quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Homenagens a assassinos e torturadores no Chile não são mais aceitas


No Chile, a dor e as feridas causadas pela ditadura estão longe de fechar. Um exemplo desta situação foi protagonizado pelo próprio Piñera, pelo prefeito da acomodada e conservadora localidade de Providencia, o ex-coronel de Exército, Cristián Labbé, e seu ex-superior hierárquico, o brigadeiro reformado Miguel Krassnoff (foto), acusado, este último, de delitos de lesa humanidade nos tempos em que Pinochet governava o país. Uma homenagem a Krassnoff gerou forte reação popular.



No Chile, a dor e as feridas causadas pela ditadura estão longe de fechar. Ainda mais quando diversas autoridades, inclusive algumas de dentro do governo de direita de Sebastián Piñera, insistem em olhar para o lado e fazer de conta que não aconteceu nada.

Um exemplo desta situação foi protagonizado pelo próprio Piñera, pelo prefeito da acomodada e conservadora localidade de Providencia, o ex-coronel de Exército, Cristián Labbé, e seu ex-superior hierárquico, o brigadeiro reformado Miguel Krassnoff, acusado, este último, de delitos de lesa humanidade nos tempos em que Pinochet governava o país.

A indisposição cidadã começou na semana passada quando Labbé –reconhecido amigo do defunto ditador chileno- anunciou que faria uma homenagem à Krassnoff, o que foi valorizado e respaldado pelo palácio de La Moneda. A opinião pública levantou a voz por meio das redes sociais, pela qual Piñera se retratou alegando que uma colaboradora havia falado por ele. Sua mensagem foi via twitter e não de frente ao país como a situação merecia.

Ontem pela manhã, a poucas horas de que a homenagem dos militares começasse, pois não foi suspensa pelo governo, o ministro visitante da Corte de Apelações de Santiago, Alejandro Solís, abriu um processo contra quatro ex-integrantes da Direção de Inteligência Nacional (DINA - a temida polícia secreta de Pinochet) pelo sequestro qualificado de Newton Morales Saavedra, ocorrido a partir de 13 de agosto de 1974 em Santiago, na etapa mais sangrenta da ditadura (1973-1990).

Entre os acusados da autoria deste delito está o homenageado, o ex-brigadeiro Krassnoff, juntamente com o general (R) Manuel Contreras Sepúlveda, o coronel (R) Marcelo Moren Brito e o suboficial (R) Basclay Zapata Reyes, todos assassinos e torturadores consumados.

De acordo com os autos do processo, Morales, de 39 anos, foi detido sem nenhuma ordem judicial por volta das 21h15min em seu domicílio em Santiago, por três agentes da DINA, que o introduziram em um veículo de cor vermelha com antenas, foi conduzido até um quartel da agrupação de inteligência que se localizava no centro de torturas na rua Londres, nº38, no centro da cidade.

Os quatro processados foram notificados desta resolução nos recintos de detenção preventiva onde cumprem pena por outras causas vinculadas a violações de direitos humanos. No caso de Krassnoff, o trâmite se realizou em Punta Peuco onde cumpre 144 anos de pena como participante destes crimes de lesa humanidade. Mesmo assim, a homenagem continuou adiante.

A comunidade mostrou seu descontentamento. Não só nos cafés, nas esquinas ou nas praças públicas. Outra vez as redes ferveram repudiando a cerimônia. De fato se convocou uma “funa” (grupo de pessoas que se reúne para interpelar algum delinqüente) que irrompeu pela tarde na chique e facistóide localidade de Providencia.

Cerca de 500 pessoas, após saírem de seus trabalhos, chegaram até o Club Providencia para reclamar contra o violador de direitos humanos.
Os convidados para a cerimônia que chegaram até o recinto foram objeto de insultos, cuspidas e tentativas de agressão protagonizadas por alguns dos manifestantes. O grito de “assassinos, assassinos” foi escutado novamente em Santiago.

A polícia uniformizada, que estava de prontidão próximo ao local, atuou com força, com carros lança-água, bombas de gás lacrimogêneo e porretes. De fato, uma mulher sofreu um ferimento no rosto devido ao impacto de uma bomba de gás lacrimogêneo.

Em meio aos protestos, foi recebida pelo menos uma ameaça de bomba no lugar. Embora num primeiro momento se informasse de uma evacuação do Club Providencia, os convidados à homenagem continuaram ingressando ao centro de eventos e não se informou sobre a suspensão do evento.

“Este é um ato puramente militar. Que os políticos fiquem em suas casas" afirmou um coronel reformado, companheiro de promoção de Krassnoff e que parecia não se importar com os acontecimentos.

De fato, Labbé voltou às manchetes quando reprimiu os estudantes secundários em greve através da força policial.

A dirigente da Agrupação de Familiares de Detidos Desaparecidos (AFDD), Mireya García, criticou o trabalho policial frente às disputas ocorridas com os que compareceram à homenagem, assegurando “se manifestam com um grau de violência que realmente é abismal e os carabineros permanecem impávidos nestas circunstâncias”.

Disse ainda que o prefeito Cristián Labbé “não tem o direito de encabeçar uma cerimônia desta natureza, porque ele foi eleito por votação popular e, portanto, tem que representar todos os moradores de Providencia e não somente um setor. Eu acredito que o prefeito Labbé não pode continuar sendo prefeito, não pode continuar sendo representante de uma comunidade porque se colocou definitivamente do lado dos criminosos”.

“Esta é una atividade que nunca deveria ter sido realizada. O Presidente Piñera devia ter tido uma atitude de repúdio absoluto oficialmente”, sustentou a dirigente.

No final do dia, vários manifestantes foram detidos e feridos. Armaram-se barricadas nas proximidades, o que demonstra que as pessoas não tolerarão mais abusos ou lembranças daqueles que os praticaram. Ontem à noite no Chile a frase “nem perdão nem olvido”, se escutou com força.

Tradução: Libório Junior

Carta Maior

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