segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Decisão que arquivou acusação contra Moro é um “escândalo jurídico”, diz ex-juiz do Supremo argentino

Postado em 31 Oct 2016




Zaffaroni

Publicado no Justificando.

Em artigo publicado no jornal argentino Página 12, Eugenio Raúl Zaffaroni, ex-ministro da Suprema Corte, professor emérito da Universidade de Buenos Aires e um dos maiores penalistas do mundo, classificou como “escândalo jurídico” a decisão do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4) que arquivou o processo que apurava o vazamento deliberado pelo Juiz Federal Sérgio Moro das conversas entre Dilma e Lula em um dos processos da Operação Lava-Jato.

A conduta de Moro em divulgar as provas sigilosas para o Jornal Nacional da Rede Globo foi relevada e o processo foi arquivado pelo Tribunal por 13 votos a 1. O relator do caso, desembargador federal Rômulo Pizzolatti, usou da exceção para argumentar que as questões da Lava Jato “trazem problemas inéditos e exigem soluções inéditas”.

No artigo publicado, Zaffaroni manifestou assombro com a decisão. Como explica, “a excepcionalidade foi o argumento legitimador de toda inquisição ao largo da história, desde à caça às bruxas até nosso dias, passando por todos os golpes de Estado e as conseguintes ditaduras”.

O jurista lembrou a trajetória de Carl Schmitt, filósofo jurídico do período nazista, que desenvolveu sua teoria com base no poder sobre a exceção para legitimar o poder de Hitler e destruir a Constituição Alemã (Constitição de Weimar) – “Assim, Carl Schmitt destruiu a Constituição de Weimar hierarquizando suas normas e argumento que o princípio republicano permitia, em situações excepcionais, ignorar todas as demais normas”.

Zaffaroni ainda afirmou que decisões como essa escondem um revanchismo político por integrantes de carreiras políticas – “Infelizmente, encontramos um revanchismo exercido sob a legitimação de discursos com muito baixo nível de desenvolvimento: como no julgamento brasileiro, dá a impressão de que ele se exibe sem tentar a menor dissimulação”.

Vazamento dos áudios impulsionou impeachment e sofreu críticas de juristas de renome mundial

A divulgação pelo magistrado para o Jornal Nacional da TV Globo da conversa entre a então Presidenta Dilma e o ex Presidente Lula sobre sua nomeação para o cargo de ministro da Casa Civil causou profundo impacto político.

O Jornal abordou durante todo tempo o conteúdo da fala, levando pessoas a ocuparem a Avenida Paulista por 38 horas, além de causar uma intensa movimentação na mídia sobre a nomeação ao cargo, a qual durou menos de uma tarde, uma vez que o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, suspendeu os efeitos da posse.

Na época, o Justificando entrevistou o Professor da Universidade de Roma, Pierluigi Petrillo, que também ficou espantado com a conduta do magistrado. Relembre:




Diário do Centro do Mundo - DCM

SEM SER QUESTIONADO SOBRE SEUS R$ 23 MILHÕES NA SUÍÇA, SERRA TOCA A VIDA


O chanceler José Serra demonstrou nesta segunda-feira não estar preocupado com a delação premiada da Odebrecht, que o apontou como beneficiário de um depósito de R$ 23 milhões numa conta secreta na Suíça; como a mídia tradicional praticamente não tocou no assunto e a Justiça não quebrou o sigilo da conta, Serra manteve sua rotina como se nada tivesse acontecido; nesta segunda-feira, ele foi às redes sociais para postar imagem de seu encontro com o futuro secretário-geral da ONU, Antônio Guterres; os internautas, no entanto, não perdoaram e pediram à ele que ensinasse Guterres a esconder dinheiro na Suíça

31 DE OUTUBRO DE 2016 


247 – Se o Brasil vivesse dias normais, o presidente Michel Temer já teria demitido seu chanceler José Serra, desde o dia em que ele foi apontado como beneficiário de um depósito de R$ 23 milhões, feito pela Odebrecht, numa conta secreta na Suíça (saiba mais aqui).

Como Temer também está na delação da Odebrecht, por ter pedido R$ 10 milhões à Odebrecht, que foram parcialmente entregues, em dinheiro, a Eliseu Padilha, seu braço direito, ele se calou.

Fossem estes dias normais, a Justiça já teria quebrado o sigilo da conta suíça de Serra, que, certamente, não deve ter sido usada apenas para receber recursos da Odebrecht. Além disso, em circunstâncias normais, repita-se, a mídia inteira estaria debruçada sobre um dos maiores escândalos de todos os tempos no Brasil: um pagamento de R$ 23 milhões ao ministro das Relações Exteriores, numa conta na Suíça.

No entanto, como nada mais segue padrões de normalidade no Brasil, Serra se sentiu à vontade para cumprir sua agenda oficial nesta segunda-feira, em que participou de um encontro com Antonio Guterres, futuro secretário-geral das Nações Unidas. Sem ser fustigado pela mídia e pela Justiça, ele toca o barco normalmente.

Os internautas, no entanto, não perdoaram e pediram a Serra que ensinasse Guterres a esconder dinheiro na Suíça.

Abaixo, reportagem da Reuters sobre o encontro: 

BRASÍLIA (Reuters) - Em sua primeira visita ao Brasil depois de ter sido eleito secretário-geral da Organização das Nações Unidas, António Guterres, disse ao presidente Michel Temer que o Brasil "é um país democrático" e tem "uma política externa independente", informou nesta segunda-feira a Secretaria de Comunicação da Presidência, após encontro entre os dois. 

De acordo com a nota distribuída pela Secom a jornalistas, Guterres disse a Temer que o Brasil pode demonstrar ao mundo "a importância do diálogo para a solução dos problemas globais".

Temer convidou Guterres, que é português e ex-diretor geral da Agência das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), para vir ao Brasil participar da Cúpula dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) quando o cumprimentou pela escolha para o cargo na ONU.

Temer teve uma série de encontros bilaterais, na manhã desta segunda-feira, com presidentes que participam da CPLP.

Com o presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, discutiu as reformas que o Brasil está implantando. De acordo com a Secom, Sousa explicou a Temer a reforma da Previdência feita em Portugal há cinco anos, quando o país atravessou uma séria crise financeira.

ACORDO COM CABO VERDE

Temer também assinou um acordo de serviços aéreos com o presidente de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, que permite a ambos os países atuarem no território do outro.

De acordo com o texto, cada país terá direito a sobrevoar o território do outro sem pousar, fazer escalas para fins não comerciais, além de fazer escalas em pontos de rotas previamente acordadas para desembarcar passageiros, bagagem, carga ou mapa postal. Cada país irá designar as empresas que farão essas rotas.

O presidente teve ainda encontros com o presidente do Timor Leste, Taur Matan Ruak, e o vice-presidente de Angola, Manuel Domingos Vicente. Esta tarde, antes de fazer a abertura da CPLP, Temer teria ainda uma quinta reunião bilateral, com o presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Mbasogo.

(Reportagem de Lisandra Paraguassu)


Brasil 247

Para Zaffaroni, decisão que arquivou acusação contra Moro é um “escândalo jurídico”

SEG, 31/10/2016 - 11:46

ATUALIZADO EM 31/10/2016 - 12:51



Em artigo publicado no jornal argentino Página 12, Eugenio Raúl Zaffaroni, ex-ministro da Suprema Corte, professor emérito da Universidade de Buenos Aires e um dos maiores penalistas do mundo, classificou como “escândalo jurídico” a decisão do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4) que arquivou o processo que apurava o vazamento deliberado pelo Juiz Federal Sérgio Moro das conversas entre Dilma e Lula em um dos processos da Operação Lava-Jato. (Leia o artigo aqui)

A conduta de Moro em divulgar as provas sigilosas para o Jornal Nacional da Rede Globo foi relevada e o processo foi arquivado pelo Tribunal por 13 votos a 1. O relator do caso, desembargador federal Rômulo Pizzolatti, usou da exceção para argumentar que as questões da Lava Jato “trazem problemas inéditos e exigem soluções inéditas”.

No artigo publicado, Zaffaroni manifestou assombro com a decisão. Como explica, “a excepcionalidade foi o argumento legitimador de toda inquisição ao largo da história, desde à caça às bruxas até nosso dias, passando por todos os golpes de Estado e as conseguintes ditaduras”.

