JOSÉ DIRCEU, EM ENTREVISTA AO DIRETOR DE REDAÇÃO DE CARTACAPITAL, MINO CARTA. FOTO: REPRODUÇÃO/YOUTUBE
Em entrevista a CartaCapital, ex-ministro apontou falta de alianças a Fernando Haddad contra Bolsonaro no 2º turno das eleições
O ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu (PT) afirmou que setores do campo democrático, que hoje levantam a bandeira pela construção de uma frente ampla, rejeitaram a mesma iniciativa durante o 2º turno das eleições de 2018, quando Fernando Haddad (PT) era a alternativa ao então candidato Jair Bolsonaro. A declaração ocorreu durante entrevista ao diretor de redação de CartaCapital, Mino Carta, nesta segunda-feira 8.
Ciro Gomes (PDT), por exemplo, chamou de “traidor” quem não aceitar unir forças para defender a democracia no país contra Bolsonaro, em possível referência ao posicionamento hesitante do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em anunciar adesão a manifestos suprapartidários. No entanto, durante o 2º turno de 2018, Haddad enfrentou dificuldades em obter a aliança de Ciro e outras personalidades para vencer Bolsonaro.
“Os que hoje pedem frente democrática se recusaram a essa frente no 2º turno de 2018, porque o Haddad se apresentou no 2º turno como candidato democrático”, afirmou Dirceu, para CartaCapital.
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Em avaliação sobre os movimentos de unificação, como Basta, #Somos70porcento e Juntos, Dirceu disse que “não é questão de assinar ou de não assinar”, mas sim de destacar a importância de iniciativas em relação ao autoritarismo do presidente da República. Outra questão, para ele, é constituir uma frente ampla em torno de uma agenda.
“Nós temos que constituir uma frente de esquerda para lutar contra o Bolsonaro e para ser de alternativa ao Brasil. Agora, você há de convir comigo que não é essa a posição do PDT, PSB, PCdoB, porque eles estão mais por uma frente ampla de salvação nacional contra Bolsonaro. Então, é preciso colocar nos devidos termos. Frente contra Bolsonaro, todos devemos estar. Agora, nem por isso vamos abrir mão de ir para as ruas acumular forças e construir nossa proposta para 2022, que está longe”, declarou.
Dirceu apontou que não há dificuldades para o PT em participar de uma frente ampla. O ex-ministro argumentou que a legenda já atuou em iniciativas semelhantes em oportunidades anteriores, como as campanhas pelas Diretas Já!, movimento civil por eleições presidenciais na década de 80. Contudo, ele enxerga que a discussão atual tem outro viés.
“Eu não vejo que é isso o que está colocado hoje. É verdade que o Fernando Henrique Cardoso, o Ciro Gomes, a Marina Silva e a TV Globo avançam para uma proposta de frente ampla. É evidente que eles vão trabalhar por uma transição por cima, nós já temos essa experiência no Brasil. Nós temos que trabalhar por uma ruptura, por uma transição por baixo nas ruas, como fizemos nas Diretas Já. Fomos caminhando para uma greve geral e queríamos derrubar a ditadura nas ruas”, declarou.
Para 2022, candidato natural do PT é o Lula
Dirceu confirmou que Lula é o “candidato natural” do PT às eleições ao Palácio do Planalto em 2022, mas o ex-presidente não quer ser apresentado como tal para “contribuir para a unidade das forças de esquerda”.
“Então, ele fala: Flávio Dino, Rui Costa. Não tem falado no Fernando Haddad, ainda que Haddad seja o candidato natural se o Lula ficar impedido”, afirmou.
Segundo o ex-ministro, a primeira batalha é tornar Lula habilitado para as eleições de 2022, em nome da “democracia brasileira”.
“Primeiro, a democracia brasileira será sempre pela metade se o Lula ficar inabilitado, prescrito, como queriam cassar o registro do PT e prescrever o PT. Uma parte da direita e dos militares não aceita a esquerda socialista na vida política institucional brasileira. Por eles, nós estaríamos prescritos”, declarou.
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Em seguida, Dirceu opinou que considera que o PT é “a alternativa de 2022”.
“Nós precisamos entender que, no momento que nós vivemos, a alternativa em 2022 somos nós. Porque nós provamos em 2018, com 37 milhões de votos, naquelas condições do 1º turno, e no 2º turno, 45 milhões. Se o Fernando Henrique Cardoso e o Ciro Gomes e o PDT tivessem apoiado o Haddad, talvez a história fosse outra. Talvez. Se o Lula estivesse solto, seguramente. Se o Lula fosse candidato, grande probabilidade de vencer”, avaliou.
O ex-ministro defendeu que a agenda de 2022 tenha como prioridade o fim da regra do teto de gastos para investimentos públicos e a reintegração com países da América do Sul.
“Então, como eu vejo que 2022 pode ser uma real possibilidade de sermos a alternativa desse grupo… Porque para onde eles vão levar o Brasil? No pós-pandemia, eles vão continuar com o teto de gastos, regra de ouro, corte de gastos, sem investimento público? O Brasil vai ficar de costas de novo para o mundo, seguindo o Trump? De costas para a América do Sul, que quer a integração com o Brasil?”, argumentou.
“Fio da história do Brasil é o nacionalismo, a industrialização, o desenvolvimentismo, são os direitos da classe trabalhadora, é radicalizar a democracia”, opina o ex-ministro.
Em seguida, Dirceu afirmou que “o PT tem um papel importante a desempenhar” e considera que Lula ainda pode ser eleito em 2022.
“Eu levo muito a sério essa questão da unidade das forças de esquerda e da candidatura. O candidato natural é o Lula. O Lula, se ele abrir mão, ele pode eleger, inclusive, o sucessor dele, na minha opinião. Se ele disputar, ele pode ser também eleito. Agora, há a realidade, a vida dura. O PDT já tem um candidato, o PCdoB caminha para ter um, não sei como o PSOL vai se comportar. Então, esse é o mundo real. O Lula está se movendo em uma realidade em que disputam a hegemonia com o PT no campo da esquerda”, disse.
Brasil precisa de revolução social e radicalização da democracia
Dirceu rejeitou uma frente ampla que defenda uma “agenda ultraliberal” e disse que é preciso de uma “revolução social” brasileira.
“Quando nós falamos em frente de esquerda, temos que levar em consideração como estão os outros partidos de esquerda com relação ao PT e vice-versa. Quando nós falamos em frente única, frente ampla, temos que considerar o que eles querem. Querem só tirar o Bolsonaro? Tudo bem. Mas eles não querem tirar só o Bolsonaro, eles estão defendendo a agenda ultraliberal. Então, nós temos o direito de defender também a nossa agenda. Não basta só tirar o Bolsonaro. O Brasil precisa de uma revolução social”, afirmou.
O ex-ministro relembrou as eleições de Getúlio Vargas para justificar que o povo brasileiro tem a luta pela radicalização da democracia em sua história. Assim como o petista, Ciro Gomes fez a mesma referência em entrevista a CartaCapital, ao dizer que o país precisa “encontrar um governante à altura de Getúlio Vargas”.
“O Brasil precisa retomar o fio da história. O fio da história desse país não é isso. É o nacionalismo, é a industrialização, é o desenvolvimentismo, são os direitos da classe trabalhadora, é radicalizar a democracia. Essa é a luta histórica da maioria do povo brasileiro. Se não, não teria votado no Getúlio de novo. Como é que votou no Lula duas vezes e na Dilma duas vezes? Porque há um sentimento nacional para essa direção, e não para submeter o Brasil aos Estados Unidos”, sustentou.
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