segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Médica faz política contra Dilma à beira do leito de paciente infartado, alcoólatra e pobre, internado em UPA



publicado em 21 de setembro de 2015 às 18:39



por Conceição Lemes

Segunda-feira, 14 de setembro, Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) Vila Magini, em Mauá, no ABC paulista.

José Gomes de Freitas, 76, está internado nesse serviço há cinco dias devido a um infarto. Inicialmente, ficou na UTI. Assim que o quadro se estabilizou, foi para enfermaria, que divide com outros cinco idosos. Há quatro dias ele espera um leito no Hospital de Clínicas Dr. Radamés Nardini, onde se submeterá a cateterismo. O Nardini, como é conhecido, é um hospital municipal. Recebe recursos da Prefeitura de Mauá e do Ministério da Saúde.

À tarde, a médica Lara Passos Ramalho Arruda, CRM-SP 153.849, passa visita. Primeiro, olha o prontuário de seu José no espaço das enfermeiras. Depois, se aproxima dele e devolve o prontuário para a mesinha de refeição aos pés da cama, à disposição dos médicos plantonistas e das enfermeiras.

— Senhor José, está tudo bem? Está esperando uma vaga, não é?

— Sim – respondem seu José e a filha Lucineia Amélia de Freitas, que o acompanha na hora.

— O senhor sabe por que, não é? Porque a Dilma cortou os leitos nos hospitais.

— Doutora, a senhora está aqui para medicar, cuidar do meu pai, não está aqui para fazer política — interrompe-a, de pronto, a filha. — E eu sou Dilma.

— É sim, é sim – concorda seu José com a médica, que logo sai para ver outros pacientes.

“Leito de hospital não é lugar para fazer política rasteira”, denuncia ao Viomundo Lucineia.

“Foi como se a médica de forma subliminar acusasse o meu pai, pelo seu voto de pobre, de estar causando a si mesmo aquele mal, já que inicialmente ela desconhecia que ele não gosta da presidenta.”

“Na hora, com receio de que pudesse complicar a transferência dele para o Hospital Nardini, eu não disse mais nada”, prossegue. “Em outras condições, eu teria dito que ela se esquece que o meu pai chegou rápido à UPA, levado por uma ambulância do SAMU, programa exitoso do governo federal. Que ela se esquece também que a UPA, outro programa federal, impediu que o meu pai fosse depositado em uma maca suja, no corredor de um pronto-socorro qualquer, como acontecia antigamente…”

Todo mundo tem o direito de externar suas opiniões, ser de direita ou de esquerda, preferir o PSDB ao PT e vice-versa. Ainda bem. Vivemos numa democracia.

Muda de figura quando o profissional atende um paciente num leito. Hospital não é lugar para proselitismo político, tampouco fazê-lo é o papel do médico.

Lara, porém, não é exceção.

Especialmente desde o início do Programa Mais Médicos, o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Médica Brasileira (AMB) estão em guerra contra o governo federal. Corporativismo e, principalmente, questões ideológicas são as motrizes da campanha feroz desenvolvida pelas duas principais entidades médicas brasileiras, que, na prática, acabam insuflando os médicos contra o governo Dilma, a ponto de contaminar a relação médico-paciente.

Eu conversei com a doutora Lara sobre a denúncia recebida pelo Viomundo:

— Sinceramente, como ele expressou a opinião dele, eu também expressei a minha. Qual o problema?

– Fazer proselitismo político à beira do leito de um paciente, em situação delicada.

–Não, o paciente estava estável. Inclusive eu mesma solicitei a vaga de transferência porque estava há mais ou menos cinco dias numa enfermaria justamente por não ter vaga no Nardini. Eu simplesmente emiti a minha opinião, ela emitiu a dela e ele a dele. Inclusive ele também não é a favor do governo da Dilma como a maioria da população. Simplesmente foi isso. Não durou sequer um minuto. O paciente foi muito bem examinado por mim, não teve nenhum mal-estar com a filha.

