5 de março de 2015
Condenado sem provas, extinção da pena de ex-deputado possui um aspecto absurdo: ele recuperou aquilo que nunca poderia ter perdido --a condição de homem livre
Dois anos e quatro meses depois do julgamento da AP 470, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade, extinguir a pena de José Genoíno, condenado a quatro anos e oito meses de prisão pelo crime de corrupção ativa.
A decisão é correta mas possui o seguinte componente absurdo: devolve-se a Genoino aquilo que ele nunca poderia ter perdido — a condição de homem livre. (Livre, sim, mas não inteiramente. Ele teve seus direitos políticos cassados e pode ser obrigado a travar uma batalha jurídica suplementar para poder votar e ser votado antes de 2023).
Para se acreditar que Genoíno pudesse ser condenado por corrupção, seria preciso imaginar que o então presidente do Partido dos Trabalhadores, cujo maior patrimônio é um sobrado no Butantã, em São Paulo, comprado a prestações na Caixa Econômica, tivesse passado os primeiros anos do primeiro mandato de Lula no trabalho de subornar deputados e senadores para que votassem do governo no Congresso.
É uma hipótese tão absurda que os mesmos ministros que o condenaram não deixaram de recordar, com palavras sentimentais, na mesma sessão, suas virtudes como cidadão e lider político, numa biografia que inclui os protestos contra a ditadura nos anos 1960, a guerrilha no Araguaia, em 1970, e todas as campanhas democráticas nos anos posteriores.
Genoíno foi julgado e condenado por ter assinados empréstimos para o PT junto ao Banco Rural. Nunca se provou que os empréstimos serviram para pagar propinas ou qualquer ilegalidade. Os empréstimos foram renegociados e pagos pelo partido.
Se não bastasse uma pena errada, elevada artificialmente, como demonstrou um estudo do ministro revisor, Ricardo Lewandovski, Genoíno ainda enfrentou um tratamento persecutório depois da prisão.
Como se a gravidade de sua doença cardíaca — que incluía uma prótese de PVC na região do torax para subsituir a artéria aorta — fossem puro fingimento, ele encarou uma guerra de laudos médicos que, atendendo a vontade do ministro Joaquim Barbosa, procuravam manter Genoíno na prisão de qualquer maneira. Não era uma questão médica, na verdade.
O que se pretendia era destruir a imagem pública de José Genoíno, parlamentar respeitado por aliados e adversários pelo comportamento correto e pela credibilidade.
O mesmo Ministério Público que acusou Genoíno costumava confiar em sua palavra e em suas análises, a tal ponto que ele era frequentemente chamado a organizar cursos e eventos para a instituição.
O Brasil de 2012, em que Genoíno recebeu a pena de quatro anos e 8 meses de prisão, era um país que tinha problemas imensos e graves — mas não eram tão grandes nem tão graves como aqueles que marcam o país de 2015, na Operação Lava Jato. O julgamento da AP 470 teve um inquérito secreto, de número 2474, com provas que poderiam ser úteis aos réus e até permitir que provassem sua inocência, mas que nunca puderam ser examinadas no momento adequado.
A Lava Jato busca, expressamente, apoio dos meios de comunicação para obter a deslegitimação da classe política, ação que só pode levar ao enfraquecimento da democracia.
A partir de prolongadas prisões provisórias, procura-se forçar delações premiadas, numa sucessão de denúncias que já ameaçam a economia e várias conquistas acumuladas ao longo dos anos.
Incapazes de aceitar uma quarta derrota eleitoral consecutiva, os mesmos adversários que estimularam as denúncias da AP 470 na esperança de quebrar o governo Lula, apostam abertamente no agravamento da crise.
José Genoíno recupera a liberdade num país onde há muito tempo ela não enfrentava tantos perigos.
Blog do Paulo Moreira Leite - Brasil 247
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