Como explicar que o Brasil, ranqueado como o 57º país mais competitivo do mundo, é o 4º que mais atrai investimentos?
por Roberto Alvarez — publicado 04/02/2015 06:09
Ilustração: Ana Beatriz Pádua
Para orientar a agenda de qualquer país, é importante saber o que se entende por competitividade e o que está detrás dos índices
No ano passado foi divulgada mais uma edição do ranking de competitividade do Fórum Econômico Mundial. O Brasil aparece na 57ª posição. Esse e outros rankings são importantes, catalisam as atenções e podem nos dotar de senso de urgência para avançarmos como sociedade, em áreas que definem nossa competitividade. Contudo, é oportuno refletir sobre o significado de figurar nessa posição. Como explicar que o quinquagésimo sétimo país mais competitivo do mundo é o 4º que mais atrai investimentos segundo a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, a Unctad e, dentre 65 países, o 21º que mais cresceu em participação no comércio mundial desde 2001?
Põe-se, portanto, a pergunta: do que exatamente estamos tratando quando falamos de “competitividade”? Para uma empresa, é fácil defini-la. Para um País, nem tanto. Para orientar qualquer agenda, é importante saber o que se entende por competitividade e o que está por detrás dos índices.
Uma análise dos dois índices de competitividade mais conhecidos, o do Fórum Econômico Mundial e o do Insead (até 1994 ambos eram uma coisa só), realizada pelo pesquisador Bruno César Araújo, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, revela alguns de seus limites. Destaco três deles: 1) Não há correlação entre as posições ocupadas pelos países nos rankings e o crescimento econômico que apresentam. Aqueles apontados como mais competitivos NÃO crescem mais que os menos competitivos; 2) Os índices são compostos por vários indicadores (PIB, número de patentes tecnológicas, desempenho no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, entre outros, ponderados com pesos arbitrários. Não existe explicação ou base conceitual para esses pesos e é difícil comunicar o real significado do valor final; 3) Muitos dos indicadores utilizados têm origem em pesquisas de opiniões, não em dados estatísticos comparáveis internacionalmente. Os números de respondentes entre países não são homogêneos e os resultados estão sujeitos a interpretações, preferências de quem responde e subjetividades variadas.
O reconhecimento desses limites não desmerece a importância dos índices. Ao contrário, reforça, a necessidade de ir além. Frente a isso, a Federação Global dos Conselhos de Competitividade (GFCC, na sigla em inglês), que congrega 35 membros, de 30 países e tem como fundadoras duas organizações brasileiras -–- a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial e o Movimento Brasil Competitivo --- construiu um painel de métricas de competitividade. A ideia não é fornecer ‘a resposta’ ou ‘o índice’, mas permitir a análise da competitividade de forma abrangente e sistemática, a partir de dados referenciados por organizações internacionais e de diferentes dimensões. Desenvolvimento e crescimento econômico são fenômenos complexos e é uma ilusão pensar que possa existir uma ‘única resposta’.
Essa nova abordagem está materializada no GFCC Competitivenes DecoderTM. Cobrindo 140 indicadores e 103 países, ao longo de 35 anos, trata-se de uma ferramenta online. O DecoderTM inclui funcionalidades de visualização de dados e análise estatística e utiliza dados de instituições internacionais para agrupar e comparar países. Grupos e índices não são criados com pesos arbitrários, mas definidos estatisticamente a partir da distribuição dos dados.
A GFCC define competitividade nacional como o crescimento de longo prazo dos padrões de vida através de melhorias na produtividade. No limite, competitividade se confunde com a capacidade de uma sociedade obter ganhos de produtividade e prover bem estar ao seu povo. Esses dois aspectos devem andar juntos. Uma das novidades do DecoderTM é a inclusão de indicadores de qualidade de vida.
Há necessidade de um esforço continuado e sistemático de comparação do Brasil com outros países sob múltiplas dimensões, indicadores e práticas. Além de índices, dados e análises, precisamos também de diálogo e ‘inteligência coletiva’ para construir uma agenda de competitividade.
No ano passado a ABDI, o MBC, o Observatório da Inovação e Competitividade da Universidade de São Paulo e o IPEA realizaram uma série de diálogos com executivos, pesquisadores, gestores governamentais e empreendedores brasileiros, tomando como ponto de partida os dados do DecoderTM e as análises por ele possibilitadas. As conclusões dos Diálogos foram lançados pela ABDI e o MBC em dezembro, em São Paulo, e estão disponíveis neste link.
Em síntese, destacaram-se cinco alavancas para o incremento da competitividade do Brasil: recursos humanos, capital, instituições (as regras do jogo), capacidades técnicas e governança do setor público e capacitações das empresas. Ações nessas frentes poderão tanto reduzir os custos nas empresas e na economia como um todo como aumentar a capacidade de gerar valor de nossa economia.
Por vezes, o poder de síntese de índices que combinam vários indicadores mascara as questões reais a serem abordadas pela sociedade. É preciso ir além. É tempo de decodificarmos o DNA da competitividade.