O jurista lembrou a trajetória de Carl Schmitt, filósofo jurídico do período nazista, que desenvolveu sua teoria com base no poder sobre a exceção para legitimar o poder de Hitler e destruir a Constituição Alemã (Constitição de Weimar) – “Assim, Carl Schmitt destruiu a Constituição de Weimar hierarquizando suas normas e argumento que o princípio republicano permitia, em situações excepcionais, ignorar todas as demais normas”.

Zaffaroni ainda afirmou que decisões como essa escondem um revanchismo político por integrantes de carreiras políticas – “Infelizmente, encontramos um revanchismo exercido sob a legitimação de discursos com muito baixo nível de desenvolvimento: como no julgamento brasileiro, dá a impressão de que ele se exibe sem tentar a menor dissimulação”.

Vazamento dos áudios impulsionou impeachment e sofreu críticas de juristas de renome mundial

A divulgação pelo magistrado para o Jornal Nacional da TV Globo da conversa entre a então Presidenta Dilma e o ex Presidente Lula sobre sua nomeação para o cargo de ministro da Casa Civil causou profundo impacto político.

O Jornal abordou durante todo tempo o conteúdo da fala, levando pessoas a ocuparem a Avenida Paulista por 38 horas, além de causar uma intensa movimentação na mídia sobre a nomeação ao cargo, a qual durou menos de uma tarde, uma vez que o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, suspendeu os efeitos da posse.

Na época, o Justificando entrevistou o Professor da Universidade de Roma, Pierluigi Petrillo, que também ficou espantado com a conduta do magistrado. Relembre:

ZANIN: MP COMPROVA SUA PERSEGUIÇÃO A LULA


"O artigo publicado na Folha de S. Paulo por dois procuradores da República, que atuam na Lava Jato, longe de superar a perseguição política dirigida a alguns partidos políticos e, particularmente, ao ex-Presidente Luiz Inacio Lula da Silva, apenas deixa tal abuso ainda mais evidente", diz o advogado Cristiano Zanin Martins, ao comentar texto dos procuradores Deltan Dallagnol e Orlando Martello; "Se os procuradores e o juiz do caso efetivamente buscassem uma investigação legitima e dentro do devido processo legal, não estariam focados em uma pessoa – Lula -, mas sim em fatos", diz ele; Zanin questiona ainda a proteção ao PSDB e a confronta com a devassa que atinge Lula e sua família

31 DE OUTUBRO DE 2016

Por Cristiano Zanin Martins

O artigo publicado na Folha de S. Paulo por dois procuradores da República (leia aqui), que atuam na Lava Jato, longe de superar a perseguição política dirigida a alguns partidos políticos e, particularmente, ao ex-Presidente Luiz Inacio Lula da Silva, apenas deixa tal abuso ainda mais evidente.

A Lava Jato promove verdadeira guerra jurídica, mediante o uso manipulado das leis e dos procedimentos jurídicos, para perseguir seus inimigos políticos, fenômeno que é documentado por especialistas internacionais como “lawfare”.

Por que será que o PSDB não está dentre os partidos “mais atingidos” pela Lava Jato? Por que documentos que envolvem seus políticos tramitam em sigilo, em nome do “interesse público”, ao passo que aqueles relativos a Lula, inclusive os que têm sigilo garantido pela Constituição Federal, são devassados e expostos a todos em nome do mesmo “interesse público”? Não há como responder. Uma rápida consulta às reportagens produzidas pela própria Folha - a exemplo de outros veículos de imprensa - comprova a tese de dois pesos e duas medidas. Há muito a mídia perdeu sua imparcialidade.

Nações desenvolvidas não permitiriam que a Lava Jato deixasse de cumprir a lei, como ocorre no Brasil. Mas os procuradores não pensam assim, bem como o próprio TRF4, que julga os recursos da Lava Jato. Quando a lei é deixada de lado – seja por qual motivo for -, é o próprio Estado Democrático de Direito que está em risco. Você que está lendo esta publicação aceitaria ser investigado e julgado sem o rito das leis, mas, sim, pelas regras de conveniência de procuradores e juízes – por melhores que sejam suas intenções? É evidente que não!

Cada alegação dos procuradores em relação a Lula foi fulminada no campo jurídico por peças robustas que apresentamos nos autos e que podem ser consultadas em www.abemdaverdade.com.br. Ou seja, no plano estritamente jurídico, as frívolas acusações foram todas superadas pela defesa. Mas a Lava Jato, ao menos em relação a Lula, não busca o debate jurídico, mas o uso da violência da lei para promover perseguição política. Pretende reescrever a história. Pretende desconstruir a imagem e a reputação do ex-Presidente. E, para isso, usam da aparência da legitimidade de um procedimento, que devido processo legal nada tem!

Não é preciso ir longe para perceber isso. A denúncia apresentada contra Lula em 14/09/2016, com 172 páginas, não é uma peça jurídica; mas política. Aliás, depois que o próprio juiz Moro reconheceu, em recente despacho, que nenhum recurso relativo aos três contratos da Petrobras ali tratados foi destinado “diretamente a Lula”, a acusação perdeu qualquer sentido. Mas esse fato foi usado não para encerrar o caso, como seria de rigor, mas para indeferir provas que foram requeridas!

Se os procuradores e o juiz do caso efetivamente buscassem uma investigação legitima e dentro do devido processo legal, não estariam focados em uma pessoa – Lula -, mas sim em fatos. Não estariam promovendo acusações sem materialidade em rede nacional, com auxílio de assessoria de imprensa e, ainda, o uso de powerpoint semelhante a similar até já condenado pela Suprema Corte Americana, por violar a garantia da presunção de inocência. Não estariam violando inúmeras garantias fundamentais e desafiando até mesmo alguns dogmas do direito de defesa – como, por exemplo, ao grampear advogados formalmente constituídos (mesmo após terem sido alertados 2 vezes para empresa de telefonia) e divulgar as conversas mantidas com seu cliente.

Há, ainda, um derradeiro aspecto que deve ser registrado. O artigo de hoje pretendeu legitimar as ações da Lava Jato, citando o exemplo de combate à corrupção promovido por Hong Kong. MAS O EXEMPLO MOSTRA JUSTAMENTE O CONTRÁRIO! Aquele país, após constatar que a polícia e o ministério publico não estavam efetivamente preparados para promover o combate ISENTO à corrupção, adotou o sistema do ICAC – Independent Comission Against Corruption. Toda investigação relacionada à corrupção do sistema eleitoral, do judiciário e de outras áreas especificas é realizada naquele País por comissões INDEPENDENTES multidisciplinares – com máximo respeito às garantias individuais, que, posteriormente, entregam o resultado a um comitê de procuradores que irá decidir se é o caso de buscar a punição funcional ou penal dos envolvidos.

LÁ, OS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO (E MUITO MENOS O JUIZ QUE IRÁ JULGAR O CASO) NÃO PARTICIPAM DIRETAMENTE DA INVESTIGAÇÃO E, PORTANTO, NÃO FICAM “CONDENADOS A CONDENAR” ALGUÉM, COMO ESCREVEU LULA EM ARTIGO PARA A FOLHA. Nós sempre citamos o exemplo de Hong Kong como um CONTRAPONTO aos abusos da Lava Jato. Diga-se de passagem, ainda, que a Lava Jato, neste ponto, viola até mesmo o que foi decidido pelo STF no RE 593.727, que reconheceu o poder de investigação do Ministério Público apenas em situações excepcionais, quando a política não tem condições de promover a investigação.

Na Lava Jato todos - polícia, MPF e juiz – investigam, acusam e julgam! Enfim, a deturpação, a seletividade e a perseguição saltam aos olhos. E os procuradores precisam realmente conhecer o sistema de Hong Kong para verificar que lá eles não cometem os erros que estamos cometendo no Brasil, colocando em risco não apenas os empregos, a economia, mas, sobretudo, o Estado Democrático de Direito.


Brasil 247

GUILHERME BOULOS AO 247: “PRISÃO DE LULA É DECLARAÇÃO DE GUERRA”


Coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que congrega 40 mil famílias em 11 estados, Guilherme Boulos prevê um 2017 de conflitos no Brasil, mas sobretudo na maior cidade do país; "São Paulo vai virar uma praça de guerra", diz, antevendo que o novo prefeito irá usar a força para reprimir a luta pela moradia; para Boulos, Sergio Moro "não é uma referência de Justiça" e " tem mentalidade de justiceiro"; "Para ele vale qualquer coisa, até passar por cima da constituição, para que ele possa pegar quem ele quer pegar", opina; questionado se o MTST irá às ruas se Lula for preso, ele diz: "Uma prisão arbitrária do Lula não é um ataque apenas ao Lula. É uma declaração de guerra. Evidente que vai gerar reações"

28 DE OUTUBRO DE 2016 

Por Alex Solnik, do 247 - Coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que congrega 40 mil famílias em onze estados brasileiros, Guilherme Boulos prevê, nessa entrevista exclusiva ao 247, um 2017 de conflitos no Brasil, mas sobretudo na maior cidade do país, onde o movimento é mais robusto.

