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Postado em 02 Jun 2016
por : Paulo Nogueira
As circunstâncias mudaram desde que o Senado a afastou
Quais as chances de Dilma voltar?
No momento do afastamento pelo Senado, elas pareciam zero. O triunfo do golpe e dos golpistas tinha ares de definitivo.
Era a percepção generalizada.
Mas aí entrou em cena uma coisa chamada realidade. Temer desde o primeiro dia se revelou uma desgraça. Prometeu um ministério de notáveis e entregou uma equipe de nulidades sobre as quais pesavam e pesam fortes suspeitas de corrupção em alta escala.
O símbolo maior disso foi Jucá, que se pode qualificar de chave de cadeia com seu bigode caricato e seu passado nebuloso.
A presença no novo governo de homens ligados a Eduardo Cunha — como seu advogado — contribuiu também para reforçar a imagem de uma conspiração de corruptos para afastar uma mulher honesta que levou o combate à roubalheira a níveis inéditos.
Ficou demonstrado que o real poder por trás da administração usurpadora era Cunha, e não o decorativo Temer.
As conversas gravadas por Sérgio Machado destruíram o que restava de credibilidade dos golpistas. E acrescentaram oficialmente um novo elemento no complô antidemocracia: a participação do STF.
O decano do golpe, FHC, depois que foi enxotado de uma palestra em Nova York sobre democracia na América Latina, evocou o STF para dar legitimidade ao impeachment.
Arremessado o STF na lama, nem isso sobrou. Passaram a ser entendidas aberrações como a demora de quatro meses do ministro Teori para acatar o pedido de afastamento de Eduardo Cunha.
Cunha teve todo o tempo do mundo para comandar o impeachment na Câmara como se fosse um homem probo, justo, puro.
Houve ainda, antes que Temer se instalasse no Planalto, um fato capital para que o golpe fosse desmascarado: a infame sessão da Câmara dos Deputados em que corruptos abraçados à bandeira nacional gritaram um sim estridente sob as mais ridículas alegações.
Aquela sessão se tornou mundialmente conhecida pelo horror cômico que foi e virtualmente enterrou o golpe antes que ele fosse consumado.
Novos governos, isto é básico, necessitam do que se chama de “choque positivo” para espalhar otimismo na sociedade. Um clássico “choque positivo” na história moderna foi dada, no Reino Unido, por Tony Blair. Virou referência internacional. Blair avisou que não retomaria práticas trabalhistas que haviam se tornado obsoletas e ruinosas.
Lula, em 2003, deu seu “choque positivo” ao dizer que respeitaria os contratos — coisa que aliás Temer não está fazendo — e não nacionalizaria o que fora privatizado. O mercado, que estava inquieto, se acalmou, e Lula pôde colocar em prática, sem maiores obstáculos, seus programas sociais inovadores.
Pois bem. Temer produziu um formidável “choque negativo”. Não poderia haver errado mais. Logo mostrou por que sempre foi um nanico na política nacional.
Não colocou sequer uma mulher em seu ministério. Quando finalmente preencheu a Secretaria da Mulher, foi com uma evangélica que condenava o aborto mesmo em casos de estupro.
No capítulo das mesquinharias, mandou demitir o garçom do Planalto e retirar o tratamento de “presidenta” de Dilma na EBC por meio do interventor que colocou lá, Laerte Rimoli, outro homem de Cunha. (O STF reconduziu nesta semana, provisioramente, Ricardo Melo ao comando da EBC, em mais uma entre tantas derrotas de Temer.)
Tudo isto posto, Temer é quase que um homem morto que anda. Parece estar colado na testa de sua administração: corrupta.
Tudo isto para dizer o seguinte. Poucos dias se passaram desde a sessão do Senado que tirou provisoriamente Dilma, mas a percepção sobre o impeachment se alterou completamente.
Desconte os senadores que votariam e votarão contra Dilma em quaisquer circunstâncias, de Caiado a Aécio.
Mas e os que votaram sim porque, naqueles dias, achavam que Temer iria abafar, sob a proteção da Globo e da mídia em geral? Eles certamente não contavam, além de tudo, com a reação popular ao golpe.
Penso, especificamente, em Cristovam Buarque. Reafirmar o voto pelo impeachment na sessão inicial do Senado foi uma coisa. Repetir o gesto agora é outra coisa. Você se expõe à execração geral, e corre o risco de passar para a história como um fâmulo da plutocracia, sem contar os berros de golpista a que você estará condenado onde quer que esteja.
Os senadores como Cristovam Buarque não são muitos. Mas são em número suficiente para que um impeachament que parecia inevitável seja revogado.
E não há nada que Temer possa fazer para melhorar a imagem de seu governo — porque é inepto, vacilante, sem carisma e, se não bastasse tudo isso, come na mão de Eduardo Cunha.
Aos que alegam que Dilma não teria mais como governar, a resposta é simples: tem muito mais que Temer, com a diferença que carrega mais de 54 milhões de votos.
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.
Diário do Centro do Mundo - DCM
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