DOM, 10/06/2018 - 08:49
ATUALIZADO EM 10/06/2018 - 08:52
Quem deve ter a última palavra na democracia brasileira: a soberania do povo ou a autocracia do judiciário?
por William Nozaki
A pesquisa Datafolha divulgada hoje, sobre as intenções de voto para a presidência da República, suscita uma reflexão sobre a razão política por trás das racionalidades eleitorais.
A eleição de 2018, se houver, cada vez mais assume um caráter plebiscitário: para o povo 5 candidatos são relevantes (Lula, Bolsonaro, Marina, Alckmin e Ciro), os outros 14 candidatos restantes que pontuam, mesmo se somados, não tem competitividade e/ou viabilidade eleitoral. Noutras palavras, a pulverização partidária não captou o sentimento da maioria do eleitorado.
Neste "plebiscito", a população quer chancelar Lula, ou o que ele apresenta de positivo para presidente (sua intenção de voto é de 30%); e o povo quer rechaçar Temer e o que ele representa de negativo para o país (a rejeição do nome indicado por ele é de 92%). Em suma, nas urnas, é muito improvável que o projeto anti-povo e pró-mercado perca para os projetos democráticos, nacionais e populares.
Para além das contas sobre essa ou aquela aliança e coligação, a questão fundamental em jogo é: a maioria do eleitorado quer ver Lula no pleito, e/ou quer sufragar o ex-presidente, APESAR das condenações na 1ª Vara de Curitiba, no TRF-4 do Sul e na Lei da Ficha Limpa.
Nesse caso, a pergunta que vai à raiz do problema, sendo portanto a questão radical, é: na democracia brasileira, o poder deve emanar da soberania do povo ou da autocracia do judiciário? A lei da casta jurídica deve ser intocável diante do que a vontade popular entende ser justo? Depois de assistir os Três Poderes agindo inúmeras vezes fora da lei, não é legítimo e compreensível que o povo queira se colocar acima da lei definida por esses mesmos Poderes?
O golpismo se colocou em uma encruzilhada: ou faz eleição sem povo, mantendo Lula fora do jogo, ou deixa o povo sem eleição, impondo alguma alteração no calendário eleitoral, contando com a cumplicidade do Legislativo, ou ainda promovendo algum casuísmo pró-parlamentarista, mais uma vez com a anuência do Judiciário.
Para além dessas opções, resta ao condomínio privado que hoje ocupa o poder público admitir a derrota, submetendo os interesses do mercado à vontade das urnas.
Em qualquer desses cenários o ponto incontornável é o de que uma eleição sem Lula livre não pode ser uma eleição livre, pois, ao tratar como ilegal o candidato do povo o sistema jurídico-político trata como ilegal a própria vontade do povo.
Se assim o for, ao desejar votar em um candidato ilegal, à sua moda, o povo brasileiro expressa a disposição de, pela via institucional da eleição, colocar nossa democracia diante de seus limites radicais.
William Nozaki - Professor de ciência política e economia da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) e da Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (FLACSO).
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