Postado em 5 de dezembro de 2015 às 1:14 am
Da BBC:
A decisão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de aceitar o pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff foi interpretada por analistas americanos como “atitude vingativa” e última opção para tentar tirar a atenção das denúncias de corrupção que ameaçam o cargo e o mandato do deputado.
“É quase certo que ele está de saída, então é uma atitude muito vingativa da parte de Cunha. E que irá gerar muita confusão pelos próximos meses no país”, disse à BBC Brasil o cientista político Matthew Taylor, professor da American University, em Washington, e co-editor do livro Corrupção e Democracia no Brasil.
“Cunha e Dilma vinham há meses em um tipo muito estranho de teatro kabuki (forma de teatro japonês conhecida pela estilização do drama), em que Cunha usava (a ameaça de) impeachment para enfrentar o governo e o governo ameaçava uma investigação ética, mas não fazia muito para levar isso adiante. Ambas as partes tinham bons motivos para ameaçar e não agir”, analisa.
“A gota d’água foi, obviamente, o voto dos três deputados do PT no Conselho de Ética da Câmara”, afirma Taylor sobre a decisão da bancada do PT de votar pela continuidade do processo de cassação contra Cunha, que é acusado de mentir sobre a existência de contas bancárias na Suíça.
Para o cientista político Riordan Roett, diretor do programa de estudos da América Latina da Universidade Johns Hopkins, em Washington, o deputado parece ter se sentido “encurralado” e agora usa o impeachment para “distrair colegas na Câmara para que não o removam da presidência da Casa e, possivelmente, do Congresso”.
“Cunha estava contra a parede, e sua única opção era tentar distrair a Câmara de seus problemas e agir pelo impeachment”, afirmou Roett.
O presidente emérito do instituto de análise política Inter-American Dialogue, Peter Hakim, disse à BBC Brasil que o fato de Cunha enfrentar acusações de corrupção afeta a legitimidade do pedido de impeachment.
“Ele está muito enfraquecido. Se ele fosse reconhecido com um indivíduo muito honesto, o caso seria mais forte”, observa.
Os brasilianistas consideram cedo para prever o resultado do pedido de impeachment – protocolado pelos advogados Hélio Bicudo, ex-petista, Miguel Reale Jr., ex-ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso, e Janaína Paschoal.
São necessários 342 votos (dois terços da Câmara) para que o processo de impeachment seja aberto. Dilma precisa, portanto, de pelo menos 171 votos para barrar o processo.
“Neste momento, não há votos para impeachment. Mas não sei o que vai acontecer em duas semanas, dada a volatilidade de Brasília”, disse Roett.
Para Hakim, a questão agora é política, não apenas jurídica, e a possibilidade de impeachment parece mais real.
“Não é apenas uma maneira fictícia de falar sobre se livrar dela (Dilma). A maioria das pessoas no Brasil quer o impeachment. E mais um passo foi dado nessa direção. Então acredito que a possibilidade de impeachment seja mais verossímil do que era ontem”, ressalta Hakim.
Ele cita a possibilidade de que o episódio possa gerar mais apoio a Dilma dentro do PT.
“Dilma não é mais muito amada no PT. E, de uma hora para outra, parece que pode ser removida do cargo. Isso pode gerar maior apoio do que ela tinha antes”, diz Hakim.
Taylor disse acreditar que, no momento, as chances de Dilma sobreviver ao impeachment ainda sejam “muito boas”.
“Mas isso (o processo) significa que o cenário geral da política brasileira acaba de ficar muito mais incerto”, destaca.
Os autores do pedido acusam a presidente de crime de responsabilidade fiscal.
“Esta é, em muitos aspectos, a mais fraca das acusações que poderiam ser feitas”, avalia Hakim.
Segundo ele, caso houvesse provas de envolvimento de Dilma no escândalo de corrupção na Petrobras ou de que candidatos tinham conhecimento de dinheiro ilegal no financiamento de suas campanhas, essas seriam acusações mais fortes.
Para Taylor, a grande questão é o cálculo que a oposição terá de fazer.
“Há um cálculo muito difícil, que é se querem criar um mártir, e dar ao PT razão verossímil para alegar que isso é golpista, ou se preferem deixar que Dilma se consuma em uma crise criada por ela própria”, diz.
Nesse sentido, Taylor afirma crer que a oposição ficaria secretamente aliviada se o processo não for adiante, apesar do risco de perder eleitores que apoiam a saída imediata da presidente.
Para Taylor, Cunha não é mais relevante para o que irá acontecer de agora em diante. Ele ressalta que “é muito mais fácil expulsar Cunha (do cargo e do Congresso) do que levar adiante o impeachment”.
“Por outro lado, o trem do impeachment já deixou a estação”, diz, ao ressaltar que, uma vez iniciado o processo, agora não há como voltar atrás.
Os analistas concordam que a notícia representa mais um golpe à imagem do Brasil no exterior, que já vinha sofrendo nos últimos tempos.
(…)
Diário do Centro do Mundo
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