"São Paulo vai virar uma praça de guerra", diz ele, antevendo que o novo prefeito irá usar a força para reprimir a luta pela moradia. "Doria disse que vai acabar com as ocupações. É próprio de alguém que nunca saiu do Jardim Europa. Ninguém pede licença ao prefeito para fazer ocupação".

Boulos classifica o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, como "um sujeito de índole autoritária", sempre "à procura de um inimigo interno". Sergio Moro "não é uma referência de Justiça" e " tem mentalidade de justiceiro". "Para ele", diz Boulos, "vale qualquer coisa, até passar por cima da constituição, para que ele possa pegar quem ele quer pegar".

E define a missão do general Etchegoyen no governo Temer: "Ele tem o papel de infiltrar gente, como fez com aquele capitão do Exército aqui em São Paulo nos movimentos sociais, com o objetivo de monitorar os movimentos, preparar a escalada repressiva... um cenário preocupante".

O MTST irá às ruas se Lula for preso? "Uma prisão arbitrária do Lula não é um ataque apenas ao Lula. É uma declaração de guerra. Evidente que vai gerar reações".

Há quanto tempo você mora na periferia?

Eu moro na periferia de São Paulo há quinze anos, desde que eu entrei no MTST.

É perigoso morar lá?

Olha, não acho. Perigoso é andar pelo Congresso Nacional. Eu me sinto mais seguro no meu bairro do que quando eu tenho que ir para Brasília.

Por que você foi morar lá?

Olha, você sabe que eu tenho origem nas camadas médias, mas logo cedo, ainda secundarista comecei a militar no movimento estudantil. E fui me envolvendo com os movimentos sociais, com os movimentos de esquerda e quando o MTST entra na região metropolitana de São Paulo, em 2001, eu tinha acabado de entrar na faculdade, eu passei a apoiar as ocupações que ocorriam, vi nessas ocupações uma legitimidade, uma capacidade de organização e de mobilização muito forte, um espaço onde podia renascer o contato da esquerda com o povo. O bom e velho trabalho de base. Perdido, esquecido. Por isso fui morar nas ocupações.

Você é um sem-teto?

Existe uma falta de compreensão de quem é o sem teto por parte da sociedade brasileira. As pessoas acham que sem teto é a pessoa que está em situação de rua. Claro que é, mas não só ela. O déficit habitacional é de 6 milhões de famílias no Brasil. E esse déficit é composto majoritariamente por famílias que pagam aluguel, comprometendo uma parte expressiva da sua renda, relacionada a coabitação, várias famílias morando na mesma casa, famílias morando em situação de risco – esses também são sem teto. O cara que está pagando aluguel em situação precaríssima, se amanhã ele perde o emprego ele vai para a rua. Então, as pessoas que vão para as ocupações e se organizam no MTST são desse perfil de trabalhadores.

Quantos vocês são?

São 35 mil a 40 mil famílias organizadas no país. Divididas em onze estados brasileiros. Principalmente nas capitais e nas regiões metropolitanas. O movimento se organiza através de ocupações de terrenos urbanos e de núcleos comunitários em bairros, onde também se organiza a luta por moradia. Em São Paulo temos mais de 90 núcleos comunitários. E 27 ocupações. É onde o movimento é maior. É forte em Fortaleza, em Curitiba, Uberlândia, tem uma força razoável no Distrito Federal, Rio de Janeiro.

O número de ocupações cresce ou diminui?

Há uma crescente nas ocupações urbanas e na luta por moradia. De 2008 a 2014 houve um surto inédito de especulação imobiliária no Brasil. A valorização do metro quadrado nas maiores cidades brasileiras superou 200%, em São Paulo chegou a 215%, no Rio de Janeiro, 260%. Isso gerou uma inflação de aluguéis. E essa dinâmica gerou novos sem-teto. As pessoas que moravam numa região foram jogadas em regiões mais distantes, piorando a sua qualidade de vida, foram sendo despejadas. Terra virou ouro. A disputa pelas terras significa o aumento do número de despejos coletivos. Tudo isso agravou o conflito fundiário urbano no Brasil. E aumentou muito o número das ocupações. No próximo período a tendência é que isso se torne ainda mais explosivo. A especulação imobiliária diminui com a recessão, mas a esse processo se somam o desemprego que não havia antes e o arrocho salarial. Como as pessoas vão pagar aluguel? A tendência no próximo período é haver um aumento da luta por moradia.

O que você espera da relação com o novo prefeito de São Paulo? Haverá diálogo?

Olha, o João Doria deixa claro que não quer diálogo conosco. Doria vem de uma elite preconceituosa. Durante a campanha construiu um discurso raivoso em relação ao movimento social, às ocupações, como se ocupação fosse um gesto de vontade...o MTST resolveu fazer ocupações! Como se a ocupação não fosse o resultado da falta de escolha de milhares, de milhões de pessoas a quem nunca foi dada oportunidade de moradia digna. Ele disse que vai acabar com as ocupações. “Não vai ter ocupações no meu governo”. É próprio de alguém que nunca saiu do Jardim Europa. Ele não entende o que é dinâmica de ocupação. Ninguém pede licença ao prefeito para fazer ocupação. As ocupações vão haver porque existe um agravamento da situação social no Brasil. Ninguém vai pedir licença pro João Doria pra fazer ocupação. E tudo indica que o governo dele tende a reagir com repressão, com tentativa de ataque aos movimentos, ondas de despejo. São Paulo vai virar uma praça de guerra. 

A relação de vocês com a Dilma já era difícil. E agora, com Temer, vai existir alguma relação?

O MTST sempre prezou por manter uma rigorosa autonomia política em relação aos governos. Nunca foi um movimento do PT. O MTST fez uma série de mobilizações de enfrentamento aos governos petistas quando a pauta do movimento não era atendida. Evidentemente que esse cenário, com a consumação do golpe institucional, você tem um governo que apresenta uma ofensiva maior aos trabalhadores e isso reforça a necessidade de luta social. A relação do MTST com os governos é uma relação de luta social. Evidentemente que o MTST negocia programas habitacionais, sua pauta específica, mas faz isso respaldado e rastreado na mobilização social.

Vai haver algum tipo de diálogo com o governo Temer?

É difícil...

Como você define esse governo? Direita? Centro-direita? Extrema direita?

É um governo de direita, conservador na política, ultraliberal na economia...a PEC 241 é um escândalo! Ela está passando sob a apatia e o silêncio da maior parte da sociedade. Não há precedentes em nenhum lugar do mundo de uma regra, ainda mais de uma regra constitucionalizada que estabeleça política de austeridade por vinte anos! Congele os investimentos sociais por vinte anos!

E por que vinte anos? De onde tiraram esse número?

Deve ser um número cabalístico. O que pega aí é que, evidentemente, vai haver momentos de crescimento econômico nos próximos dez ou vinte anos... e isso tem sido pouco falado... que a PEC vai cortar investimentos em saúde e educação, assistência social, programas sociais, isso tem se falado... agora, tudo bem, e o crescimento econômico? Com o crescimento econômico vai aumentar a arrecadação, mas como vai haver teto de gastos, mesmo com o aumento da arrecadação isso não vai poder ir para investimento social. Para onde vai a receita do crescimento econômico brasileiro nos próximos vinte anos? Vai para o pagamento dos juros da dívida pública que não tem teto. Vai para meia dúzia de detentores de títulos do estado brasileiro. Isso é escandaloso! Isso é uma captura do estado pelo capital financeiro! É selvagem! Daí se diz olha, nós estamos num nível de endividamento alto... a dívida em relação ao PIB representa hoje 60% do PIB... dos Estados Unidos é 108% do PIB...do Japão, mais de 200%...na Alemanha que é o símbolo da austeridade é de 75% do PIB...não há nada que justifique uma medida draconiana dessa natureza. A não ser a oportunidade de rapinagem dada por uma situação política de um governo ultraliberal, sem legitimidade social, não respaldado no voto popular e que não tem um programa eleito que ele precise seguir. Essa circunstância vai fazer o país pagar caro. Se isso for aprovado o brasileiro vai pagar caro pelas próximas gerações.

