QUI, 08/06/2017 - 08:19
ATUALIZADO EM 08/06/2017 - 08:22
Esqueletos no armário, por Fernando Horta
A verdade é que tem muita gente falando pelo Exército. O senador símbolo do governo Temer, Romero Jucá, foi gravado dizendo que “estava conversando com comandantes militares” e que eles “dizem que vão segurar”. E nada mais lhe foi perguntado, colocando uma enorme dúvida na cabeça de todo cidadão brasileiro sobre quem disse e sobre segurar o quê? A falta de interpelação do próprio senado às falas de Jucá mostra o quanto o Brasil ainda é um país cujas instituições de poder atuam nas sombras, longe do olhar claro do cidadão.
Ao assumir, Temer nomeia o simbólico general Sérgio Etchegoyen para o “estratégico” cargo da GSI (Gabinete de Segurança Institucional que comanda a ABIN) e os relatos em Brasília dão conta de uma perseguição sem igual, usando-se meios físicos e digitais, sobre funcionários de carreira que haviam servido no governo Dilma. Muitas pessoas tiveram suas vidas devassadas, foram removidas abruptamente de seus locais e foram até vigiadas por suas “supostas conexões”. O General já havia protagonizado momentos tristes de destempero ao atacar a Comissão da Verdade que declarou o pai do general (o também general Leo Etchegoyen) “responsável por violações de direitos humanos durante a ditadura”.
Em 2015, o General Mourão (outro nome que desperta desconforto), do comando militar do Sul, premia o torturador Ustra e pede o “despertar de uma luta patriótica”, defendendo a ditadura. Segundo o “brilhante” general o termo “período autoritário” usado para identificar o momento entre 64 e 85 estaria errado. Mourão foi imediatamente afastado pelo comandante do exército. Na prática diz-se que Mourão foi “promovido”, eis que foi para Brasília, mas a verdade é que o comandante do exército recomendou que declarações como esta “fossem evitadas por todos”.
Ainda tem o caso do capitão “Balta” infiltrado da inteligência do exército para armar flagrantes nas manifestações, propiciando quebras de direitos e até prisões. O capitão Balta parece ter pulado de algum livro sobre 1964 e caído em 2016. As conversas que ele mantinha na internet com “subversivos” são dignas de uma tese de mestrado sobre a “inteligência” do Exército Brasileiro. De qualquer forma, para aqueles que defendiam que o golpe de 2017 era diferente porque não tinha a participação do Exército, ficava cada vez mais estranha esta narrativa.
Nesta semana, na terça feira passada, o general Villas Boas reuniu-se com o que chamou de “reserva pró-ativa” composta por diversos generais (alguns linha-dura) como o controvertido General Heleno. A reunião já provocou burburinhos em Brasília especialmente porque canais de comunicação do exército afirmaram que o Exército se considera “fiador da legalidade” em respeito à Constituição e “às decisões do Supremo tribunal Federal”. O próprio general Villas Boas declarou que as conversas eram “sobre o nosso país”.
Algumas filigranas precisam ser pontuadas. Em primeiro lugar, o general Villas Boas tem se mostrado extremamente legalista e conduz a tropa a não se envolver na politicagem que dominou o país. Mesmo quando Temer lançou o decreto colocando Brasília, na prática, em Estado de Sítio, o general manteve a calma e delicadamente desautorizou Temer. O vice-presidente foi obrigado a recuar. Depois, o próprio general postou notícias da reunião em seu perfil pessoal no twitter, ajudando a desfazer a sempre presente ideia de “conspiração”. Também não pode passar desapercebido o fato de o general Etchegoyen, a voz mais estridente da direita de farda, não estar presente na reunião.
O fato é que um general comandante de Exército tem muito poder, mas não está distante de pressões. Villas Boas tem se mantido em posição singular na nossa história, enfrentando uma imensa crise política sem permitir que qualquer facção usasse as armas verde-oliva contra os cidadãos. Se, para isto, ele precisar fazer dezenas de reuniões com militares da ativa, da reserva ou da “pró-ativa”, devemos aplaudir de pé. Tudo o que o Brasil não precisa agora é de coturnos e tanques nas ruas, defendendo qualquer coisa.
Aliás, bem que os militares poderiam ter se reunido com Villas Boas para criticar a entrega da Base de Alcântara aos norte-americanos, feita por Temer. Poderiam reclamar da destruição dos projetos estratégicos como o submarino nuclear feita pela Lava a Jato. Ou ainda poderiam indignar-se com a entrega do pré-sal às empresas estrangeiras, retirando o “conteúdo nacional” das compras da Petrobrás e jogando a engenharia brasileira ao solo. Como se vê, assunto importante e vital para a defesa do Brasil não faltam aos militares realmente “patrióticos”. Se eles optarem, novamente, por atacar o “inimigo interno” ou ficarem gastando recursos e dinheiro vigiando “subversivos”, seria apenas uma demonstração de que não vivem em 2017, mas em algum eco esquizofrênico de 1964.
O Brasil precisa parar de ser concessão dos militares. Mas não podemos esquecer do viajante do tempo, do capitão Balta ...
Jornal GGN
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