dentro do território americano.
Para André Reis da Silva, não há possibilidade de se fazer uma reforma do conselho sem o Brasil estar entre os novos países-membros. Os possíveis candidatos são: Alemanha, Japão, Índia e Brasil.
"Se entrar o Japão, já há uma representatividade asiática por ter a China. Se entrar a Alemanha, já há representação europeia com França e Inglaterra. E com esses países no conselho, não resolveria o problema da representatividade dos países em desenvolvimento e dos novos poderes globais. Portanto, teria que olhar para África e América Latina. E os Estados Unidos sabem disso", ressalta.
A posição de Cristina Pecequilo, no entanto, desenha um caminho mais prudente sobre o tema. Segundo ela, a questão da ampliação do Conselho de Segurança não envolve somente os Estados Unidos, mas também decisões de diversas outras nações.
Ela entende que, no geral, o Brasil tem o apoio implícito e explícito de outros membros do conselho, porém, se os Estados Unidos - que ainda não apoiaram formalmente a candidatura do Brasil - entenderem que com outro país americano no conselho, o poder possivelmente seria dividido, eles não declarariam mais apoio "por mais que eles reconheçam o estado daquela potência", pontua.
Atualmente o Conselho de Segurança da ONU mantém estrutura que segue o modelo que existia no mundo depois da Segunda Guerra Mundial. Ocupam as vagas permanentes no órgão os Estados Unidos, a Rússia, a China, a França e a Inglaterra. Há ainda os assentos provisórios, que são ocupados pelo Brasil, Japão, México, Líbano, Gabão, Turquia, Bósnia-Herzegovina, Nigéria, Áustria e Uganda.
As autoridades brasileiras defendem a ampliação do número de cadeiras no conselho de 15 – cinco permanentes e dez provisórias – para 25, entre as quais o Brasil se coloca como candidato a titular. A discussão ainda é mantida em debate, mas esbarra em restrições por parte de alguns países por questões de divergências regionais.
Destaque brasileiro
Sobre o estreitamento das relações políticas e econômicas do Brasil com os Estados Unidos, nos últimos oito anos, entre muitos acadêmicos e políticos discutia-se que, com Lula à frente do governo brasileiro e George W. Bush na Casa Branca, as relações entre os países acabaria se distanciando.
No entanto, segundo o professor André, houve uma espécie de acomodação estratégica, pelo fato de os americanos estarem tomados pelas questões do Oriente Médio, que acabaram deixando a América Latina mais solta. Foi a vez de a política externa do Brasil entrar em ação e garantir o início de sua concretização e fortalecimento.
"Foi uma espécie de acordo tácito que, basicamente, dizia o seguinte: era para o governo brasileiro dar uma segurada e servir de contrapeso ao radicalismo na América do Sul, ou seja, contrapeso à aliança bolivariana. O Brasil era para os EUA um elemento de estabilidade", pontua Reis da Silva.
Para Cristina Pecequilo, se o Brasil não tivesse exercido uma política de fortalecimento e de unidade do poder nacional, sem subordinação, as constatações sobre o papel do Brasil seriam, provavelmente, diferentes nos dias de hoje.
Conflitos e direitos
Episódios como o que ocorreu contra o Irã, em que foram votados sanções ao país por sua política de enriquecimento de urânio, em que somente Brasil e Turquia se posicionaram contra as sanções, tornaram-se emblemáticos do ponto de vista do protagonismo internacional. Desde então, o Brasil, por muitas vezes acabou intensificando seu poder de diálogo em conflitos internacionais.
À época, a secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, chegou a afirmar que a atitude brasileira era “ingênua” e que Lula enfrentaria uma “montanha a ser escalada”. Mas ela não contava que a partir disso o governo brasileiro conseguiria uma saída diplomática, ampliando ainda mais sua influência.
"O Brasil aparece agora como um negociador, um mediador que não vem marcado com posições definidas. Este é um ponto que, inevitavelmente, incomoda os Estados Unidos", destaca Reis da Silva.
Segundo o professor da UFRGS, o governo Dilma, com Antonio Patriota à frente do Itamaraty, tenta apaziguar um pouco os ânimos americanos em alguns pontos, como a ordem internacional, sobre o qual todos parecem concordar. Mas ainda assim vai incomodar em temas como direitos humanos, o qual os dois países têm posições claramente distintas.
Rede Brasil Atual
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