Os movimentos sociais vão continuar indo pra rua contra a PEC mesmo depois das derrotas na Câmara?

Nós temos ido às ruas contra a PEC, essa semana, no dia da votação teve manifestação em várias capitais do Brasil. Qual é o problema? O problema é que só os movimentos sociais não têm força suficiente para reverter o processo. As pessoas dizem “os movimentos estão paralisados, os movimentos estão silenciados”, o que não é verdade, tem manifestação toda semana. O problema é que esses temas essenciais pelos quais a gente tem feito mobilização ainda não têm atraído a grande massa, que é a principal afetada por essas políticas. A massa trabalhadora, o povão das periferias urbanas não tem ido às ruas, a não ser aqueles que já estão organizados em movimentos sociais. Mas esses que estão organizados em movimentos sociais, embora combativos, importantes, não têm força suficiente para barrar projetos dessa natureza... os caras têm 3/5 do Congresso Nacional. Pra barrar isso vai ser preciso colocar não milhares nas ruas, mas centenas de milhares, milhões e não é esse o cenário que está colocado, apesar das iniciativas e das mobilizações dos movimentos sociais.

Quais são as caras que caracterizam esse governo como um governo autoritário? Para mim, os dois rostos mais emblemáticos são os de Alexandre de Moraes e de Sergio Moro (embora não seja do governo, mas do sistema).

Desde esse ponto de vista da escalada autoritária, de criminalização de lutas, de criminalização dos movimentos sociais o Alexandre de Moraes representa isso com primor. É um sujeito de índole autoritária. A primeira declaração quando ele assume o Ministério da Justiça é que supostos excessos dos movimentos sociais vão ser arrolados como crimes. Depois, ele vem e diz que não falta treinamento, preparo técnico ou teórico às polícias, falta armamento, falta poder bélico. É a velha lógica do inimigo interno que marca todos os governos autoritários. Mas não é só o Alexandre de Moraes. Nós temos o general Etchegoyen, com status de ministro, chefe do Gabinete de Segurança Institucional...

E ninguém sabe o que ele faz...

Ele tem o papel de infiltrar gente, como fez com aquele capitão do Exército aqui em São Paulo nos movimentos sociais, com o papel de monitorar os movimentos, preparar a escalada repressiva... um cenário preocupante. Porque nós temos esse processo atuando contra os movimentos em diversos níveis. Tem esse nível da repressão direta, tem o nível da criminalização judicial e tem o nível da desmoralização. Que esse não é feito no porrete. Esse é feito com aparato midiático. Construíram um consenso na sociedade de que movimento social é coisa de quem quer boquinha, coisa de quem quer um cargo, de quem quer pegar dinheiro público...esse tipo de desmoralização da luta por direitos dos movimentos sociais tem ecoado diariamente no discurso da grande mídia e ele legitima e prepara uma criminalização e uma repressão mais dura.

Esse Plano Nacional de Segurança que está sendo preparado o que te parece?

Eu não tenho muito conhecimento, acompanhei pela imprensa.

O nome é parecido com Lei de Segurança Nacional.

Imagino que não seja coisa boa. Vindo de onde vem, imagino que coisa boa não deve ser...

Você acha que essa aliança PMDB-PSDB, essa maioria de 3/5 no Congresso é coisa para durar?

Eles têm uma aliança. O Fernando Henrique chamou isso de Novo Bloco de Poder. Agora, no meio do caminho tem um Eduardo Cunha, no meio do caminho tem a Lava Jato, que pode criar problemas para essa aliança deles também. Não sabemos aonde isso vai chegar, quem vai pegar, se pega o próprio Temer, quem vai pegar do PSDB, se é que vai pegar alguém... quem vai pegar da cúpula do PMDB...há uma incerteza no cenário político que está relacionada a isso. Mas, do ponto de vista programático eles têm uma afinidade importante e, do ponto de vista do método, a velha lógica de comprar votos do centrão... distribuir cargos pelos métodos mais fisiológicos...

E banquetes... aliás, esse hábito de banquetes é dos anos 30, quando o então candidato à presidência em 1937, Armando Salles de Oliveira oferecia gigantescos banquetes em sua campanha, verdadeiros banquetes-comício...Parece que voltamos à década de 1930...

Eu acho que se a volta fosse para 1930 não seria tão ruim, na minha opinião, desde alguns pontos progressivos que se pode verificar no período Vargas. A CLT é da década de 1940...

Em 1930 faltavam sete anos para o Estado Novo... havia tortura... queima de livros... queimaram a obra de Jorge Amado e de José Lins do Rego...

Claro, claro, mas o governo Vargas é um governo contraditório, teve esse elemento repressivo mas teve elementos populares que no governo Temer não se tem.

Nenhum.

Por isso é que eu acho que a analogia tem esse limite.

Nem eu quis comparar Getúlio com Temer... nada disso, Temer não tem condições nem de engraxar os sapatos de Getúlio...

Não há comparação.

Quem é o Moro para você? Um fascista? Como você o descreve?

Olha...

Ele é popular na periferia?

Todo mundo que a Globo elege como herói ganha popularidade. Eu acho que o Sérgio Moro é alguém com uma mentalidade fortemente autoritária. Mentalidade de justiceiro. Ele trabalha no registro de justiceiro mais do que de juiz. Para quem vale qualquer coisa para que ele possa pegar quem quer pegar. Vale passar por cima da constituição, vale desrespeitar garantias individuais elementares, vale acabar com o direito de defesa, vale acabar com a presunção de inocência, vale eliminar o habeas corpus que é o elemento básico de um estado de direito. E além dos seus procedimentos, digamos, autoritários, atua de forma evidentemente seletiva. Não há como não ver, no caso do Lula, por exemplo, que há uma perseguição, uma tentativa de linchamento, de julgamento, ancorado também numa aliança com a mídia, mas há uma perseguição decidida do Moro e da Procuradoria, colocaram como alvo: queremos prender o Lula. Depois vamos encontrar como. E é o que eles estão fazendo há mais de um ano. Encontrando como. E preparando a opinião pública para isso. Eu não acho Sérgio Moro referência de Justiça.

Se Lula for preso vocês vão pra rua?

Uma prisão arbitrária do Lula não é um ataque apenas ao Lula. Alguns dias depois da condução coercitiva do Lula, em março, aconteceu um fenômeno, muito localizado, mas que me chamou atenção. Numa ocupação do MTST na Zona Sul de São Paulo, a polícia foi, fez uma abordagem, começou a agredir as pessoas e um dos policiais que estava comandando falou “vai lá, chama Lula agora”! Qual é o simbolismo disso? “Se nós estamos fazendo isso com o Lula, o que não vamos fazer com vocês”?! Fazem isso com um cara que foi tido em qualquer pesquisa como o melhor presidente da história do país, que saiu com uma popularidade incrível, ex-presidente da República duas vezes...então, uma prisão arbitrária do Lula significa um avanço no sentido dos ataques, na nossa opinião, ao movimento social, inclusive. Evidente que vai gerar reações.

Você acha que a prisão dele seria uma espécie de declaração de guerra?

Olha, são tantas as declarações de guerra... eu acho que essa é mais uma... a PEC 241 é uma declaração de guerra... a reforma da Previdência é uma declaração de guerra...os vários gestos de criminalização dos movimentos são declarações de guerra. Essa é mais uma. 

O que aconteceu com o PT? Por que o PT trilhou esse caminho que deu no que deu?

