Não podemos, em hipótese alguma, concordar com o voto do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Eros Grau - ele mesmo preso e torturado na década de 70 - relator da ação em julgamento ontem e hoje pela Corte sobre a Lei da Anistia de 1979 e que ele defende que não seja revista.
A ação é de autoria da Ordem dos Advogados do Brasil (nacional) e questiona o caráter recíproco dessa lei, se ela seria extensiva aos agentes do Estado que prenderam, torturaram, mataram e desapareceram com adversários do regime durante a ditadura militar.
Impossível concordar com o parecer do ministro-relator, porque o Congresso Nacional que aprovou a Lei de Anistia em 1979 era um parlamento sob tutela da ditadura militar. Fora eleito sob leis de exceção, dentro de um regime discricionário, sem as garantias fundamentais de uma constituição democrática que só viemos a ter nove anos depois.
Fora a questão líquida e certa - inclusive pelas leis internacionais - que a tortura é um crime imprescritível. Então, manter a Lei da Anistia como está, seguramente trará condenações à nossa legislação e ao país nas cortes internacionais. Começando pela Corte Internacional de Defesa dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) que nos próximos dias 20 e 21 de maio julgará a questão da Guerrilha do Araguaia e nossa legislação - inclusive esta Lei da Anistia - e deve condená-la.
Enquanto o voto do ministro-relator, Eros Grau, defende a manutenção da lei anistiando também torturadores (leia nota acima) assistimos agora mesmo um caso covarde e hediondo em São Paulo: oficiais e policiais militares do Estado, em serviço e usando um próprio (prédio) público, torturaram e assassinaram um jovem motoboy indefeso e detido de forma ilegal e abusiva.
Temos aí, concretamente, à mão, ainda nesses dias, um exemplo da prática da tortura e do "suicídio" de presos, como no caso do serial killer que recentemente foi "suicidado" numa prisão do Estado, em Goiás. Diante de realidade tão cruel e ainda presente em nossos dias, não há como concordar com a voto do ministro Eros Grau.
Até porque ele se apóia num argumento político falso, o de que quando da elaboração e votação da Lei da Anistia em 1979 houve um pacto político que beneficiou a todos os lados. Não houve isso. O Congresso Nacional votou e uma maioria aprovou essa Lei da Anistia.
Não se pode colocar no mesmo patamar os dois (ou mais) lados
Não, porque um detinha o poder de Estado por meio da força e o exercia do forma ditatorial, violando as garantias constitucionais, impondo ao país, inclusive, um parlamento manietado e sem autonomia e liberdade, com seus poderes tutelados pelo regime militar; o outro lutava pela liberdade e pela democracia, tinha legitimidade e autoridade dadas pela Carta de Direitos Humanos das Nações Unidas, que reconhece o direito de rebelião contra tiranias e ditaduras.
O voto do relator trata da cidadania dos brasileiros, de cidadãos em pleno gozo de seus direitos que naquele período pós-golpe militar de 1964 e enquanto durou a ditadura foram presos e, indefesos - como o próprio ministro Eros Grau -, torturados e assassinados.
Muitos, como sabe e se lembra o ministro-relator, jamais voltaram. São "desaparecidos políticos" até hoje sem que seus algozes e torturadores, assassinos, criminosos tenham respondido à justiça por seus crimes. Continuam impunes. Querem que assim continuem?
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