Lobistas e advogados se mobilizam para impedir que a estatal continue tocando seus negócios
4 de março de 2023
Sede da Petrobras no Rio (Foto: Sergio Moraes - Reuters)
RIO DE JANEIRO (Reuters) – A Petrobras enfrentará barreiras legais para suspender contratos de venda de ativos já assinados e poderá sofrer sanções judiciais se seguir recomendações do governo federal que impeçam eventualmente a conclusão das transações em andamento, afirmaram advogados especialistas do setor à Reuters nesta sexta-feira.
O pedido do Ministério de Minas e Energia para a Petrobras suspender por 90 dias processos de desinvestimentos, incluindo negociações em andamento, gerou insegurança em agentes do mercado, diante de declarações da empresa consideradas vagas, e reforçou temores de intervenção federal em decisões estratégicas da companhia, que têm pendentes transações já assinadas de mais de 2 bilhões de dólares.
Embora a Petrobras não tenha formalizado a suspensão de processos de desinvestimentos, após pedido do governo anunciado na quarta-feira, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, disse na véspera que "está tudo suspenso para análise".
"Não existe a possibilidade de suspensão de contratos assinados. Essa não é uma disposição que conste nos contratos. E, se a Petrobras deixar de fazer algo que ela é obrigada a fazer, ela pode ser responsabilizada", afirmou à Reuters Alexandre Calmon, sócio líder da Área de Energia do Campos Mello Advogados.
"Isso seria quebra de contrato", afirmou.
O especialista disse ainda que processos assinados e em curso para a conclusão da operação não estão no controle da petroleira. Há definições em contrato que devem ser cumpridas por todas as partes envolvidas.
Procurada, a Petrobras afirmou nesta sexta-feira que não iria comentar além do que já havia informado sobre o tema.
A empresa publicou na quarta-feira que havia recebido um ofício do ministério solicitando a suspensão das alienações de ativos por 90 dias, em razão da reavaliação da Política Energética Nacional.
O pedido do ministério focou em novos processos de desinvestimentos e alguns em trâmite e não concluídos. A petroleira, no entanto, não detalhou quais deveriam ser exatamente os processos impactados.
"A forma como foi publicado o ofício gerou insegurança, é um comunicado genérico. Não tem uma diferenciação entre processos assinados e não assinado", disse Paulo Valois, sócio do Schmidt Valois Advogados.
"Para ser sincero, o que aconteceu não me surpreendeu porque o PT, no programa do governo dele, disse que ia fazer exatamente isso, que ia cancelar, interromper o programa de desinvestimentos da Petrobras."
Mas o que mais preocupa são os contratos assinados e ainda não concluídos, frisou Giovani Loss, sócio da área de Óleo e Gás do Mattos Filho.
"A suspensão por razões políticas leva a uma discussão de quebra de contrato. Não me recordo de situação similar no Brasil de quebra de contratos assinados dessa maneira por uma sociedade de economia mista", disse Loss.
"Isso traz insegurança aos investidores e empresas em geral que tenham compromissos com o governo e empresas ligadas a ele. Nos governos Lula anteriores e Dilma, o respeito aos contratos assinados era muito valorizado", destacou.
MAIS DE US$2 BI
Há pelo menos quatro contratos assinados de venda publicados ao mercado pela Petrobras, mas ainda pendentes de conclusão, somando mais de 2 bilhões de dólares.
Um dos maiores foi a venda de 22 concessões de um grupo de ativos na Bacia Potiguar, no Rio Grande do Norte, para a 3R Petroleum, por 1,38 bilhão de dólares.
Nesse caso, a 3R chegou a anunciar ter acertado um empréstimo de 500 milhões de dólares para concluir a transação.
Prates, que foi senador por Rio Grande do Norte, disse na véspera em coletiva de imprensa que a solicitação do governo por ora foi apenas de suspender.
"A questão do Polo Potiguar tem a ver com outro processo, que é um processo solicitado pelo governo federal de suspender, não é anular, interromper, desfazer contrato, é suspender, e a gente vai buscar oportunidades de rever alguns conceitos, não só em relação a essa venda como em relação a outras", disse o CEO da Petrobras, na véspera, a jornalistas.
"Isso foi uma coisa que a gente falou como campanha, como grupo político lá atrás. Alguns estavam aí em fase final, porém ainda sob a responsabilidade da Petrobras", afirmou Prates.
ERRO
Para Calmon, do Campos Mello Advogados, o ofício do ministério foi "um erro", pois "o ministério formula política de Estado e essa é, sem dúvida, uma interferência indevida".
Segundo ele, o governo poderia buscar rever estratégias da Petrobras, por meio de representantes no Conselho de Administração. "Esse tipo de demanda não faz o menor sentido, você queima diversas etapas de governança."
O pedido de suspensão das vendas de ativos foi feito na mesma semana em que o governo anunciou um imposto de exportação de petróleo, o que gerou protestos de empresas e associações do setor.
Outro contrato de venda já assinado foi do Polo Norte Capixaba para uma subsidiária da Seacrest Exploração e Produção de Petróleo, por até 544 milhões de dólares.
A Petrobras também já havia acertado a venda de Polo Golfinho e Polo Camarupim para a BW Energy por até 75 milhões de dólares, e da refinaria Lubrificantes e Derivados de Petróleo do Nordeste (Lubnor) para a Grepar Participações por 34 milhões de dólares.
Procurada, a Grepar afirmou que continuará seus esforços e acredita na conclusão do processo de compra da Lubnor e consequente transferência de cotas da refinaria, nos termos acordados. Disse ainda que confia nas decisões de orgãos reguladores que foram positivas sobre o negócio e que reforça a importância de manter o diálogo com as novas gestões da Petrobras e do Ministério de Minas e Energia, para convergir nos mesmos objetivos.
A 3R disse que não vai comentar o assunto.
BW Energy e Seacrest não comentaram o assunto imediatamente. O Ministério de Minas e Energia também não comentou o assunto de imediato.
Brasil 247
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