Eu acho, Alexander, que foi uma escolha que foi sendo construída ao longo do tempo, não foi uma decisão numa encruzilhada. Ocorreram várias encruzilhadas nessa história. O PT nasce como uma inovação – partido vindo das lutas sociais – nasce a quente. Resultado das greves, das comunidades eclesiais de base, movimentos urbanos, movimentos rurais, esse caldo forma o PT. E, pouco a pouco, ao longo dos anos 90, o PT constrói o entendimento de que o centro da sua política e da sua estratégia é a disputa institucional, particularmente ganhar a presidência da República. Até aí eu não vejo que esse seja o grande problema. O problema é que isso foi dissociado das lutas e mobilizações. Se entendeu que era necessário, para ser aceito no jogo eleitoral, abrir mão de ferramentas mobilizatórias que eram a própria origem do PT. Era a sua substância, aquilo que ele tinha de mais poderoso. Quando chega ao governo depois das eleições de 2002 já chega mediante essas escolhas, esses pactos. E a estratégia que estabelece a partir de 2003, 2004 é uma estratégia de tentar governar sem conflitos. Ao mesmo tempo que é verdade – e isso precisa ser reconhecido como mérito dos governos petistas – que houve aumento progressivo do salário mínimo, houve crédito popular, houve a formação de uma série de programas sociais importantes para o povo mais pobre, ou seja, que o andar de baixo ganhou, é também verdade que isso foi feito sem mexer com nenhum privilégio do andar de cima. Foi feito sem pautar as reformas estruturais e populares que seriam o centro dessa estratégia de esquerda: reforma tributária, reforma urbana, reforma agrária, o tema da dívida pública, democratização das comunicações, democratização do sistema político. A lógica da governabilidade junto aos setores conservadores que mantiveram o controle do Parlamento tão enraizados no estado brasileiro significou abrir mão de pontos fundamentais. Aí poderia se perguntar: mas poderia ser de outro jeito? Como poderia ter sido feito diferente? É evidente que é preciso construir condições de governabilidade, uma vez que se chega ao governo. Mas restringir essa governabilidade a aliança parlamentar com os partidos conservadores é você despotencializar o seu projeto político. Governabilidade também se constrói – e há várias experiências políticas que mostram isso - nas ruas, se constrói mobilizando, estimulando as forças sociais, inclusive a pressionar o Parlamento e construir um polo que dê condições ao governo de tomar medidas mais à esquerda. Foi uma sucessão de escolhas que levou à situação em que estamos hoje. E, de algum modo, o golpe representa a ruptura da própria burguesia, que não deixou de ganhar nesses governos, ao contrário, ganhou muito com esse pacto. Foi o momento em que a burguesia acredita que está forte o suficiente para não precisar mais da conciliação. E pode vir com um programa de espoliação mais radical...

E ela também percebeu que o governo perdeu o apoio popular...

Esse foi um ponto decisivo. Por isso que a política de ajuste fiscal executada pela Dilma após as eleições de 2014 tem uma responsabilidade importante no desfecho dessa situação. Porque quando ela ganha as eleições naquele segundo turno polarizado e muito mobilizado, inclusive, e no dia seguinte começa a aplicar o programa derrotado, faz um ajuste, por mais que seja um ajuste que perto do que está acontecendo agora é brincadeira de criança, mas esse ajuste fez com que a base popular que havia eleito ela e aquele programa e ainda confiava no PT como uma alternativa e que foi colocada na condição de ter que pagar a conta da crise, essa base, digamos, se distancia do governo, deixa de sustentá-lo e o governo fica numa situação flutuante, não tem mais sustentação social, ele cai para 10% de aprovação, de popularidade. Quando a burguesia vê isso eles falam “bom, é a hora”.

Na periferia também há posições de esquerda e de direita ou são todos de esquerda?

Claro que há posições. Agora, há na sociedade brasileira em geral uma tremenda despolitização. Claro que essa despolitização não é responsabilidade do PT, ela é secular. Agora, o PT teve uma oportunidade de envolver as periferias, as massas urbanas como atores sociais e não só como beneficiários. Teria possibilidade de trabalhar com essas pessoas como foi feito em outros lugares da América Latina para que, mobilizadas percebessem o processo como um avanço de direitos e não uma dádiva do estado. Ou, o que é pior, dentro do registro meritocrático. Esse enfrentamento ideológico político não foi feito. E aí é que vemos “prounistas” que apoiaram o impeachment e foram para avenida Paulista de verde e amarelo. Beneficiários de políticas de melhora social que não entenderam isso como parte da política de mudança. Periferias urbanas são complexas, você vai encontrar lá gente de esquerda, gente com pensamento de direita, você tem uma penetração fortíssima dos evangélicos, neo pentecostais...ainda há uma força muito grande da lógica clientelista, mas, de forma geral, hoje, na periferia predomina uma desilusão com a política. A crise de representatividade pega fundo. No sentido de não se perceber alternativa de mudanças. As pessoas votam, é evidente, votam dentro da perspectiva clientelista, mas a falta de esperança de que algo possa mudar através da política e, em especial, da política institucional é generalizada. Não à toa que nós nas últimas eleições tivemos um número de abstenção, de votos nulos e brancos crescente, bateu recordes históricos.

O que você prevê para os dois próximos anos?

Olha, há poucas certezas sobre os dois próximos anos. Talvez uma das mais fortes delas é que será um período de instabilidade social no Brasil. Quando aplicaram um golpe parlamentar da maneira como fizeram, quando guela abaixo da sociedade brasileira impõem um programa que não foi eleito pelo povo, um programa de retrocessos, de regressão social, isso abriu a porteira da instabilidade social no Brasil. Essa ferida não se fecha do dia pra noite. Pode ter alguns momentos como esse em que a reação não é tão forte, a maior parte da sociedade ainda não entende o que está em jogo, demonstra uma certa apatia, mas vão haver momentos, seguramente, de maior enfrentamento. É inimaginável que haja os ataques da maneira que querem implementar e que isso se dê sem reação da sociedade. Os próximos anos vão ser anos de turbulência no Brasil. Agora, acho que precisa ser pontuado que a seletividade não começa com a Lava Jato e com Sergio Moro. Porque o estado brasileiro historicamente é seletivo contra os mais pobres. Garantias constitucionais na periferia nunca existiram. Habeas corpus? Julgamento? Periferia é porrada da polícia, é extermínio, é abuso das prisões preventivas, é forjar provas, forjar flagrantes. A ação da polícia na periferia é uma ação miliciana. Não tem lei. Eles fazem a lei. A polícia brasileira é uma das que mais mata no mundo. Só a polícia de São Paulo matou mais no último ano do que todas as polícias americanas juntas. E tem os autos de resistência. É extermínio. Juventude negra periférica é a que mais morre. Então, esse estado policial e seletivo que fica agora aos olhos do país na Lava Jato não é nenhuma novidade. Para a maior parte do povo brasileiro é regra há muito tempo.


Brasil 247

domingo, 30 de outubro de 2016

AS CONVICÇÕES E O FASCISMO


13 de out de 2016

POR MAURO SANTAYANA





(Revista do Brasil) - Os países, como as pessoas, precisam tomar cuidado com as suas convicções.



Convicções arraigadas, quando não nascem da informação, da razão, do conhecimento, costumam ser fruto do ódio, do preconceito e da ignorância.


Não é por acaso que entre as características do fascismo, a mais marcante está em colocar, furiosamente, a convicção acima da razão.


Foi por ter a forte convicção de que os judeus, os comunistas, os ciganos, os homossexuais, eram espécimes de diferentes raças sub-humanas, que os nazistas fizeram coisas extremamente "razoáveis", como guardar centenas, milhares de pênis e cérebros arrancados dos corpos de prisoneiros em vidros de formol, esquartejar pessoas para fazer sabão, adubar repolhos com cinzas de crematório, ou recortar e curtir pedaços de pele humana para colecionar tatuagens e fazer móveis e abajours, em um processo que começou justamente nos tribunais, com a gestação da jurisprudência racista e assassina das Leis de Nuremberg.


De tanta mentira, distorção, hipocrisia, servidas - ou melhor, impostas, cotidianamente - à população, nos últimos quatro anos, o Brasil tem se transformado, paulatinamente, em um país em que a realidade está sendo substituída por fantásticos paradigmas, que são absorvidos e disseminados como as mais sagradas verdades, e adquirem rapidamente a condição de inabalável convicção na cabeça e nos corações de quem os adota, a priori, emocionalmente, sem checar, minimamente, sua veracidade ou sustentação.


Senão, vejamos:


Muitíssimas pessoas, no Brasil de hoje, têm convicção de que o PT quebrou o país.


Assim como têm convicção de que o Governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso foi um tremendo sucesso do ponto de vista econômico, certo?


Errado.


Os números oficiais do Banco Mundial provam que o PIB e a Renda per Capita em dólares recuaram no Governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso, com relação ao de Itamar Franco (de 534 para 504 bilhões e de 3.426 para 2.810 dólares), e aumentaram mais de 300% no governo do PT, de 504 bilhões para 2.4 trilhões de dólares, e de 2.810 para 11.208 dólares, entre 2002 e 2014; com o salário mínimo subindo também mais de 300% em moeda norte-americana nesse período, de 88 para 308 dólares no ano passado, com um dólar nominal mais ou menos equivalente, que chegou a 4,00 reais tanto em 2002 como em 2015.


A queda atual da economia é um ponto fora de curva que irá se recuperar, mais cedo do que tarde, se não forem adotadas medidas recessivas, que mandem, mais uma vez, a vaca para o brejo. 



