A suspensão do leilão para a construção da usina de Belo Monte, marcado para 20 de abril, é mais um dos obstáculos que este projeto enfrenta para sua concretização. Há argumentos ambientais, econômicos, e a interferência do imperialismo norte-americano. Mas o governo brasileiro garante que a obra sai: ela é necessária para o desenvolvimento do país.
Por José Carlos Ruy
A suspensão, anunciada ontem (dia 14) do leilão da usina de Belo Monte pela justiça federal do Pará, é o mais recente obstáculo enfrentado no esforço de aproveitamento do potencial hidrelétrico do Rio Xingu. Este ano este esforço completa 35 anos (os primeiros estudos foram feitos em 1975), e as dificuldades parecem aumentar na medida em que a concretização daquele objetivo - a construção da usina - se aproxima.
O projeto ficou arquivado durante as décadas de 1980/1990 devido à crise econômica que levou o país à estagnação e, depois, durante o governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso, cujo volume de investimentos em infra-estrutura (a construção de usinas hidrelétricas inclusive) foi zero.
No governo Lula, sua retomada enfrentou outros obstáculos. O problema agora não é a falta de recursos, e muito menos a disposição oficial de investir em infra-estrutura, mas a cerrada oposição dos santuaristas do ambientalismo - contrários a qualquer intervenção que afete o meio ambiente - aliada à resistência dos mesmos neoliberais do governo de FHC que, agora, querem impedir a obra.
Há questionamentos de variada natureza. Técnicos e jornalistas ligados à oposição questionam os valores envolvidos na construção da usina. Falava-se inicialmente em 9 bilhões de reais; esse valor cresceu para 19 bilhões e os empreiteiros que concorrem à construção já falam que pode chegar a 25 ou mesmo 30 bilhões de reais.
Há discordância também quanto ao preço da energia que será gerada em Belo Monte. O governo fixou um máximo de 83 reais por MWh, mas os empresários querem mais, falando em até 150 reais. Esse foi o argumento que levou as empreiteiras Odebrecht e Camargo Corrêa a desistir de participar do leilão marcado para abril. Essa saída foi encarada pelo governo como uma tentativa inaceitável de impor preços, e o Palácio do Planalto tomou providências para formar novos consórcios, remarcando o leilão para o dia 20 de abril (o leilão que foi suspenso, dia 14, pela justiça federal de Altamira). E o próprio presidente Lula garantiu que a usina será construída com ou sem as empresas privadas. "Estejam certos que quem apostar que o governo não tem cacife para fazer (...) o governo fará Belo Monte", afirmou.
Lula foi duro contra as ong's que se mobilizam contra a construção da usina. "Nós ficamos 20 anos proibidos de fazer até os estudos de viabilidade para Belo Monte, e agora estão aparecendo ONGs do mundo inteiro para protestar contra a hidrelétrica. Não precisam vir aqui dar palpite. Fizemos revisões do projeto e o lago vai ser um terço do se havia pensado no início", afirmou, disse, garantindo que "ninguém tem mais interesse em defender a Amazônia e os índios do que o próprio Brasil".
Os ambientalistas argumentam que a construção vai secar 100 km do rio Xingu, ameaçando a rica variedade de peixes lá existentes (o Xingu tem três vezes mais tipos de peixe do que toda a Europa) e a área alagada vai submergir terras de duas comunidades indígenas. Dizem ainda que a construção seria desnecessária porque, hoje, o Brasil tem energia elétrica sobrando, que é exportada. E renovam o sempre presente argumento da possibilidade de aproveitamento de energia solar, dos ventos, e outras.
O Ibama, por sua vez - que já emitiu uma licença ambiental para a obra com 40 condicionantes que devem ser cumpridas – desmente a alegação de que haverá 100 km de áreas secas no rio: ela será de apenas 400 metros, diz seu Diretor de Licenciamento, Pedro Bignelli; ele também assegurou que a área alagada não vai atingir diretamente áreas indígenas.
A intensa polêmica ganhou (dia 12) a arrogante e inoportuna adesão do cineasta canadense James Cameron (diretor do filme Avatar), que teve a petulância de, em um ato público contra a construção da Usina realizado em Brasília, ameaçar a soberania nacional sobre a Amazônia dizendo que “o problema de Belo Monte não é só do Brasil” mas do mundo todo, e que vai levar a questão ao Congresso dos EUA. "Vou para Washington para conversar com senadores”, ameaçou, como se lá houvesse alguma autoridade competente para tomar qualquer decisão sobre a construção de uma usina em território brasileiro!
Cameron foi imediatamente criticado pelo vice-presidente José Alencar: é a opinião de uma pessoa. “Se passar da conta, “tem que dar um pito ‘nele’”, disse o vice-presidente. Ele foi diplomático: qualquer opinião dessa "pessoa" sobre questões que dizem respeito estritamente à soberania nacional e à integridade de nosso território são inaceitáveis pois tratam-se de decisões que cabem exclusivamente ao Estado brasileiro.
A decisão da justiça federal de Altamira foi criticada pela governadora do Pará, Ana Júlia Canepa. Ela declarou respeitar as "decisões da Justiça", embora pense que elas possam ser revistas - mesmo porque, lembrou, a licença ambiental foi dada de forma responsável. E lembrou outro ponto essencial no debate: "Não se pode impedir o desenvolvimento do Pará com ações que não são do interesse de maior parte da população", disse.
Belo Monte será, quando concluída, a terceira maior hidrelétrica do mundo, atrás da usina chinesa Três Gargantas e da brasileira/paraguaia Itaipu, que tem 14.000 MW de potência; Belo Monte terá 11.233 MW. Seu lago terá 516 km², e a usina vai gerar o equivalente a 10% do consumo brasileiro.
Ela é considerada fundamental para garantir o fornecimento de energia elétrica para o desenvolvimento do Pará e do nordeste - desenvolvimento que, segundo as previsões, vai ser acelerado daqui para frente. E que poderá ser comprometido se não houver oferta suficiente de energia elétrica.
Uma questão fundamental em relação à construção da usina de Belo Monte é a defesa intransigente da soberania nacional sobre a Amazônia e o repúdio contra personalidades estrangeiras (como o cineasta Cameron) que, a pretexto de um pretenso interesse mundial, ameaçam recorrer a autoridades estrangeiras contra um projeto do governo brasileiro.
Outras dificuldades que este projeto enfrenta decorrem da legitimidade dos interesses ambientais envolvidos, principalmente a preservação dos direitos das populações indígenas e ribeirinhas afetadas, e o respeito à fauna e à flora regionais e à biodiversidade que as caracteriza. Estes são pontos sensíveis que não podem ser deixados de lado, e que são contemplados nas 40 condicionalidades impostas pelo Ibama no licenciamento da obra.
São dificuldades que precisam ser equacionadas juntamente com as imposições do desenvolvimento nacional. Qualquer obra dessa natureza e porte afeta o meio ambiente, e a intervenção do poder público deve ser a de minimizar este prejuízo ambiental e prever a reparação os danos causados principalmente às populações prejudicadas.
A correta combinação entre respeito ao meio ambiente e desenvolvimento econômico é necessária. Ela estabelece a linha tênue que separa as imposições da preservação ambiental da nociva preservação do atraso, que freia e limita o desenvolvimento nacional.
Do Portal Vermelho
quinta-feira, 15 de abril de 2010
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