8 de Fevereiro de 2018
Tereza Cruvinel
As recentes declarações do ministro Luiz Fux levam qualquer brasileiro com pelo menos dois neurônios e uma dose mínima de realismo a concordar com o vaticínio sombrio do ex-ministro Roberto Amaral em seu artigo “O Poder do Judiciário e os dias piores que virão” (Carta Capital). Dias piores parecem estar mesmo a caminho. Na esfera jurídica, com o aprofundamento da grave hipertrofia do Judiciário, que cada vez mais legisla e interpreta as situações como quer, ao saber das conveniências políticas, dispensando-se de apontar a base legal e constitucional de suas decisões. E com isso, como diz o jurista Lenio Streck, o Direito vai se transfigurando em mera teoria política do poder, lastreada na moral vigente. Neste momento, este Direito distorcido tem como tarefa eliminar Lula da disputa política.
No campo da política propriamente dita, achei desalentador o prognóstico de Antonio Augusto de Queirós, diretor do Diap, de que o Congresso terá uma renovação inferior a 50%, apesar da tão falada desilusão com a política, e que ele ainda será pior que o atual, mais conservador e mais fisiológico, com ampliação das bancadas da Bíblia, do boi, da bala e dos empresários. É desalentador porque Queirós costuma acertar muito em suas previsões eleitorais. Comecei a conferi-las ainda na eleição da Constituinte, em 1986, sempre reconhecendo o acerto de seus prognósticos. Agora ele diz:
- A pauta do Congresso que será eleito em 2018, com a criminalização da esquerda e o afastamento do PT do governo, tende a ser mais conservadora. Todas as bancadas do campo conservador estão investindo na expansão. Isso aponta para o aumento da tensão em relação a temas como maioridade penal, derrubada do estatuto do desarmamento, limitação de debates e políticas envolvendo questões de gênero e semelhantes.
Diante disso, os candidatos a presidente do campo progressista não podem negligenciar o imperativo de fazer campanha pedindo também aos eleitores muito cuidado na escolha dos candidatos a deputado federal, principalmente. Se o Brasil tivesse, como na França, eleitores parlamentares posteriores ao pleito presidencial, os eleitores mais facilmente proporcionariam ao presidente eleito este alinhamento. Mas como aqui o pleito é simultâneo, vamos ter novamente o quadro promissor de crise: presidente sem maioria no Congresso.
Mas voltemos ao Judiciário, onde Fux é o protagonista da semana. Como novo presidente do TSE, primeiro ele exercitou uma espécie de “jogo consumado” ao dizer que a candidatura presidencial do ex-presidente Lula é “irregistrável”. Ele sabe que não há jurista capaz de concordar com este reducionismo, pelo qual qualquer juiz eleitoral pode rasgar o pedido de registro invocando a Lei da Ficha Limpa, sem que tenha havido provocação (pedido de impugnação) de partido, de outro candidato ou do Ministério Público Eleitoral. O rito sempre foi isso: mesmo condenado, o candidato pede o registro e os incomodados é tratam de reagir. Sempre foi assim, por que deixaria de ser agora? Por que Lula é a bola da vez, ora bolas. Hoje Fux informou que o colegiado examinará o assunto, admitindo que uma brecha da lei admite, sim, o registro de candidato condenado em segunda instância, e que a partir disso é que viriam os pedidos de impugnação. De modo que ele não recuou. Apenas informou que tal decisão não será monocrática (pois se fosse já estava claro o que ele faria) mas sim colegiada. Ou seja, mais uma vez o Judiciário vai inovar, vai rever tudo o que vinha sendo feito até aqui, vai se dispensar de apresentar embasamento legal ou constitucional para dar conta de sua parte no golpe prolongado, tornando a candidatura de Lula natimorta, privando-o de recorrer a liminares. Parece que é este o jogo de Fux.
O que chamam de ativismo judicial não passar de casuísmo judicial, o jogo dos dois pesos e duas medidas. É isso que apequena o Judiciário, embora o Poder hoje tão sobranceiro não se dê conta disso. Quando se der, já estará como o Legislativo e Executivo, com a credibilidade carcomida.
Brasil 247
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