A maioria das pessoas - incluídos ministros do atual governo, que exageram os problemas, para vender a sua "competência" e seus projetos, muitos deles ligados, direta e indiretamente à iniciativa privada - têm convicção que o Brasil está endividado até o pescoço, certo?


Errado.


Nona economia do mundo em 2016 - éramos a décima-quarta em 2002 - o Brasil ocupa, apenas, o quadragésimo lugar entre os países mais endividados do planeta.


Temos uma Dívida Pública Bruta com relação ao PIB (66%) mais baixa que a que tinhamos em 2002 (80%); e menor que a dos EUA (104%), Zona do Euro (Europa) (90%), Japão (220%), Alemanha (71.20%), Inglaterra (89.20%), França (96,10%), Itália (132.70%), Canadá (91.50%).


Além de possuirmos mais reservas internacionais (370 bilhões de dólares) que qualquer uma dessas nações e de não estar devendo - somos credores do FMI - um centavo para o Fundo Monetário Internacional.


E, mesmo assim, ninguém fica fazendo, nesses países que citamos, o mesmo carnaval - verdadeiro massacre - que se faz aqui, com relação à questão da dívida pública.


Uma grande pilantragem midiática que ajuda a justificar, entre outras coisas, o absurdo teto de despesas públicas proposto pelo atual governo - que não existe em nenhum país desenvolvido e irá engessar e tolher o desenvolvimento nacional nos próximos 20 anos - os juros pornográficos que a nação paga, a cada 12 meses, aos bancos, e a privatização e entrega de empresas estatais brasileiras a países estrangeiros.


Muitas pessoas também aparentam ter desenvolvido a convicção, no Brasil de hoje, de que o PT é um partido que é contra as Forças Armadas, bolivariano e comunista, certo?


Errado.


O PT sempre trabalhou com o tripé capital estatal, capital privado nacional e capital estrangeiro, e apoiou - a ponto de estar sendo execrado por isso - as maiores empresas privadas do país, e não apenas as de controle brasileiro - expandindo para elas o crédito subsidiado do BNDES, aumentando a oferta de crédito na economia, melhorando a situação do varejo e da indústria, fomentando a indústria automobilística, triplicando a produção e as vendas de caminhões, automóveis e equipamentos agrícolas, com linhas especiais de financiamento, e fortalecendo o agronegócio injetando bilhões de reais no Plano Safra, duplicando, praticamente, a colheita de grãos depois que chegou ao poder, sem atrapalhar o mercado financeiro, que teve forte expansão após 2002.


E, na área bélica, prestigiou o Exército, a Marinha e a Aeronáutica, lançando e bancando, por meio da adoção da Estratégia Nacional de Defesa, o maior programa de rearmamento das Forças Armadas na história brasileira.


Nem nos governos militares ousou-se investir, ao mesmo tempo, em tantos projetos estratégicos como se fez nos últimos anos, como é o caso do programa de construção de 36 caças-bombardeios com a Suécia.


Ou o do submarino atômico - além de outros quatro, convencionais - como se está fazendo em Itaguaí, no Rio de Janeiro, com parceria francesa.


Ou o da construção de mais de mil blindados multipropósito Guarani, em um único contrato, com a IVECO, com design e projeto de engenheiros do Exército Brasileiro.


Ou o do maior avião já construído no Brasil, o KC-390 da EMBRAER, produzido para substituir os Hércules C-130 norte-americanos, capaz de realizar missões também múltiplas, como o transporte de paraquedistas e blindados e o reabastecimento de outras aeronaves em vôo.



Para não falar da família de radares SABER, dos novos mísseis da AVIBRAS, do programa Astros 2020, da nova família de rifles de assalto IA-2 da IMBEL, capaz de disparar 600 tiros por minuto, e de outros projetos como o do míssil ar-ar A-Darter desenvolvido por uma subsidiária da Odebrecht, com a Denel, sul-africana.


Da mesma forma, muitíssimas pessoas têm convicção, nos dias de hoje, que o PT é o partido mais corrupto do Brasil, certo?


Errado.


Em ranking publicado pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral em 2012 - que, estranhamente, parou de publicar rankings anuais por partido depois disso - o PT aparece apenas em nono lugar, em uma lista encabeçada pelo DEM.


Na lista de 50 políticos investigados na Lava Jato que estão com processos no STF, cuja maioria pertence ao PP, só 6 nomes são do PT, e do total de 252 candidatos impugnados por serem ficha-suja nas eleições de 2014, por exemplo, apenas 20 são do Partido dos Trabalhadores.


Dados que não mudam em nada o fato de que o discurso anticorrupção, no Brasil de hoje, só existe na proporção que ocorre, porque pertence e serve, como bandeira, desde o início - na tradição golpista da UDN - à direita e à extrema direita em nosso país.


A esquerda, que costuma cair com facilidade nessa esparrela moral dos imorais, principalmente quando pretende utilizá-la, como seus adversários o fazem, como arma política, precisa tratar de outros temas, sem deixar - prudentemente - de colocar suas barbas de molho.


Como, por exemplo, o futuro do projeto nacional-desenvolvimentista brasileiro, com foco, principalmente, nas áreas social, científica, da educação, da indústria bélica, naval e de petróleo e de infraestrutura.


Ou a defesa da Democracia, do Estado de Direito e da Soberania Nacional, em tempos de risco - quase certeza, a depender do avanço da imbecilidade vigente - de inserção subalterna do país em um processo de globalização que não deixará outras opções, a não ser o fortalecimento ou a capitulação. 


Tudo isso, no contexto do urgente estabelecimento de uma aliança que permita manter a estabilidade da República e evitar a vitória da Antipolítica com a ascensão do fascismo - em aliança com partidos conservadores tradicionais - à presidência da República em 2018. 


É nesse país ridículo, mal informado, rasteiramente manipulado, por segmentos da mídia mendazes e deturpadores, que alguns procuradores do Ministério Público Federal vieram a público, há alguns dias, para dizer que tem "convicção" de que o ex-presidente Lula é o Chefe Supremo, o "Capo di tutti capi" da corrupção nacional, neste Brasil "casto" e "ilibado", nunca dantes atingido - como diziam no Caso do "Mensalão", estão lembrados? - por semelhante tsunami antiético.


Que ele, que nunca teve contas no exterior, como, digamos, Eduardo Cunha ou Maluf, teria recebido "virtualmente", para o padrão de consumo de nossa impoluta elite, acostumada a apartamentos em Paris, Miami e Higienópolis, um modesto apartamento de 215 metros quadrados, de cooperativa - no qual nunca dormiu e do qual não sem tem notícia de escritura em seu nome.


Além de um sitiozinho mambembe, até mesmo para o gosto de nossa pseudo classe média paneleira, que também não está em seu nome.


E de uma ajuda para a guarda de seus documentos presidenciais - de inestimável valor histórico, por abarcarem oito anos de história nacional - tudo isso apresentado como a parte do leão, do "Pai", do "Comandante", de um suposto esquema de propina que o mesmo MPF afirma - ainda sem provas cabais - ter movimentado a extraordinária soma de 42 bilhões de reais em desvios da Petrobras (antes eram 6 bilhões, segundo "impecável" "auditoria" da "competentíssima", jamais multada, "honestíssima", "imparcialíssima", consultoria norte-americana Price Watherhouse). 


Cinismo por cinismo, poderíamos dizer que, na hipótese, difícil de provar, que tivesse recebido os alegados 3.7 milhões em propina pelos quais foi acusado, em um negócio de mais de 40 bilhões, Lula seria o mais "ingênuo" senão um dos mais "modestos", políticos brasileiros, considerando-se a quantidade de empregos, negócios, projetos, obras, programas, que ajudou a proporcionar à economia nacional nos anos em que esteve à frente da Presidência da República.


E o PT, que teria pedido apenas miseráveis 5 milhões de reais para pagar contas atrasadas devidas a publicitários, em um contrato de aproximadamente 1 bilhão de dólares para a construção de duas plataformas de petróleo pela empresa do Senhor Eike Batista - um sujeito que resolveu depor "espontaneamente", depois de ter recebido bilhões do BNDES, durante anos, em apoio às suas empresas falidas - teria sido, diante das franciscanas proporções da solicitação, de uma tacanhice digna de fazer corar outras legendas e personagens do espectro político nacional.


Ora, nos poupem.


Ninguém está aqui para santificar o Partido dos Trabalhadores ou o Sr Luís Inácio Lula da Silva, que, se tiver cometido algum crime, deve purgá-lo - respeitada sua condição de réu primário - na mesma proporção de seus erros.


