18 de Outubro de 2016
Por Paulo Moreira Leite
A decisão da juíza Aparecida Angélica Correa, da 1ª. Vara Criminal de São Paulo, que inocentou os 14 acusados pela tragédia da Linha 4 do metrô de São Paulo, em janeiro de 2007, na qual sete pessoas perderam a vida, merece uma atenção particular.
Em primeiro lugar, estamos falando de vidas humanas, que constituem o bem maior a ser defendido pela Justiça em qualquer situação, em qualquer época.
A Linha 4 também foi a mais ousada experiência de privatização de obras públicas na área de transporte. Foi inteiramente planejada e realizada por um consórcio de empresas privadas, entre elas Odebrecht, OAS e Queiroz Galvão, que tiveram uma autonomia de trabalho jamais vista em investimentos anteriores.
No Brasil de 2016, porém, personagens ligados, de uma forma ou de outra, a tragédia da Linha 4 do metrô paulista, aparecem na apuração da Lava Jato.
Num capítulo introdutório ao pedido de prisão de Antônio Palocci, a Polícia Federal faz um retrospecto das atividades da Odebrecht no metrô de São Paulo. Nesse terreno, a linha 4 ocupa um lugar de destaque, em troca de e-mails entre dirigentes da empresa e executivos encarregados da administração de pagamentos clandestinos, num esquema em que os beneficiários eram identificados por apelidos.
Seria irresponsável afirmar ou mesmo sugerir, sem uma investigação a fundo, se há alguma relação direta entre os pagamentos ilegais e uma tragédia que traumatizou um país inteiro.
Mas é curioso, para começar, descobrir que antes e depois do desastre foram feitas remessas clandestinas – algumas milionárias, outras traduzindo somas mais modestas -- para personagens identificados como Santo, Careca, Cambada, Gordomagro, Casa de Doido-SP, Campinas, e tantos outros, ocorreram antes e depois do desastre. O calendário tem um dado que chama a atenção.
A tragédia ocorreu dias depois do encerramento do ano eleitoral de 2006, quando o prefeito de São Paulo, José Serra, disputou e venceu a eleição para o governo do Estado; Geraldo Alckmin, que era governador do Estado, disputou e perdeu a campanha presidencial contra Luiz Inácio Lula da Silva. Um trecho do túnel na região de Pinheiros desabou, provocando a morte de três pessoas que passavam pelo lugar; outros três que se encontravam a bordo de uma van que acabou engolida por uma cratera; e um trabalhador do canteiro.
Há poucas referências diretas a disputas eleitorais, ainda que, num email de um diretor de contratos da Odebrecht, seja possível ler uma menção a “ajuda de campanha com vistas a interesses locais” para o personagem identificado como Santo, que se traduziu em dois pagamentos de R$ 250 000.
Em outras passagens, assiste-se, através de e-mails, a vários lances de um jogo bruto e direto. Em agosto de 2006, quando a obra se encontrava em processo mais avançado, aprovou-se o “ato liberatório.” Num email, informa-se que, dentro da conta geral do consórcio, a Odebrecht terá uma parcela clandestina de 35%, referente a despesas que totalizam R$4,5 milhões, divididos em cinco parcelas, sendo a primeira de R$ 1 milhão.
Três meses depois, em 29 de novembro de 2006 -- quarenta dias antes do desabamento – um dos executivos da área fala da “nossa parte” devida ao “Cambada”. Não é pouca coisa. Naquele dia, será feito um pagamento inicial de R$ 50 000, seguido de quatro parcelas mensais de R$ 25 000.
Após a divulgação da sentença, em primeira instância, o Ministério Público anunciou a decisão de recorrer da decisão. Não há dúvida de que terá um bom trabalho pela frente. Só não há certeza de que terá disposição e vontade para dar conta da tarefa colocada.
Brasil 247
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