POR FERNANDO BRITO · 14/11/2015
Em artigo publicado ontem, o sempre lúcido Paulo Nogueira Batista Jr explica, de forma bastante didática o que se critica na política do Ministro da Fazenda Joaquim Levy, claro que com a elegância e a responsabilidade de não nominar o colega de Governo. Aliás, não apenas, porque – pelo que conheço de seu pensamento, que acompanho de forma sistemática – sei que não personaliza o que não é pessoal, está no campo das ideias.
Não existe nenhum problema em gastar menos, se o corte é feito com lucidez, embora isso imponha sacrifícios. Mas também é positivo, porque toda organização – sejam as públicas, sejam as privadas – em tempos de vacas gordas, como já tivemos, deformam perdulariamente seus orçamentos.
O problema é quando estes cortes acabam por frear a própria economia, tanto na sua atividade quanto na previsibilidade, na confiança.
E problema maior ainda é quando a política monetária, míope, apela para o aumento dos juros a tal ponto que a já arriscada atividade ou investimento produtivo tornam-se ilógicos economicamente, por terem taxas de retorno muito menores no médio e longo prazo, que a quela que, de imediato, pode lhes oferecer o rentismo improdutivo.
Paulo Nogueira Batista, Jr.
A disciplina na condução das contas públicas é sempre fundamental. Dirá alguém: é uma homenagem ao Conselheiro Acácio (não sei se o leitor sabe quem é), aquele personagem do Eça de Queirós que proclamava o óbvio ululante com categoria impressionante (rimou — desculpe). Sem dúvida, é o óbvio. Só que o óbvio também precisa dos seus defensores, dos seus entusiastas, dos seus aduladores. Diria mesmo: ninguém sofre mais do que o óbvio. São comuns agressões violentas contra as evidências mais estarrecedoras (sem querer, estou parafraseando Nelson Rodrigues. Paciência).
Volto à economia. A disciplina é crucial, sim, mas o ajuste fiscal é sempre mais difícil em uma economia debilitada como a brasileira. O próprio ajuste pode enfraquecer ainda mais a economia, ao retirar demanda efetiva, seja por corte de gastos públicos, seja por redução da renda disponível do setor privado via aumento de tributos. Dependendo dos multiplicadores associados ao corte de gastos e ao aumento de impostos, o ajuste fiscal pode inclusive se autoderrotar — algo que talvez esteja acontecendo ou possa vir a acontecer no Brasil. O mecanismo é conhecido: o ajuste fiscal derruba a atividade econômica, corroendo ipso facto a base sobre a qual incidem os impostos.
Agora, realmente problemático é combinar uma política fiscal pró-cíclica com uma política monetária também pró-cíclica. O aumento dos juros e a contração do crédito aprofundam a recessão, prejudicando a arrecadação e aumentando certos tipos de gasto (seguro-desemprego, por exemplo). E os juros mais altos oneram diretamente as contas públicas, porque aumentam o custo da dívida governamental. Em outras palavras, a política monetária pode solapar o ajuste fiscal.
Qual a saída? O ajuste fiscal é inevitável, dada a deterioração das contas públicas no Brasil nos anos recentes. É, essencial, porém combinar o ajuste com uma agenda de crescimento e de expansão do crédito, algo que o governo parece estar buscando.
Que fonte de crescimento econômico temos hoje? Pouca ou nenhuma. A situação internacional atrapalha — e bastante. O que ajuda é a depreciação do real, que favorece a expansão das exportações e os setores que disputam o mercado interno com importações de bens e serviços. Mas o setor externo é pequeno, como geralmente se verifica em países continentais tipo Brasil, e não consegue puxar sozinho o conjunto da economia.
O essencial é a estabilização política, com Executivo e Congresso trabalhando juntos para reordenar as contas públicas. Não quero resvalar para a utopia, mas essa estabilização política permitiria conduzir o ajuste fiscal e daria espaço para o Banco Central iniciar a diminuição dos juros e permitir alguma expansão do crédito. A mudança na composição da política macroeconômica, coadjuvada pela depreciação cambial, favoreceria a retomada do investimento e do consumo, abrindo espaço para a volta do crescimento econômico.
Não sei, leitor, se fui além do Conselheiro.
Tijolaço
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