O que nos indigna e nos tira do sério, trabalhando na área em que trabalhamos, é a desfaçatez, a caradurice, a hipocrisia institucionalizada, com que estão tratando a verdade, a maior vítima desse atual "surto" de "convicções" brasileiro. 


Não nos venham com estórias da Carochinha e mirabolantes apresentações que vão ridicularizar, pelo exagero, ausência de lógica, de proporcionalidade, razoabilidade e verossimilhança - como já mostram as matérias e editoriais dos jornais estrangeiros - o Ministério Público e o Judiciário brasileiros junto à opinião pública internacional.


Correndo o risco, seus "convictos" acusadores, de verem o tiro sair pela culatra, transformando Lula em uma espécie de símbolo, ou de herói, se for impedido de concorrer à presidência da República.


Ou em um mártir - caso alguma coisa ocorra a ele, eventualmente, na prisão - para boa parte do planeta.


Blog do Mauro Santayana

MARCELO E EDUARDO NO PAÍS DE MORO

27 de out de 2016

Por Mauro Santayana



A notícia de que Marcelo Odebrecht teria, no longo processo a que está sendo submetido, protestado inocência e recusado bravamente o fechamento de um suposto acordo de delação premiada, contestando até mesmo a posição de seus advogados, além de discutir com procuradores, que finalmente teriam comemorado entusiasticamente a quebra de sua admirável resistência moral e psicológica, apenas reforça a convição - termo que está cada vez mais em voga ultimamente - de que o que ocorreu no caso de Odebrecht e de outros presos e empresas, não passa, em grande parte - para tempos "excepcionais", medidas "excepcionais" - de pressão, de extorsão e de tortura.

Para torturar uma pessoa nem sempre é preciso pendurar seu corpo no pau-de-arara, ou dar-lhe um banho de mangueira e choque elétrico, embora isso possa parecer incompreensível para boa parte dos "cidadãos de bem" desta nossa cordial civilização tropical, construída na base do massacre, do porrete, do tronco e da chibata.

Sugiro ver um filme clássico de Costa-Gravas, A Confissão, com Ives Montand e Simone Signoret - ambos comunistas, diga-se de passagem - ou ler o livro homônimo de Artur e Lise London, L'Aveu, sobre os processos stalinistas do final da década de 1950.

O que está ocorrendo, aqui e agora, é o seguinte:

Tendo o sujeito ocupado algum cargo público, ou feito negócios, de 2003 para cá, com o governo brasileiro ou mesmo governos estrangeiros, e passando a pertencer, por conta disso, a uma lista de "suspeitos" que, com quase que absoluta certeza, existe, voltada para comprovar a existência de uma conspiração vermelha dirigida a corromper, destruir e saquear a nação, e até mesmo países de outros continentes, primeiro ele é acusado, antes mesmo de ser preso, de envolvimento, na maioria das vezes indireto, com eventuais crimes ainda em investigação.

Vejam que, aqui, a quantidade de acusações é importante, mesmo que algumas delas sejam cruzadas, porque aumenta a chance de autorização de prisão, ainda que alguns pedidos venham a ser eventualmente recusados pelo Supremo Tribunal Federal.

Depois, o alvo é preso, temporariamente, sem flagrante, com base em ilações frágeis, ou algum pretexto isolado, por alguns dias.

Logo em seguida, com justificativas vagas e subjetivas, como a da "manutenção da ordem pública" - quando se trata de empresários e de ex-ministros e não de perigosos terroristas javaneses treinados para lá da Bessarábia por radicais anarquistas muçulmanos - transforma-se a sua prisão em preventiva, com duração praticamente indeterminada.

E, se o sujeito finalmente não aceitar, como Marcelo Odebrecht teve que fazer agora, depois de mais de 16 meses de aprisionamento kafquiano, as condições impostas pelos procuradores - ou seja, se não vier a falar o que se exige dele - apesar de condenado a quase 20 anos por imaginosas interpretações de mensagens de celular e suposto "domínio do fato", ele ainda é ameaçado de continuar preso indefinidamente, enquanto espera que o seu caso chegue à segunda instância, da qual, se houver confirmação da sentença, não haverá - como às portas do inferno - escapatória possível.

Alguém pode em sã consciência dizer que qualquer delação ou informação que venha a se originar de métodos como esses é voluntária ou moralmente legítima?

Como não é possível comprovar, na maioria das vezes, que houve desvios - o dinheiro que foi efetivamente para as contas pessoais de funcionários da Petrobras e de alguns deputados não passa de algumas dezenas de milhões de dólares, e o que foi para partidos políticos foi repassado como doação legal perfeitamente registrada na Justiça Eleitoral à época - assim como sempre ocorreu não apenas no governo do PT, mas desde o regime militar, e para todos os principais partidos - para legitimar a fantasia de um suposto escândalo de dezenas de bilhões de dólares, criam-se, também com justificativas "preventivas" ou tão altamente subjetivas quanto a da punição por supostos "danos morais coletivos", bloqueios e multas bilionárias - a Odebrecht terá que pagar inimagináveis 7 bilhões de reais - para dizer que a Lava-Jato estaria "recuperando" uma fortuna - sem nenhuma consideração com as centenas de milhares de empregos, investimentos, fornecedores, ações, projetos, programas, muitos deles estratégicos, dessas empresas, que foram ou serão sabotados ou inviabilizados com essa "punição" tão destrutiva quanto desmedida - para que os procuradores, e, indiretamente, os juízes envolvidos, possam posar de heróis para uma certa opinião pública, burra, manipulada e hipócrita.

A diferença entre Marcelo Odebrecht e Eduardo Cunha são o caráter e as circunstâncias. 

Enquanto o primeiro resisitiu, por princípio, enquanto pôde, o segundo já entrou na cadeia negociando uma delação premiada com a ilusão de sair pela porta seguinte. 

O ex-presidente da Câmara dos Deputados sabe, no final das contas, que o processo a que está sendo submetido, não ele, mas o país, é político, e que esse processo está sendo dirigido para um desfecho igualmente político, em 2018, e deverá trabalhar para dar sua "voluntária" contribuição para isso, a serviço do que quiserem ou deixarem subentender seus interrogadores.

A prisão de policiais legislativos, por parte de agentes da polícia federal por ordem de um juiz de primeira instância, com a absurda desculpa de terem feito - o que não é mais do que sua obrigação - varreduras em defesa do sigilo da comunicação de parlamentares eleitos por milhares de votos - já deixou claro o que até as placas de mármore que recobrem os palácios de Brasília já deveriam saber há tempos.

O grande réu da Operação Lava-Jato e de suas co-irmãs é a Política.

Não basta arrastar o Legislativo, o Executivo e os partidos na lama, durante meses, perante a opinião pública, com a cumplicidade de uma midia irresponsável, majoritariamente parcial e seletiva.

É preciso desafiar abertamente, se possível, diante das câmeras, o poder de deputados e senadores e daqueles que ocupam cargos executivos aos quais se chega pelo voto direto, secreto e obrigatório da maioria do povo brasileiro, para dizer indiretamente à população que ela não sabe votar, que sua pseudo autoridade, na verdade, não vale nada, e que ela deve se preparar para aceitar ser tutelada por uma plutocracia iluminada que chegou ao poder pela graça de Deus ou da caneta, por meio de indicação, no caso do TCU e do STF, ou de concurso, no caso do Judiciário e do Ministério Público. 

Os políticos eleitos demoraram tanto para reagir, por burrice ou por medo, tantos estão sendo ideologica ou interesseiramente cooptados para a alteração da lei, no sentido de distorcer a Constituição e diminuir a l.iberdade e o amplo Direito de Defesa, que, agora, por mais que esperneie, o Congresso, de tanto se abaixar, já deixa entrever parte do traseiro, parcialmente protegido por calças de veludo YSL ou Giorgio Armani. 

Resta saber a quem beneficiará tudo isso, no fim - se fim houver - desses "tempos excepcionais" de que fala o juiz Moro.

Se a um aventureiro messiânico, vingador e onipotente, com um raio e um martelo nos dois pratos da balança da "justiça", com os olhos muito bem postos na busca obsessiva e egocêntrica de cada vez mais poder e autoritarismo; ou se, coletivamente, a uma casta de privilegiadíssimos funcionários, com um padrão de vida muitíssimo superior ao dos comuns mortais, que busca se assenhorear, na prática, da República, sem a presença ou a legitimização do voto.

Nos dois casos, é mais fácil que se favoreça, nesse processo, o aparecimento de um novo e perigoso tipo de fascismo do que o fortalecimento da velha, e mesmo que defeituosa, sábia e imprescindível senhora a que se costuma chamar Democracia.


