6 de setembro de 2014
por Paulo Moreira Leite
A prudência recomenda cautela contra denúncias divulgadas em véspera de eleição. O risco é óbvio: escândalos de última hora causam sensação na mesma medida em que prejudicam uma apuração serena. Hipóteses que não foram provadas ganham a fisionomia de fatos reais. Suspeitos – ou nem isso – logo são apontados como culpados.
Escândalos dessa natureza são mais difíceis de apurar e, muitas vezes, não há o interesse de esclarecer. O que se quer é o barulho.
É claro que estou falando da delação premiada de Paulo Roberto da Costa, o diretor da Petrobrás que está nos jornais e revistas – em breve estará na TV – fazendo uma delação premiada contra o PT e o governo Dilma.
Não custa lembrar que a suspeita mais consistente, até o momento, aponta para o próprio Paulo Roberto. Ameaçado de cumprir 30 anos de prisão por corrupção, ele tem todo interesse em diminuir a própria acusação em troca de denúncias que possam envolver políticos e autoridades.
Li num jornal que, se fizer o serviço direitinho, Paulo Roberto poderá, dentro de poucos dias !, voltar para casa com um chip no tornozelo.
Outro aspecto é que ninguém sabe o que ele disse — oficialmente. Sabemos de acusações que lhe são atribuídas pelos jornalistas mas não há denúncias entre aspas, assinadas, que poderiam ter um valor maior do que palavras impressas que tanto podem virar coisa séria como apenas embrulhar peixe na feira do dia seguinte.
O fato de que o depoimento de Paulo Roberto foi criptografado e se encontra guardado num computador que não pode ser acessado via internet torna o conteúdo da denúncia – e seu vazamento – ainda mais misterioso.
As informações são verdadeiras? Não se sabe — até porque não tivemos uma investigação com base em provas e outros indícios para atestar sua consistencia, ou não.
As informações estão sendo divulgadas com isenção, ou de forma seletiva, de acordo com a preferência politica de quem publica a história? Também não podemos saber antes de ter acesso ao conteúdo integral dos depoimentos.
O que sabemos é que entre as personalidades acusadas, nenhuma denúncia foi confirmada, por mais vaga que fosse. Os envolvidos desmentiram mas não receberam o devido crédito por suas palavras.
Você não precisa acreditar neles e achar que têm todo interesse em falar mentiras. Mas se é assim, por que acreditar que o delator sempre fala a verdade?
Estamos falando de reportagens que querem construir um pré-julgamento quando faltam quatro semanas até a eleição, o que torna a comparação com o mensalão de 2005, ensaiada por vários veículos, particularmente irônica.
Não custa lembrar que a suposta compra de votos do esquema Delúbio-Marcos Valério nunca foi demonstrada e o desvio de milhões de reais do Banco do Brasil é desmentido por todas as auditorias realizadas na instituição.
Restaram, é claro, as reportagens sobre o assunto e, graças a elas, um dos mais perversos exercícios de criminalização da atividade política.
Por que achar que dessa vez tudo está sendo feito corretamente? Temos uma “nova” midia, para fazer companhia a uma “nova” política?
Impossível saber. A experiência ensina que não se deve julgar aquilo que não se conhece, certo?
Já vimos este filme, que tem sempre o mesmo personagem. Em 1989, a campanha de Collor trouxe Lurian para o horário político, usando um depoimento comprado para acusar Lula.
Em 2006, a denúncia da AP 470 parecia sob encomenda para impedir a reeleição — mas não funcionou. Em 2012, o julgamento deveria atingir os candidatos do PT mas eleições municipais. Também não funcionou.
Paulo Moreira Leite é diretor do 247 em Brasília. É também autor do livro "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA, IstoÉ e Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".
Brasil 247
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