Por esquiber Atualizado às 14h45
Nassif,
Durante toda essa semana a pública divulgará em seu site alguns dos telegramas sigilosos da embaixada americana que estão em posse do Wikileaks.
Um desses telegramas já divulgado chama atenção pelo inusitado da informação. Diz respeito a José Serra e suas movimentações em direção ao embaixador americano em busca de ajuda para resolver os problemas de segurança de São Paulo.
Logo que tomou posse do governo de São Paulo Serra teve uma reunião com o embaixador americano para buscar orientação sobre como lidar com os ataques terroristas ao sistema metroviário e de trens metropolitanos do Estado, atribuidos ao PCC.
Uma parceria formada a revelia do governo federal. O telegrama deixa claro que funcionários do metrô selecionados pelo governo Serra receberam treinamento dos E.U.A sem conhecimento do Itamaraty.
A insistência de Serra em aprofundar essa parceria e estendê-la para outros setores levou o subsecretário Burns e o embaixador Sobel ressaltarem que seria importante obter aprovação do governo federal e destacaram que o Ministério de Relações Exteriores, o Itamaraty, “é às vezes sensível quanto a esses assuntos”. O embaixador americano advertiu que “o governo estadual talvez precise de ajuda para convencer o governo federal sobre o valor de ter os Estados Unidos trabalhando diretamente com o Estado”.
Serra disse que ele gostaria de falar com a mídia sobre a necessidade dessa ajuda.
A íntegra do telegrama conforme divulgada pela pública, poder ser lida aseguir:
Da Agência Pública
Serra, governador, pediu ajuda aos EUA contra ataques de PCC
Nova leva de documentos do Wikileaks revelam que Serra queria treinamento para lidar com bombas e ameaças no transporte público, que seriam de autoria da facção
Por Daniel Santini, especial para a Pública
Assim que assumiu o poder como governador de São Paulo, em janeiro de 2007, José Serra (PSDB) foi procurar o embaixador dos Estados Unidos no Brasil Clifford M. Sobel para pedir orientações sobre como lidar com ataques terroristas nas redes de metrô e trens, atribuídos por membros do governo paulista ao PCC.
O encontro foi o primeiro de uma série em que, como governador, Serra buscou parcerias na área de segurança pública, negociando diretamente com o Consulado Geral dos Estados Unidos, em São Paulo, sem comunicar ao governo federal. É o que revelam relatórios enviados à época pela representação diplomática a Washington e divulgados agora pela agência de jornalismo investigativo Pública, em parceria com o grupo Wikileaks.
Os documentos, classificados como “sensíveis” pelo consulado, são parte de um conjunto de 2.500 relatórios ainda inéditos sobre temas variados, que foram analisados em junho por uma equipe de 15 jornalistas independentes e serão apresentados em reportagens ao longo desta semana. Os telegramas que falam dos encontros de Serra com representantes dos Estados Unidos também revelam a preocupação do então governador com o poder do Primeiro Comando da Capital (PCC) nas prisões.
Após tomar posse como governador, a primeira reunião de Serra com representantes dos Estados Unidos, realizada em 10 de janeiro de 2007, é descrita em detalhes em um relatório no dia 17.
Na conversa, que durou mais de uma hora, Serra apontou a segurança pública como prioridade de seu governo, em especial na malha de transporte público, disse o Estado “precisava mais de tecnologia do que de dinheiro” para combater o crime e indagou sobre a possibilidade de o DHS (Departament of Homeland Security) treinar o pessoal da rede de metrô e trens metropolitanos para enfrentar ataques e ameaças de bombas.
Semanas antes, três bombas haviam explodido, afetando o sistema de trens, conforme noticiado à época.
Em 23 de dezembro de 2006, um artefato explodiu próximo da estação Ana Rosa do Metrô. No dia 25, outra bomba explodiu dentro de um trem da CPTM na estação Itapevi, matando uma pessoa, e uma segunda bomba foi encontrada e levada para um quartel. Em 2 de janeiro de 2007, um sargento da Polícia Militar morreu tentando desarmar o dispositivo.
Segundo o documento diplomático, “membros do governo acreditam que o Primeiro Comando da Capital (PCC) pode ser o responsável pelos episódios recentes”.
O secretário de Transportes Metropolitanos, José Luiz Portella, chegou a entregar uma lista com questões sobre procedimentos adotados nos Estados Unidos e manifestou interesse em conhecer a rotina de segurança do transporte público de Nova York e Washington.
Também participaram desse primeiro encontro o chefe da Casa Civil Aloysio Nunes Ferreira, o secretário de Segurança Pública, Ronaldo Marzagão, o secretário de Transportes, Mauro Arce, o coordenador de segurança do Sistema de Transportes Metropolitanos, coronel Marco Antonio Moisés, o diretor de operações do Metrô Conrado Garcia, os assessores Helena Gasparian e José Roberto de Andrade.
Parceria estabelecida
As conversas sobre as possíveis parcerias entre o governo de São Paulo e os Estados Unidos na segurança da rede de metrô e trens metropolitanos continuaram na semana seguinte, quando Portella se reuniu com o cônsul-geral em São Paulo, o adido do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos (Departament of Homeland Security – DHS) no Brasil e o responsável por assuntos políticos do consulado.
O encontro aconteceu em 17 de janeiro de 2007 e foi relatado em relatório no dia 24.
Acompanhado do secretário adjunto de segurança pública, Lauro Malheiros, e de outras autoridades da área, Portella falou sobre as dificuldades encontradas pelo Metrô em garantir a segurança da rede e informou sobre a tragédia ocorida nas obras da estação Pinheiros, dias antes (12 de janeiro de 2007), quando um desabamento provocou a morte de sete pessoas. No relatório, os representantes dos Estados Unidos destacam que a linha amarela é a primeira Parceria Público-Privada do Brasil e que o projeto foi lançado em meio à “grande fanfarra”.
