7 de agosto de 2014
por Paulo Moreira Leite
Ato com presença de Lula mostra dissidência de entidades importantes com central de Paulinho
Depois de encontrar empresários da indústria e responder a uma sabatina do agronegócio, Dilma Rousseff comparece a um encontro de trabalhadores às 18 horas de hoje no ginásio da Portuguesa, em São Paulo. Com a presença de Lula, o evento com sindicalistas – espera-se 5 000 lideranças do Estado — não seria uma novidade na história das eleições de uma candidatura do PT não fosse pela presença de um numeroso contingente de dirigentes da Força Sindical, segunda maior central sindical do país.
A dissidência da Força Sindical chama a atenção não só porque se trata de uma central nascida como oposição a CUT e ao PT. Trata-se da base de apoio do deputado Paulinho, do Solidariedade, hoje a principal liderança de Aécio Neves no movimento social e maior esperança do PSDB para seu candidato crescer numa área do eleitorado na qual o cabo eleitoral Luiz Inácio Lula da Silva reina como uma força única e imbatível.
“Não dá para achar que o Aécio pode ser uma solução melhor para os trabalhadores,” afirma Sergio Luiz Leite, 1º secretario da Força Sindical e presidente da Federação dos Trabalhadores nas Industrias Químicas de São Paulo. Num Congresso recente, com direito a discurso de Lula, a maioria dos 35 dirigentes dos sindicatos da categoria deixou claro – sem que a questão tivesse sido votada formalmente — seu apoio a Dilma.
Ao anunciar que o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga seria seu principal assessor econômico, Aécio pode ter oferecido um selo de garantia para os mercados mas, em compensação, facilitou o argumento de seus adversários no movimento popular, pela referencia ao governo de Fernando Henrique Cardoso. “É fácil explicar que, com Armínio, todo ajuste fiscal se faz com arrocho e a inflação se combate com a queda no consumo,” diz Sergio Leite.
Não há números precisos para definir a dissidência. Estima-se que possa envolver alguma coisa como um terço dos 1600 sindicatos registrados no Ministério do Trabalho como filiados à Força. Mesmo que o cálculo possa estar exagerado, o movimento não deixa de ser expressivo, até porque muitos rebeldes se concentram em entidades maiores, a começar pela região da Grande São Paulo. Os metalúrgicos de Guarulhos, Osasco e Santo Andre aderiram a Dilma, bem como a fatia da entidade que, em São Paulo, se alinha com José Carlos Gonçalves, o Juruna, que apoiou Lula contra José Serra no segundo turno de 2002. (No primeiro turno, o próprio Paulinho estava na campanha, como vice de Ciro Gomes).
Permanecem com Paulinho (e Aécio) seu substituto na presidência da Força, o metalúrgico Miguel Torres. Outro importante integrante da caravana tucana é Antonio Ramalho, deputado estadual pelo PSDB paulista, líder de uma greve histórica da construção civil, em 1994. Ramalho tem feito campanha por Aécio na periferia de São Paulo, onde diz que tem encontrado ouvidos mais receptivos do que se poderia supor, quando se considera que poucos trabalhadores brasileiros receberam tantos benefícios, nos últimos anos, como a construção civil, fosse pela criação de empregos, fosse pelo registro em carteira e mesmo aumento de salário real.
“Apesar da melhoria, eles esperavam muito mais,” diz Ramalho. “Eles fazem o Minha Casa Minha Vida mas não conseguem usufruir do sistema. Sua renda familiar ultrapassa o teto das faixas para os menores salários.”
Referindo-se aos trunfos adversários, Ramalho diz que “dá para discutir muita coisa. Mas não dá para discutir o Lula.” Lembrando um episódio real, ocorrido anos atrás, ele conta que conheceu uma família que tinha um altar para o Padre Cícero em sua casa “mas depois tirou o retrato do Padim para colocar o do Lula.”
A força de Lula na campanha pelo voto dos trabalhadores é real. “Mudei meu voto depois de conversar com ele,” conta Geraldo Pereira Filho, presidente do Sindicato dos Químicos de Suzano. “Antes, eu dizia ‘Dilma nunca mais.’ Não gostava dela porque não ouvia os trabalhadores”conta Geraldo, que, anos atrás, chegou a votar em candidatos do DEM. Ele conta que mudou de opinião depois que, numa conversa, Lula lembrou algumas conquistas favoráveis aos trabalhadores que ocorreram no governo da sucessora. “Eu acho que temos obrigação de apoiar a reeleição,” diz Geraldo. Ele chegou a planejar o comparecimento ao evento na Portuguesa, mas está impedido – no mesmo horário, precisa submeter-se a uma sessão de hemodiálise para compensar o mau funcionamento dos rins.
Além de seu reconhecido talento para convencer os interlocutores, os argumentos empregados por Lula na conversa envolvem, basicamente, uma espantosa relação de 14 leis de interesse dos assalariados que Dilma apoiou ou sancionou durante o mandato – e que a maioria dos brasileiros só começou a tomar conhecimento nas últimas semanas. Compilada por Antonio Augusto de Queiróz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar, divulgado em vários formatos, a relação lembra, entre outras medidas, a ampliação do aviso prévio de 30 para 90 dias, a polícia de aumento real para o salário mínimo que vigora até 2015, os direitos dos trabalhadores domésticos e punição ao trabalho escravo. “O absurdo é que até agora ninguém fazia ideia disso,” diz Sergio Leite, referindo-se ao conhecido mantra que acompanha o governo Dilma: fosse por falta de vocação da presidente, ou por excesso de má vontade da mídia, ou pelos dois elementos somados, a política de comunicação nunca foi capaz de fazer uma boa prestação de contas para a sociedade durante a maior parte do mandato.
Do ponto de vista da substância, o convívio entre Dilma e os sindicatos não é uma maravilha mas funciona. “Ela discute o que deve ser discutido e pede nossa opinião”, diz Juruna. Mas falta sintonia num ponto importante. O governo foi capaz de fazer negociações importantes e mesmo atender pleitos específicos, como aconteceu com a isenção de imposto de renda para o PLR, participação em lucros e resultados. Era uma reivindicação antiga dos trabalhadores, até porque as empresas estão isentas de qualquer imposto neste caso. Os sindicatos queriam isenção até R$ 10000. O governo deu para quem recebe R$ 6000, patamar que, se não atingiu todos assalariados das principais categorias, chegou a 80% do total, pelo menos, o que foi comemorado pela maioria. Anunciada no 1 de maio de 2013, a medida levou sete meses para ser oficializada – numa cerimônia solitária, sem a participação das lideranças. Não era só o gosto natural de aparecer na foto. É que a medida nasceu da mobilização dos sindicatos, que chegaram a ocupar a via Anchieta em passeata para pedir a isenção. Lembrando que há muitos anos os sindicatos enfrentam uma campanha de denuncia e descrédito que procura esconder os benefícios reais que podem trazer aos assalariados, Sergio Leite observa: ”Era uma boa hora do trabalhador saber o que as entidades podem fazer por ele.”
Durante os preparativos para o encontro, o PT tentou garantir a presença do candidato ao governo Alexandre Padilha. Lembrando que nem todos aliados de Dilma também estão engajados na campanha de Padilha, a maioria das centrais se opôs a ideia. Na noite de ontem, informou-se que Padilha não vai comparecer.
Paulo Moreira Leite é diretor do 247 em Brasília. É também autor do livro "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA, IstoÉ e Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".
Brasil 247
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