Nos anos 80, Maílson da Nóbrega fracassou espetacularmente como ministro. Mas isso não o deteve
Logo no começo de minha carreira de jornalista a questão da boa escolha das fontes se apresentou.
A primeira aula que tive sobre isso foi na Veja, no começo dos anos
1980. Eu tinha 20 e poucos anos, trabalhava na seção de economia, e Elio
Gaspari, o “General”, como era conhecido na redação, era o
diretor-adjunto.
Elio muitas vezes se encostava nas divisórias baixas que separavam as
editorias e falava sobre jornalismo. Para quem começava na carreira,
como eu, era uma oportunidade excepcional de aprendizado.
Uma noite ele falou sobre fontes.
“As fontes são aquelas pessoas que atendem todos os telefonemas dos
jornalistas”, ele disse. “Não são as melhores, são as mais fáceis, e
isso faz diferença para repórteres preguiçosos.”
Um caso específico Elio citou: o então presidente da Fiesp, Luís
Eulávio Vidigal. Ele era onipresente nas reportagens de economia e
negócios na mídia brasileira, porque não recusava uma única entrevista.
Mais tarde, quando virei eu mesmo editor, fonte foi um tema sobre o qual me detive longamente nas conversas com os repórteres.
Em meados dos anos 1990, na casa dos 30, eu era diretor de redação da
Exame. Jamais esquecera as palavras de Elio, mas acrescentei uma
reflexão pessoal: prestar completa atenção na obra, no mérito da fonte.
Foi sob essa lógica que refizemos o time das fontes da revista.
Uma das primeiras eliminações, se não a primeira, foi o ex-ministro
Maílson da Nóbrega, obra de Sarney. Por uma razão potente: ele deixara o
cargo com uma inflação de 80% ao mês. Depois de um desempenho tão
catastrófico, que sentido havia em ouvi-lo mandar fazer as coisas que
ele próprio não conseguira fazer?
Maílson pretendia atacar os problemas econômicos com o que ele chamou
de “arroz com feijão”. Foi uma das raras vezes em que os brasileiros
sofreram violentamente com o arroz com feijão.
A Exame, e não apenas nisso, foi contra a corrente.
Maílson continuou a ser ouvido por repórteres de todas as mídias para
tratar de economia. Acabaria por se tornar, também, colunista da Veja.
Tudo isso – a presença constante no noticiário — ajudou a empurrar
adiante a consultoria que ele montou pós-governo, a Tendências.
Foi como se a celebridade de alguma forma obscuresse sua obra desastrosa como ministro.
Tenho aqui uma pequena confissão. No início dos anos 2000, quando eu
era integrante do Comitê Executivo da Abril, dormi em boa parte das duas
vezes em que a Tendências fez seus prognósticos econômicos a nós.
Não sou capaz sequer de lembrar se foram acertados ou não, porque não
resisti ao tom monocórdio das apresentações. Meu amigo Jairo Mendes
Leal, hoje presidente da Abril Mídia, sentava-se em frente de mim, e ria
ao me ver dormindo.
Ainda hoje Maílson é presença ubíqua na mídia brasileira. Aos antigos
predicados, ele agregou um que é valioso: critica severamente as
administrações petistas. Maílson sabe que isso lhe dará os holofotes de
jornais e revistas.
É uma troca: ele usa a mídia e é usado por ela. O leitor? Ora, o leitor que se dane.
Do alto do legado hiperinflacionário, Mailson dá lições aos
brasileiros sobre tudo aquilo que ele foi incapaz de fazer. No papel,
ele resolve os problemas em cujo trato fracassou miseravelmente.
Já foi dito aqui que maus editores são tão nocivos, para a mídia tradicional, quanto a internet.
Maílson é uma pequena prova disso.
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