terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Lava Jato possui apenas a aparência do bom direito, por Marcio Valley

SEG, 30/11/2015 - 20:23



Por Marcio Valley

Pois, é... Enquanto nossa imprensa não vê problema algum nos procedimentos de nossos juízes heróis e estrelas, como Joaquim Barbosa e Sérgio Moro, a imprensa estrangeira lança sobre eles um outro olhar, como demonstra o jornal The Sunday Times que o Nassif aponta em seu texto.

Outro dia, foram os alemães e os espanhóis. Agora, são os juristas ingleses a acusar a Lava Jato de ferir princípios constitucionais do Brasil. Falam sobre coisas que estranhamos, coisas sofisticadas que integram o cotidiano de países mais avançados civilizatoriamente. Coisas como direitos humanos, defesa irrestrita dos direitos e garantias individuais, devido processo legal, ampla defesa e vedação incondicional de provas obtidas por meios ilícitos. Claro, eles não entendem nada de Direito, não é mesmo?

Duvido muito que os juristas italianos, modelos confessos do deslumbrado jurisconsulto paranaense, defenderiam os procedimentos da Lava-Jato, assim como, antes, os juristas alemães discordaram veemente do modo distorcido como Joaquim Barbosa utilizou a teoria do domínio do fato, ao ponto de o próprio criador da teoria afirmar que aquele arremedo de doutrina de modo algum representava a que ele pontificava. Uma vergonha para uma corte suprema ser admoestada assim pelo próprio doutrinador mencionado na decisão.

Quando se passa a mirar somente no fim e, por conta disso, a suavizar recriminações quanto aos meios para tal, estamos no limite do retorno à barbárie.

Quem quiser que acredite em confissões obtidas por tortura. Prisão sem condenação e por tempo indefinido, como as de Guantánamo, representam tortura e são ilícitas no mundo inteiro, ainda que travestidas por roupagem jurídica.

Pessoas civilizadas entendem a importância da amplitude do conceito de cidadania e jamais cairão nesse canto kafkaniano de sereia jurídica. Joaquim Barbosa e Moro são exemplo de juristas que criam as jabuticabas do nosso direito.

Coisas assim explicam bastante bem as razões pelas quais possuímos tão poucos expoentes na ciência do Direito com repercussão para além de nossas fronteiras. Tornar-se um grande pensador do Direito exige ausência de covardia intelectual e desprendimento material, virtudes que, pelo que parece, são raras no Brasil. Basta lembrar a atuação de nosso glorioso STF durante o regime militar, quando os ministros, com raríssimas e honrosas exceções, o plural é por educação, se tornaram cordeirinhos obedientes.

Essa pusilanimidade com a inversão de valores, pelo visto, persiste em nossa tradição jurídica.

De toda sorte, vale a pena refletir sobre o quanto estamos dispostos a aquiescer com a perda de direitos, mesmo na hipótese de prisão do pior dos traficantes, em nome de uma suposta moralização. Moralizações desmedidas, e viciadas quanto aos atingidos, que são escolhidos a dedo, sempre foram danosas para a sociedade.

Deve-se lembrar que perda de direitos é sempre, sem exceção, um bumerangue. É lançado contra os inimigos públicos e, depois, quando os alvos rareiam, a monotonia os faz voltar contra toda a população.

A Lava-Jato possui apenas a aparência do bom direito, nada mais. Já causou muitas vezes mais danos ao Brasil do que a corrupção que visava combater. E, pelo andar da carruagem, continuará a fazê-lo, por que a intenção não é, de fato, combater a corrupção. Fosse assim estariam sendo alcançadas pessoas públicas de todas as cores, que já foram mencionadas e apontadas diversas vezes. Mas não é assim que ocorre. A seletividade é um componente imoral que definiu a Lava-Jato. Somente um determinado grupo de pessoas é atingida. A análise desse comportamento, também ilegal, evidencia que o interesse subjacente é desmanchar a economia brasileira em benefício de corporações internacionais.

A Lava-Jato é a versão jurídica do projeto político do PSDB, projeto esse que, evidentemente, é idêntico ao das empresas que representam a grande mídia, pois elas integram as corporações interessadas. Isso é bastante evidente para quem coloca mais do que um olho raso sobre as manchetes escandalosas.

O roteiro de sempre está sendo encenado à vista de todos. Isso já foi realizado diversas vezes contra vários países subdesenvolvidos do mundo. O clímax ocorre quando o país-alvo adota medidas corretas para se fugir do subdesenvolvimento. A partir daí, o contra-ataque é rápido e feroz. Não se medem consequências. Dependendo das circunstâncias, admite-se até a guerra.

No caso do Brasil, não se chegou, e talvez nunca se chegue, ao extremo da guerra. A reação por aqui é institucional. Já foi militar, hoje e judicial.

O ponto de inflexão no desenvolvimento de nossa economia, ocorreu com o Mensalão e prosseguiu com a Lava-Jato, ambos processos travestidos com a capa da legalidade, mas que operam em sintonia com os interesses dos patrões do mundo.

O final desse filme será o mesmo reservado aos países da periferia: economia nacional quebrada e dependente das metrópoles, desemprego, aumento da miséria e transferência ainda maior da riqueza para os milionários, esses que já abdicaram das próprias nacionalidades há muito tempo.

Atualmente, não há porque ter orgulho de grandes empresas brasileiras, sejam bancos, empreiteiras ou cervejarias. Elas não se preocupam de fato com o país, mas somente com sua lucratividade. Não possuem conflitos de consciências em retirar seu capital do país ao primeiro sinal de dificuldade.

Não podemos reclamar. Estamos escolhendo livremente o nosso destino. Enganados? Pode ser, mas porque queremos ser enganados. Pode-se perdoar a idiotia, pois se trata de um problema mental, mas não a burrice que se vangloria de ser burra e se faz de desentendida para não ser esclarecida.

Os dados estão aí, não enxerga somente quem não quer enxergar.

O duro, o duro mesmo, é estar retornando à escuridão do nosso conhecido fundo do poço, que é onde sempre estivemos, quando se estava tão próximo da boca do poço, tanto que era possível enxergar o sol brilhando no céu e o vento do desenvolvimento afagando nossas faces.

Ficará, mais uma vez, para a próxima geração?


Jornal GGN

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