Portella falou sobre os episódios anteriores de bombas e ameaças no metrô e “respondeu a uma série de questões preparadas pelo adido do DHS sobre a estrutura da rede” e disse que depois que as inspeções foram reforçadas, por causa das ameaças de bomba, mais pacotes suspeitos foram encontrados, e que mesmo “um saco de bananas ou de roupa suja” têm de ser examinados, o que provocava atrasos e paralisações no metrô. Novamente o PCC é mencionado: “Autoridades acreditam que a organização de crime organizado Primeiro Comando da Capital (PCC) pode ser responsável pelos ataques e relatam a prisão de um membro do PCC responsável pelo assassinato de um juiz em 2002”.
No final, Portella designou, então, o coronel da Polícia Militar José Roberto Martins e o diretor de Segurança do Metrô Conrado Grava de Souza para dar continuidade à parceria proposta.
Itamaraty
Nos meses seguintes, Serra voltou a se encontrar com representantes dos Estados Unidos e insistir em parcerias para lidar com o PCC.
Em 6 e 7 de fevereiro, conversou com o subsecretário de Estado dos EUA para Negócios Políticos, Nicholas Burns. De acordo com relatório de 1º de março de 2007, falou no encontro sobre a “enorme influência” que a organização tem no sistema prisional no Estado e pediu ajuda, incluindo tecnologia para “grampear telefones”.
Sua assessora para assuntos internacionais Helena Gasparian agradeceu a assistência na questão da segurança nos transportes públicose afirmou que a participação dos Estados Unidos foi “imensamente útil”.
Diante da sugestão de novas parcerias, o subsecretário Burns e o embaixador Sobel ressaltaram que seria importante obter aprovação do governo federal e destacaram que o Ministério de Relações Exteriores, o Itamaraty, “é às vezes sensível quanto a esses assuntos”.
O relatório afirma que “o governo estadual talvez precise de ajuda para convencer o governo federal sobre o valor de ter os Estados Unidos trabalhando diretamente com o Estado”. Serra disse que ele gostaria de falar com a mídia sobre a necessidade dessa ajuda.
Questionado pela agência Pública sobre esses relatórios, o professor Reginaldo Nasser, especialista no estudo de relações internacionais, de segurança internacional e de terrorismo da PUC de São Paulo, criticou a postura dos governador Serra e disse que acordos deste tipo devem ser intermediados pelo Itamaraty.
“Os Estados Unidos têm pressionado o Brasil para colocar terrorismo no Código Penal e o país até agora resistiu. Este tipo de acordo é uma relação de Estado para Estado e precisaria passar pelo governo federal”, explicou, destacando que, desde os ataques de 11 de Setembro, os Estados Unidos assumiram uma postura de polícia internacional. “Agentes agem com ou sem autorização em outros países, prendem, torturam e assassinam”, diz.
A assessoria de imprensa do Itamaraty disse que ninguém se posicionaria sobre as revelações dos documentos. Procurado por meio de sua assessoria, o ex-governador José Serra não retornou o contato da reportagem.
http://apublica.org/2011/06/serra-governador-pediu-ajuda-aos-eua-contra-ataques-de-pcc/
Por H. C. Paes
E talvez, só talvez, ele devesse ter procurado o MRE para pedir autorização para firmar convênio de assistência técnica e treinamento com autarquia pública de estado soberano estrangeiro.
E talvez, só talvez, alguém devesse ter lembrado ao Serra que a legislação brasileira não tipifica o terrorismo e, portanto, não há que se falar em treinamento para combater um tipo de crime que não existe formalmente no Brasil.
E talvez, só talvez, o Serra devesse ter ligado para o Walter Maierovitch para que este explicasse para ele a diferença entre ação armada do crime organizado voltada contra forças de segurança do estado como represália (o que o PCC fez, atacando delegacias) e uso de violência indiscriminada contra uma população civil com o objetivo de provocar a queda do governo, a expulsão de uma força invasora ou transmitir uma mensagem política (a definição de terrorismo).
O Brasil não tem terrorismo. Não oprimimos minorias, não temos movimentos separatistas, não metemos o nariz onde não somos chamados, não temos sequer os terroristas domésticos à moda de Timothy McVeigh. Não podemos ceder à paranóia dos estadunidenses. Eles que resolvam os problemas que criaram ao invés de tentar impingir a mesma mentalidade de choque aos outros.
Wittgenstein, Russell e um monte de outros pensadores - segundo me contam fontes secundárias, pois não li os originais - chamaram nossa atenção para a importância de atribuir um significado claro à linguagem, de forma a manter o pensamento claro. Chamar de terrorismo o que o PCC fez é o mesmo que chamar o assassino do Realengo de terrorista.
E não adianta vir com a história de que o PCC causou terror à população civil. Usar associações excessivamente amplas para justificar o que deveria ser uma unidade conceitual estreita é apenas uma maneira de confundir e semear insegurança. Afinal, até o boi da cara preta é capaz de causar terror... a uma criança de cinco anos. Para se falar em terrorismo - e mais ainda, para tipificá-lo legalmente - é preciso falar em motivações, causas,modus operandi, padrões de recorrência, e um monte de outras coisas que não interessam aos propaladores da mentalidade de choque.
Porque convém a eles convencer as pessoas a declarar guerra a uma palavra antes de saber o que ela significa. Haja vista que, nesse caso, a guerra é por definição infinita.
Blog do Luis Nassif