* Roberto Alvarez é gerente na Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial. É doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ e futurista pela Singularity University (Nasa Ames, EUA). Foi professor, consultor e empreendedor de TI.
No ano passado foi divulgada mais uma edição do ranking de competitividade do Fórum Econômico Mundial. O Brasil aparece na 57ª posição. Esse e outros rankings são importantes, catalisam as atenções e podem nos dotar de senso de urgência para avançarmos como sociedade, em áreas que definem nossa competitividade. Contudo, é oportuno refletir sobre o significado de figurar nessa posição. Como explicar que o quinquagésimo sétimo país mais competitivo do mundo é o 4º que mais atrai investimentos segundo a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, a Unctad e, dentre 65 países, o 21º que mais cresceu em participação no comércio mundial desde 2001?
Põe-se, portanto, a pergunta: do que exatamente estamos tratando quando falamos de “competitividade”? Para uma empresa, é fácil defini-la. Para um País, nem tanto. Para orientar qualquer agenda, é importante saber o que se entende por competitividade e o que está por detrás dos índices.
Uma análise dos dois índices de competitividade mais conhecidos, o do Fórum Econômico Mundial e o do Insead (até 1994 ambos eram uma coisa só), realizada pelo pesquisador Bruno César Araújo, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, revela alguns de seus limites. Destaco três deles: 1) Não há correlação entre as posições ocupadas pelos países nos rankings e o crescimento econômico que apresentam. Aqueles apontados como mais competitivos NÃO crescem mais que os menos competitivos; 2) Os índices são compostos por vários indicadores (PIB, número de patentes tecnológicas, desempenho no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, entre outros, ponderados com pesos arbitrários. Não existe explicação ou base conceitual para esses pesos e é difícil comunicar o real significado do valor final; 3) Muitos dos indicadores utilizados têm origem em pesquisas de opiniões, não em dados estatísticos comparáveis internacionalmente. Os números de respondentes entre países não são homogêneos e os resultados estão sujeitos a interpretações, preferências de quem responde e subjetividades variadas.
O reconhecimento desses limites não desmerece a importância dos índices. Ao contrário, reforça, a necessidade de ir além. Frente a isso, a Federação Global dos Conselhos de Competitividade (GFCC, na sigla em inglês), que congrega 35 membros, de 30 países e tem como fundadoras duas organizações brasileiras -–- a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial e o Movimento Brasil Competitivo --- construiu um painel de métricas de competitividade. A ideia não é fornecer ‘a resposta’ ou ‘o índice’, mas permitir a análise da competitividade de forma abrangente e sistemática, a partir de dados referenciados por organizações internacionais e de diferentes dimensões. Desenvolvimento e crescimento econômico são fenômenos complexos e é uma ilusão pensar que possa existir uma ‘única resposta’.
Essa nova abordagem está materializada no GFCC Competitivenes DecoderTM. Cobrindo 140 indicadores e 103 países, ao longo de 35 anos, trata-se de uma ferramenta online. O DecoderTM inclui funcionalidades de visualização de dados e análise estatística e utiliza dados de instituições internacionais para agrupar e comparar países. Grupos e índices não são criados com pesos arbitrários, mas definidos estatisticamente a partir da distribuição dos dados.
A GFCC define competitividade nacional como o crescimento de longo prazo dos padrões de vida através de melhorias na produtividade. No limite, competitividade se confunde com a capacidade de uma sociedade obter ganhos de produtividade e prover bem estar ao seu povo. Esses dois aspectos devem andar juntos. Uma das novidades do DecoderTM é a inclusão de indicadores de qualidade de vida.
Há necessidade de um esforço continuado e sistemático de comparação do Brasil com outros países sob múltiplas dimensões, indicadores e práticas. Além de índices, dados e análises, precisamos também de diálogo e ‘inteligência coletiva’ para construir uma agenda de competitividade.
No ano passado a ABDI, o MBC, o Observatório da Inovação e Competitividade da Universidade de São Paulo e o IPEA realizaram uma série de diálogos com executivos, pesquisadores, gestores governamentais e empreendedores brasileiros, tomando como ponto de partida os dados do DecoderTM e as análises por ele possibilitadas. As conclusões dos Diálogos foram lançados pela ABDI e o MBC em dezembro, em São Paulo, e estão disponíveis neste link.
Em síntese, destacaram-se cinco alavancas para o incremento da competitividade do Brasil: recursos humanos, capital, instituições (as regras do jogo), capacidades técnicas e governança do setor público e capacitações das empresas. Ações nessas frentes poderão tanto reduzir os custos nas empresas e na economia como um todo como aumentar a capacidade de gerar valor de nossa economia.
Por vezes, o poder de síntese de índices que combinam vários indicadores mascara as questões reais a serem abordadas pela sociedade. É preciso ir além. É tempo de decodificarmos o DNA da competitividade.
* Roberto Alvarez é gerente na Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial. É doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ e futurista pela Singularity University (Nasa Ames, EUA). Foi professor, consultor e empreendedor de TI.
Carta Capital
Nenhum comentário:
Postar um comentário