publicado em 03 de março de 2015 às 19:17
por Luiz Carlos Azenha
A mídia vibrou com a vitória de Eduardo Cunha na disputa pela presidência da Câmara. Menos pela figura, mais por representar uma derrota do governo Dilma e a fratura do governo de coalizão.
Nos últimos meses, antes e depois de se eleger, Cunha tratou de garantir cobertura positiva com declarações como esta, dada nas páginas amarelas da Veja, aquela mesma que anteriormente elegeu Demóstenes Torres como um dos mosqueteiros da ética:
Sou absolutamente contrário à regulação da mídia, seja de conteúdo, seja de natureza econômica. O PMDB se originou de uma frente para combater a ditadura. A liberdade de expressão e a democracia são princípios fundamentais para o partido. Você pode me xingar e me atacar à vontade. Se eu me sinto ofendido, tenho o direito de recorrer à Justiça. Como diz aquele velho ditado: para má imprensa, mais imprensa.
A propósito, a regulação da mídia cogitada no Brasil não afeta a imprensa (jornais, revistas, etc.).
Trata-se de regulamentar os artigos da Constituição de 1988. Eles expressam com clareza o objetivo dos constituintes: evitar monopólios no setor e promover a produção regional de conteúdo na mídia eletrônica, ou seja, emissoras de rádio e TV.
Confundir a Constituição de 1988 com a ditadura militar, como fez Eduardo Cunha, é ignorância ou má fé. Provavelmente, no caso dele, uma combinação dos dois.
Ao Estadão, Cunha afirmou: “Regulação econômica de mídia já existe. Você não pode ter mais de cinco geradoras de televisão”.
Outra balela, obviamente. Sempre é possível controlar uma sexta geradora através de laranjas. Ou de aliados políticos.
E mais: o fato de um empresário ter apenas cinco geradoras não o impede de exercer virtual monopólio em um único mercado. Vejam o caso do Rio de Janeiro, onde as Organizações Globo controlam apenas uma emissora de TV, mas também os maiores jornais e várias emissoras de rádio e de TV a cabo. Chama-se “propriedade cruzada” e é regulamentada na grande maioria dos países que a turma da Veja chama de “civilizados”.
Não foi por acaso, acreditem, que os entrevistadores de Veja e do Estadão não perguntaram a Eduardo Cunha: você é contra senadores e deputados serem sócios de empresas de comunicação, através dos quais turbinam suas perspectivas de reeleição?
Será que ele acha isso “democrático” ou “ditatorial”?
Aliás, como demonstramos aqui, naquela “ditadura” chamada Reino Unido, mesmo quando se trata de imprensa escrita os leitores têm o direito de recorrer imediatamente contra conteúdos que considerem ofensivos, ainda que seja uma notícia “distorcida” ou um programa de debates “desequilibrado”.
Já imaginaram o Marco Antonio Villa e a Sheherazade como âncoras de um mesmo programa no Reino Unido? Os eleitores do Labor extinguiriam o programa em dois tempos.
No Brasil, nem mesmo o direito de resposta é regulamentado.
Pois Eduardo Cunha, às custas das declarações acima, “ganhou” o aquário das grandes redações. Um capataz dos Civita chegou a elogiá-lo explicitamente:
Como? Você não gosta de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara? É um direito seu. Acha que ele recorre a esse ou àquele métodos que não são muito bacanas? Que sejam expostos, então. Agora, rejeitá-lo porque ele sabe fazer política, aí não dá! Há muito eu não via alguém no seu posto falar com tanta clareza e demonstrar altivez.
Reconheça-se que a Folha de S. Paulo foi o único jornal que chegou a publicar uma acusação contra o presidente da Câmara, mas ainda assim comportou-se atipicamente: deu ao Cunha o direito de se defender amplamente!
Mais recentemente, Cunha fez um movimento maroto para tentar restringir as investigações da CPI da Petrobras ao período Lula-Dilma, simplesmente descartando as declarações de um ex-diretor da estatal segundo as quais o pagamento de propina, no caso dele, começou em 1997.
Por que?
Agora que, segundo o site 247, um inquérito contra Eduardo Cunha será aberto por conta da Operação Lava Jato, fica mais claro.
Primeiro, o presidente da Câmara “comprou” a mídia. Em seguida, “comprou” o PSDB e a oposição.
Assim, pode manter a faca no pescoço da presidenta Dilma mesmo acusado de ser beneficiário da corrupção na Petrobras.
Se não for satisfeito em suas pretensões, basta a Eduardo Cunha acenar com a possibilidade de impeachment. Terá, ao seu lado, a mídia e o PSDB para a manobra costumeira no Brasil, desde 2002: colocar todo o lixo no colo única e exclusivamente do PT.
Será muito interessante observar a partir de agora as relações entre a mídia corporativa e seu “queridinho” de última hora.
PS do Viomundo: A Folha tomou um furo do 247 e tentou consertar. Ah, o provincianismo da Barão de Limeira!
Viomundo
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