Geir Haarde, primeiro ministro da Islândia em 2008, quando se deu a derrocada bancária no país, está sendo julgado por um tribunal especial. No banco dos réus, pela primeira vez, a política neoliberal que originou a bancarrota. Juízes e 60 testemunhas têm refletido durante o julgamento – que está sendo seguido por milhares de islandeses através da internet – sobre as causas de uma situação que não surgiu em 2008 por geração espontânea mas sim pela deriva neoliberal a que o governo sujeitou o país.
Esquerda.net
Durante o governo de coligação direitista e social democrata de Geir Haarde, os bancos faliram, a economia entrou em colapso. Mais do que julgar o homem que à frente do governo não conseguiu evitar a dramática situação no pequeno país, os juízes tentam apurar o que se passou e as circunstâncias que provocaram a crise. O tribunal considera que não é possível responsabilizar unicamente o ex-primeiro ministro pelo que se passou.
Da sua acusação constam o fato de não ter feito nada para evitar a debandada dos estabelecimentos financeiros, de não ter feito com que o banco online Icesave tivesse o estatuto de filial britânica, o que teria permitido transferir o problema da falência para Londres e evitado ao país a realização de dois referendos e a decisão dos islandeses de se recusarem a pagar por dívidas que não são suas. Este problema está atualmente no Tribunal Europeu de Justiça.
Juízes e cerca de 60 testemunhas têm refletido durante o julgamento – que não é transmitido ao vivo pela TV mas que está sendo seguido por milhares de islandeses através da internet – sobre as causas de uma situação que não surgiu em 2008 por geração espontânea mas sim pela deriva neoliberal a que o governo sujeitou o país.
Em causa estão, principalmente, a privatização das quotas de pesca que proporcionou aos armadores fortunas incalculáveis, um investimento em cascata no estrangeiro, quase sempre com maus resultados, uma privatização desastrosa dos bancos feita frequentemente segundo métodos corruptos e de clientelismo. A este processo seguiu-se uma onda de concessão de créditos bancários sem critérios nem garantias proporcionando, à escala do país, problemas semelhantes aos que se registaram nos Estados Unidos com a bolha imobiliária e o subprime.
Nesta fase, os bancos concederam um volume global de crédito que superou em 11 vezes o PIB islandês; quando o primeiro ministro decretou a sua falência era impossível salvá-los. Além disso, os islandeses não o permitiram e recusaram-se a assumir as dívidas alheias.
A resposta dos islandeses à crise não alinhou pelos caminhos impostos pela União Europeia aos Estados membros, pelo que hoje a Islândia, apesar de sofrer os efeitos de uma forte austeridade econômica e de uma acentuada quebra no consumo, conseguiu salvaguardar o Estado social, o desemprego está em sete por cento e as entidades patronais não foram além de limitar o trabalho extraordinário para conseguirem evitar os despedimentos.
Geir Haarde, político direitista e considerado um fundamentalista neoliberal, tem 64 anos e abandonou a carreira política. Incorre numa pena de dois anos de prisão. Mais do que um chefe de governo incapaz de dirigir o país – é a acusação a que corresponderá a pena que vier a ser aplicada – no banco dos réus está a política neoliberal.
(*) Artigo publicado no portal do Bloco de Esquerda no Parlamento Europeu
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