Janio de Freitas
A nova
fase do julgamento do chamado mensalão, dedicada ao “núcleo político”,
introduz o próprio Supremo Tribunal Federal em zona de perigo. Há muito
menos provas documentais e indícios factuais no novo capítulo do que nas
operações financeiras, já julgadas, entre o Banco Rural, as agências de
Marcos Valério e o PT.
Carência que está substituída, em quesitos importantes, por deduções problemáticas a serem enfrentadas pelos ministros.
Não
há dúvida quanto à entrega de dinheiro a dirigentes partidários e a
parlamentares, indicados pelo PT. Daí vem um salto grande e impróprio: a
acusação elaborada pelo procurador-geral, Roberto Gurgel, e a parte já
conhecida da acusação feita por Joaquim Barbosa, como ministro-relator,
deduzem que o dinheiro se destinou à compra de votos, na Câmara, a favor
do governo.
A finalidade de um pagamento é importante, no caso,
não mais para comprovar ou negar a ocorrência das transações ilegais,
mas por influir na dimensão da pena de um réu condenado.
Ou seja, por influir naquilo mesmo que se tem por justiça.
É
possível que houvesse compra de voto. Mas não pode ser desconsiderado
que o PT fez acordos eleitorais com o compromisso de financiar campanhas
dos novos aliados.
Disso ficaram registros nos meios de
comunicação e há confissões e testemunhos no processo. Nenhum acusado se
inocenta por isso. Mas se altera a dedução que o procurador-geral e o
relator tiram da cronologia de pagamentos e votações.
Joaquim
Barbosa expôs, ontem, a quase coincidência dessas datas, com R$ 100 mil,
R$ 200 mil ou R$ 250 mil entregues a alguns dos acusados e, adiante, a
obediência dos seus votos ao desejado pelo governo. Mas, a propósito, há
mais do que apenas a hipótese de compra dos votos para aquela votação.
O
PT saiu da campanha de Lula devendo muito do financiamento a que se
comprometeu com os partidos aliados. A combinada cessão de cargos
preservou, por certo tempo, a convivência no governismo.
Esgotado
esse festival, começaram as cobranças dos dirigentes em nome dos
partidos e, com a chegada das votações importantes para o governo, o
“paga ou não voto” de deputados que esperavam por sua parte do
financiamento descumprido. Alguns deles falando por diretórios
regionais, como demonstra o movimento apurado das verbas.
Essa
sucessão desde o acordo até a cobrança ficou descrita por envolvidos já
na CPI dos Correios. Inclusive em minucioso depoimento de Roberto
Jefferson. Nem por isso fica negada a possibilidade de compra de tal ou
qual deputado, para esta ou aquela votação.
Mas não há dúvida de
que a quitação de dívidas foi motivo comum na entrega de dinheiro a
parlamentares. E há diferença importante entre uma e outra causas.
O
relatório de Joaquim Barbosa argumenta que, em seguida ao recebimento
por um deputado, ele e sua bancada votaram com o governo, como atesta
levantamento da Câmara.
Poderia ser por recebimento de dinheiro.
Ou, simplesmente, porque votar com o governo é o esperado de uma
bancada da “base aliada”. Os deputados que receberam eram dos partidos
“da base” — PMDB, PTB, PP, PL, além do PT.
O problema do tribunal, no novo capítulo do julgamento, será o que deduzir das deduções.
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