domingo, 6 de novembro de 2016

Ocupação não vai acabar se governo não admitir autoritarismo, por Janio de Freitas

DOM, 06/11/2016 - 10:13


Jornal GGN – Em sua coluna deste domingo, Janio de Freitas fala o que tantos tentaram por estes tempos de levante: enquanto o governo não admitir autoritarismo, a ocupação de escolas não vai acabar. E também de faculdades. O autoritarismo é claro: baixar por decreto uma reforma de ensino sem discutir com as partes envolvidas e interessadas no assunto.

Outro ponto abordando o neo-autoritarismo reinante, foi a invasão das instalações do MST, que com isso ganha novo fôlego e reforço da sociedade. Junte-se a eles o ocorrido com as ocupações do MTST.

No frigir dos ovos, o governo guarda no saco a viola de maldades contra os indígenas, querendo rever demarcações e podendo avançar pelas áreas de proteção ambiental, atendendo interesses dos fundiários representados por Caiado.

Contribuindo para o quadro geral do autoritarismo desenfreado, Geraldo Alckmin solta sua Polícia Militar numa ação sem controle e sem remédio. O governador vem com suas palavras macias explicar o inexplicável dentro de tanta truculência e violência. A prova maior de sua benção para estes atos vem com a escolha de seus secretários de Segurança. Hoje Magino Alves, que tartamudeia o “vamos investigar”, seja com o anterior, Alexandre Moraes, que surfa na onda dos ataques a jato contra petistas mas que não sabe de nada do que apronta sua polícia.

Janio traduz outra preocupação, que é a desocupação policial de escola sem autorização, ataque a um grupo de teatro, ataque à repórter-fotográfica Marlene Bergamo – atos vindos de um postulante ao cargo de Presidência. E se pergunta a pergunta geral: para quê?

Por fim, fala do estrondoso sucesso do artigo de Xico Graziano, que lança FHC à presidência, que se esquiva de ter dado a ideia do lançamento e solta, ao vento, palavras confusas para fazer frases de efeito: “A Presidência abrevia a morte”, teria dito o sábio ex ao jornal O Globo. Bela fala, pena que a morte é que abrevia a vida.

Leia a coluna de Janio de Freitas a seguir.

da Folha


por Janio de Freitas

A ocupação de escolas, e já também de faculdades, não vai cessar, caso o governo não admita que cometeu um ato de autoritarismo, com a imposição de uma alegada "reforma do ensino" sem a discutir sequer com uma das várias partes diretamente envolvidas no assunto.

Novas ações do Movimento de Trabalhadores Sem-Terra entram em processo de gestação, que recebeu agora o estímulo de invasões policiais e prisões em áreas sem conflito. O Movimento dos Sem-Teto fará mais comprovações de que a ferocidade policial, outra vez aplicada em desocupação no centro de São Paulo, incentiva-o em vez de o intimidar.

A intenção do governo, agora silenciada mas não abandonada, de rever demarcações de reservas indígenas (chegará à revisão também de áreas de proteção ambiental), atenderá aos interesses fundiários representados pelo senador Ronaldo Caiado, mas já são motivo de planos de resistência.

A história registra como essas resistências são respondidas pela polícia e pelos ambiciosos de terra com seus os jagunços.

Em meado da semana encerrada, houve ao menos dois encontros reservados de representantes de diferentes movimentos ou setores (nenhum de estudantes).

Uma dedução possível é a de que ações conjuntas, e até mesmo uma conjugação mais geral, sejam ideias sob exame. Vê-se que é uma situação complexa. Muito mais a de fora da política do que a de seu interior alienado.

A contribuição do governador Geraldo Alckmin para tal situação é inequívoca. A cada episódio de sua PM ditatorialesca, Alckmin comparece com suas falazinhas de bom moço, cada sílaba bem escandida, a fisionomia neutra, ou indiferente. E nenhuma das ações de sua obrigação governamental.

A escolha dos seus secretários de Segurança é significativa. O atual Magino Alves, que só faz gaguejar o fugidio "vamos investigar" as ações truculentas e ilegais da PM; o anterior, Alexandre Moraes, está por dentro dos ataques a jato contra petistas, mas por fora do que a sua polícia apronta. E ele depois acoberta.

A desocupação policial de escola sem autorização judicial foi arbitrariedade dupla: usurpação de poder do Judiciário e ação policial indevida.

O ataque da PM a uma trupe de teatro financiada pelo governo é uma violência indecente, tanto quanto a cobertura recebida do secretário de Segurança e, portanto, do governador.

Na desocupação de um prédio, Marlene Bergamo, que está entre os melhores repórteres-fotográficos do país, saiu com um ferimento no abdome que é como uma cicatriz moral do governo que a atacou. Tudo isso na São Paulo de um Alckmin desejoso de ocupar a Presidência. Para quê?

Um governo federal que só pensa em impor um teto arbitrário e duradouro aos gastos do país carente não precisa, além dessas, de mais palavras sobre sua responsabilidade pelo horizonte que escurece. Mas, é verdade, não se poderia esperar outra obra de Temer e do grupo de que, fraco, se deixou cercar.

FALAS

1- Ao lançar Fernando Henrique a uma candidatura para eleição presidencial indireta, e direta só em último caso, Xico Graziano omitiu, por bondoso esquecimento, o motivo que lhe tirou o cargo de secretário da Presidência de Fernando Henrique.

Sério, ele desconfiou das relações do diplomata encarregado dos salamaleques palacianos. E descobriu que o embaixador João Batista dos Santos estava articulado com um representante da Raytheon, para destinar a essa multinacional a construção do sistema de vigilância da Amazônia, o Sivam. Expôs a descoberta a quem deveria ouvi-la.

Nada, nenhuma providência. A transação continuava. Graziano deu um jeito de torná-la pública. Aí Fernando Henrique tomou não uma, porém duas providências: demitiu Graziano e premiou o diplomata lobista com a embaixada, na Itália, junto à FAO.

Pouco depois, afastada à força a concorrente francesa, entregou o Sivam à Raytheon e telefonou ao então presidente Clinton, como contou, para informá-lo de que atendera o interesse do governo norte-americano.

2- O lançamento feito por Graziano, em artigo na Folha, teve farta repercussão. Indagado, disse "O Globo", se aceitaria a candidatura, "FH, 85 anos, foi rápido: 'Não. A Presidência abrevia a morte'."

Ah, essa briga com as palavras, tão longa, não cessa. O que a Presidência pode abreviar não é a morte, é a vida. À morte, poderia antecipá-la.


Jornal GGN

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