Postado em 08 nov 2015
por : Carlos Fernandes
Deltan Dallagnol
No jogo político muitas vezes uma única frase pronunciada pode fazer toda a diferença entre o sucesso e a derrota. E em boa medida, importa menos o sentido simbólico que denota do que o impacto imediato que provoca no povo, e por conseguinte, nos eleitores.
Foi assim com Ciro Gomes quando candidato à presidência com chances reais de vitória. Ao ser questionado sobre a atuação de sua então esposa, Patrícia Pillar, nas decisões que eram tomadas na sua candidatura, declarou: “o papel de minha mulher na campanha é dormir comigo”. Foi o suficiente para ver o seu barco afundar. Se era verdade ou uma simples “brincadeira”, até hoje ficamos sem saber.
Na contra-mão de Ciro, Marina Silva se utilizou de uma frase de efeito para alavancar sua candidatura na disputa de 2014 após o trágico acidente que vitimou Eduardo Campos. O “Não vamos desistir do Brasil” soou como música para uma população ainda perplexa com a tragédia. Não deu outra, de um longínquo terceiro lugar, Marina se viu imediatamente nas alturas. Não fosse a sua desarticulação de idéias e o seu cansaço visível, não haveria tempo do cambaleante Aécio Neves reverter a situação e seguir para o segundo turno.
Pois bem, isso faz parte do universo misterioso da política. Sempre fez e muito provavelmente sempre fará. Mas e quando tudo isso foge da seara política e descamba para os membros da justiça federal?
O procurador da República e coordenador do MPF nos trabalhos que investigam a operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, disse recentemente numa palestra que proferiu num evento voltado para dentistas (sim, procuradores estão dando palestras para dentistas), que “Não vamos desistir do nosso país”. O quase “showmício” foi promovido pela ONG Turma do Bem em São Bento do Sapucaí, interior de São Paulo, no qual o procurador foi aplaudido de pé por uma platéia composta de 300 selecionados.
Não é preciso ser um jurista renomado para saber que juízes e promotores só deveriam se pronunciar sobre os casos em que estão envolvidos, exclusivamente nos autos. Mas vivemos dias estranhos e tanto o juiz federal Sérgio Moro quanto o procurador Deltan Dallagnol, além de suas atribuições nos processos, estão se utilizando dos cargos que ocupam para virarem uma espécie de “heróis nacionais”.
Se a utilização da função pública para se auto-promover já é algo que destoa da moralidade, tornar um processo criminal numa perseguição política a um partido em particular, requer altas doses de juízos de valores nos julgamentos que efetuam. E, todos sabemos, um juiz julgar baseado nos seus próprios valores, e não na lei, é o pior dos vícios jurídicos.
Se a opinião pública está sendo motivo de tanto interesse para os investigadores da Lava Jato, seria importante que eles soubessem que uma boa parte da população brasileira considera as pirotecnias que estão sendo realizadas como um acinte à razão e à imparcialidade de seus julgadores. Não é razoável que um juiz e um procurador federais que até bem pouco tempo eram completamente desconhecidos de todos, agora virem celebridades a darem entrevistas e palestras em todo o país.
Além do que, desde a época que Marina Silva se aproveitou da situação para decretar que “não vamos desistir do Brasil”, me pergunto quem realmente desistiu desse país. Se formos honestos histórica e intelectualmente, perceberemos que jamais o combate à corrupção foi tratado tão à sério. Já se vão treze anos em que o PGR não é mais apelidado como “Engavetador Geral da República” e nunca a PF teve tanta liberdade para investigar como agora.
Inúmeras vezes já desistiram do Brasil. A grande mídia e a plutocracia brasileira desistiram quando entregaram a nossa democracia aos generais; os banqueiros desistiram do Brasil quando reagiram fortemente à tentativa de reduzir os juros; a classe alta desistiu quando se revoltou com a nova classe emergente. Nisso ficamos sabendo quem são os verdadeiros desertores dessa nação.
Pois é, Moro e Dalllagnol, não precisamos de suas palestras para não desistirmos do Brasil. Pelo contrário, esse é o período em que mais as instituições desse país foram fortalecidas. Por favor, atenham-se exclusivamente aos autos. Já temos políticos demais.
Sobre o Autor
Economista com MBA na PUC-Rio, Carlos Fernandes trabalha na direção geral de uma das maiores instituições financeiras da América Latina
Diário do Centro do Mundo
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