– Não foi o que a filha disse.

— Eu realmente estou impressionada. Qual o problema de eu expressar a minha opinião e ela expressar a dela?

– Colocar política no meio de uma consulta de um paciente fragilizado, na cama, não é correto, não é ético, concorda?

— Mas não foi uma consulta, minha senhora. Passei a visita nesse paciente, examinei ele, fiz a prescrição dele, solicitei novamente a vaga — que ainda não havia por falta de leitos no Hospital Nardini, que está cheio, abarrotado de pacientes. Eu não posso me calar.

– Na sua página no Facebook, tem uma montagem com o rosto da presidenta, dizendo que 13 mil leitos do SUS foram fechados desde 2010…

— A senhora é partidária do PT? A senhora foi olhar o meu Facebook? Está querendo me calar como na ditadura?

– Não quero calar a senhora nem ninguém. Nós recebemos a denúncia da filha do seu José, e eu estou ligando para saber o que tem a dizer.

— Mas isso não é uma denúncia!

– Para a família é.

— Esse senhor que eu conversei está terminantemente contra esse governo, ele está insatisfeito, porque ele está sentindo na pele isso. A senhora usa o SUS?

–Uso o SUS, uso, sim.

— Olha, você me desculpe, mas não me interessa a opinião deles. Ele emitiu a opinião dele, desacreditado com o governo e eu emiti a minha. Ele inclusive concordou comigo. A filha se calou. Ele está sendo bem tratado e ela leva isso para você. Isso é uma coisa tão fútil. E você se presta a isso?!

– Doutora, estou fazendo o meu trabalho, ouvindo a senhora sobre o que aconteceu.

— A senhora foi olhar o meu Facebook?! A senhora está querendo me calar, como na ditadura? Nós médicos, estamos sendo muito recriminados, vocês não sabem o que passamos.

– Doutora, o Facebook é público. Eu visitei a sua página para tentar conhecê-la um pouco. Repito. Eu não quero calar a senhora nem ninguém. O problema é a sua conduta inadequada diante de um paciente. A senhora tem 39 anos, não viveu a ditadura. Mas eu vivi, perdi amigos. Por isso, dou muito valor à liberdade, inclusive de expressão, que nós temos hoje no Brasil.

Curiosamente a linha caiu.

Em seguida, a doutora ligou, talvez para se certificar do meu número. Ao ouvir a minha voz, desligou. Mandei então um torpedo, dizendo que a linha havia caído e eu estava à sua disposição se ela quisesse acrescentar algo. Não houve retorno.

Voltei a falar com a filha do seu José. Ela rebate várias afirmações da doutora Lara: “Ela não examinou meu pai. Quando eu respondi ‘Eu sou Dilma’, meu pai concordou com ela [é, sim] e nada mais disse. Não disse que era terminantemente contra o governo Dilma, nem que estava sentindo na pele isso. É bom que se ressalte que meu pai estava impedido de se levantar da cama, naquele momento”.

“Se ela fez isso com o meu pai, faz o mesmo com outros pacientes. Só que eu sei me defender, outros talvez não saibam”, justifica Lucineia. “Por isso, faço questão denunciar, para evitar que se repita.”

O médico não pode misturar as coisas, sob pena de comprometer a relação médico-paciente.

Chega a ser covardia se aproveitar de um paciente infartado, alcoólatra, pobre, portanto vulnerável, para fazer política.

O mais chocante é que ver que a doutora Lara acha isso natural. Não se ainda onde cursou Medicina. Mas ela deve faltado às aulas de ética médica.

Será que, se estivesse atendendo um paciente rico que votou na Dilma, a doutora falaria um ah contra a presidenta?

Consultei o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), sobre a denúncia.

O doutor Bráulio Luna Filho, via assessoria de imprensa da entidade, respondeu: “O Cremesp pode, a partir da matéria ou de uma denúncia formal do paciente ou familiar, abrir sindicância para verificar eticamente a conduta profissional da médica neste atendimento”.


Viomundo

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