Blog do Mauro Santayana

A desconcertante confissão involuntária de Deltan Dallagnol. Por Paulo Nogueira

Postado em 30 Oct 2016


Isenção a esta algura dos acontecimentos?

Escondidinha, uma nota na primeira página da Folha de hoje traz o que se pode definir como uma confissão aterradora.

A nota chama para um artigo de Deltan Dallagnol e outro procurador, e o título é este: “Lata Jato avança ao atingir todos sem distinção”.

Vou repetir, tamanha a importância da frase:

“Lata Jato avança ao atingir todos sem distinção”.

Quer dizer: agora, e somente agora, a Lava Jato atinge — alegadamente — a todos?

Ao longo de todo este tempo Moro e seus comandados trataram de destruir o PT. Num jogo combinado com a mídia, a começar pela Globo, armaram operações cinematográficas quando se tratava de prender pessoas de alguma forma vinculadas a Lula.

Como esquecer as cenas da condução coercitiva de Lula para um depoimento para o qual ele sequer fora convocado?

E o vazamento ilegal das falas entre Lula e Dilma?

E tantas, tantas, tantas outras coisas que colaboraram decisivamente para a derrubada de Dilma e que, pelo script previsto, levariam a tirar Lula do caminho em 2018?

Uma democracia foi destruída. 54 milhões de votos foram incinerados para que a plutocracia chegasse ao lugar a que não consegue pelas urnas.

E agora somos obrigados a engolir que a Lava Jato é, aspas e gargalhadas, “apartidária”? Isenta?

Coloquemos assim: a Lava Jato tem a isenção que está fixada na missão do Jornal Nacional. Nela, o JN diz que noticia os fatos do dia com “isenção”.

A Lava Jato foi, desde o início, tão isenta quanto o Jornal Nacional.

As coisas saíram do controle de seus mentores, e da própria mídia, quando delatores graúdos citaram pessoas, de novo aspas e gargalhadas, “acima de qualquer suspeita”.

Veio o caos, para os administradores da Lava Jato e para a imprensa. Nenhum entre eles poderia esperar que da Odebrech saísse a informação preciosa de que Serra recebera 23 milhões de dólares num banco suíço para a campanha de 2010.

E atenção: em dinheiro de 2010. Hoje, seriam 34 milhões.

A confusão entre as corporações jornalísticas ficou estampada notavemente nisso: a Folha deu manchete e o JN ignorou.

O fato é que mudaram as circunstâncias: Moro já não é o mesmo. Caminha para ser o juiz de primeira instância de origem. Hoje é menor do que foi ontem, e amanhã será menor do que é hoje.

E a ideia disparatada de Dallagnol de que a Lava Jato “avança ao atingir a todos sem distinção” merece que evoquemos Wellington.

Só acredita nela quem acredita em tudo. A não ser que a tomemos como uma confissão de que ela até aqui pegou apenas um lado.


Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.


Diário do Centro do Mundo   -   DCM

Lava Jato joga no campo político porque no jurídico, já perdeu, diz advogado de Lula

DOM, 30/10/2016 - 14:34
ATUALIZADO EM 30/10/2016 - 14:38


Jornal GGN - O advogado Cristiano Martins, um dos defensores de Lula nos processos da Lava Jato e outras investigações, rebateu um artigo publicado por Deltan Dallagnol e Orlando Martelo, na Folha deste domingo (30), no qual os procuradores afirmam que o ex-presidente lança mão de ataques à força-tarefa e ao juiz Sergio Moro porque não tem uma defesa plausível para as acusações de ter sido beneficiado pelo esquema de corrupção na Petrobras.

Martins disse que, longe de provar que estão acima das acusações de perseguição política, os procuradores apenas reafirmaram sua parcialidade e linha abusiva. Para o advogado, os representantes da força-tarefa não conseguiram explicar por que o PSDB não está entre os partidos "mais atingidos" pela Lava Jato, nem porque os poucos tucanos investigados são protegidos por segredo de Justiça, contrariando a tese de que o "interesse público" e o "controle social" do caso justificam os espetáculos midiáticos.


"(...) no plano estritamente jurídico, as frívolas acusações foram todas superadas pela defesa. Mas a Lava Jato, ao menos em relação a Lula, não busca o debate jurídico, mas o uso da violência da lei para promover perseguição política. Pretende reescrever a história. Pretende desconstruir a imagem e a reputação do ex-Presidente. E, para isso, usam da aparência da legitimidade de um procedimento, que devido processo legal nada tem!", escreveu Martins.

Para o defensor, as acusações da Lava Jato contra Lula perderam o sentido quando Sergio Moro, em recente despacho, reconheceu que "nenhum recurso relativo aos três contratos da Petrobras ali tratados [pelo MPF] foi destinado 'diretamente a Lula'".

O GGN mostrou, em reportagem sobre as últimas movimentações de Moro no processo de Lula, que o juiz negou uma série de perícias à defesa. Uma delas tinha a finalidade de provar que o ex-presidente não teve contas bancárias abastecidas por dinheiro desviado da Petrobras.

Leia mais:




Abaixo, a nota de Martins sobre o artigo na Folha.

***

O artigo publicado hoje na Folha de S. Paulo por dois procuradores da República, que atuam na Lava Jato, longe de superar a perseguição política dirigida a alguns partidos políticos e, particularmente, ao ex-Presidente Luiz Inacio Lula da Silva, apenas deixa tal abuso ainda mais evidente.

A Lava Jato promove verdadeira guerra jurídica, mediante o uso manipulado das leis e dos procedimentos jurídicos, para perseguir seus inimigos políticos, fenômeno que é documentado por especialistas internacionais como “lawfare”.

Por que será que o PSDB não está dentre os partidos “mais atingidos” pela Lava Jato? Por que documentos que envolvem seus políticos tramitam em sigilo, em nome do “interesse público”, ao passo que aqueles relativos a Lula, inclusive os que têm sigilo garantido pela Constituição Federal, são devassados e expostos a todos em nome do mesmo “interesse público”? Não há como responder. Uma rápida consulta às reportagens produzidas pela própria Folha - a exemplo de outros veículos de imprensa - comprova a tese de dois pesos e duas medidas. Há muito a mídia perdeu sua imparcialidade.

Nações desenvolvidas não permitiriam que a Lava Jato deixasse de cumprir a lei, como ocorre no Brasil. Mas os procuradores não pensam assim, bem como o próprio TRF4, que julga os recursos da Lava Jato. Quando a lei é deixada de lado – seja por qual motivo for -, é o próprio Estado Democrático de Direito que está em risco. Você que está lendo esta publicação aceitaria ser investigado e julgado sem o rito das leis, mas, sim, pelas regras de conveniência de procuradores e juízes – por melhores que sejam suas intenções? É evidente que não!

Cada alegação dos procuradores em relação a Lula foi fulminada no campo jurídico por peças robustas que apresentamos nos autos e que podem ser consultadas em www.abemdaverdade.com.br. Ou seja, no plano estritamente jurídico, as frívolas acusações foram todas superadas pela defesa. Mas a Lava Jato, ao menos em relação a Lula, não busca o debate jurídico, mas o uso da violência da lei para promover perseguição política. Pretende reescrever a história. Pretende desconstruir a imagem e a reputação do ex-Presidente. E, para isso, usam da aparência da legitimidade de um procedimento, que devido processo legal nada tem!

Não é preciso ir longe para perceber isso. A denúncia apresentada contra Lula em 14/09/2016, com 172 páginas, não é uma peça jurídica; mas política. Aliás, depois que o próprio juiz Moro reconheceu, em recente despacho, que nenhum recurso relativo aos três contratos da Petrobras ali tratados foi destinado “diretamente a Lula”, a acusação perdeu qualquer sentido. Mas esse fato foi usado não para encerrar o caso, como seria de rigor, mas para indeferir provas que foram requeridas!

Se os procuradores e o juiz do caso efetivamente buscassem uma investigação legitima e dentro do devido processo legal, não estariam focados em uma pessoa – Lula -, mas sim em fatos. Não estariam promovendo acusações sem materialidade em rede nacional, com auxílio de assessoria de imprensa e, ainda, o uso de powerpoint semelhante a similar até já condenado pela Suprema Corte Americana, por violar a garantia da presunção de inocência. Não estariam violando inúmeras garantias fundamentais e desafiando até mesmo alguns dogmas do direito de defesa – como, por exemplo, ao grampear advogados.



Jornal GGN