sábado, 10 de agosto de 2013

Considerações sobre os embargos infringentes

Por Sergio Medeiros Rodrigues

Embargos Infringentes. STF, art. 333, do RISTF, e a vedação ao retrocesso em matéria de direitos e garantias fundamentais. Art. 5º, §2º da CF/88. Trata-se de norma com status similar às cláusulas pétreas, não sendo, portanto,  passível de supressão.
Breves considerações sobre os embargos infringentes e sua manutenção na ordem jurídica nacional.

Inicialmente, anoto que a questão referente a manutenção na ordem jurídica pátria das disposições do referido art. 333, do Regimento Interno do STF, não pode ser apreciada  em contraposição à eventuais alterações promovidas por lei superveniente, tendentes a revogar suas normatizações.
E isso por um singelo motivo (aparentemente esquecido pelo Ministro Joaquim Barbosa).

Tal matéria, por estar inserta no conjunto de medidas tendentes a resguardar direitos e garantias fundamentais (ampla defesa em sede penal), não pode ser objeto de supressão.
É que, todas as matérias que se encontram abrangidas pelo artigo 5º da CF/88, direitos e garantias individuais, são consideradas cláusulas pétreas, ou seja, não podem ser objeto de supressão nem mesmo através de Emenda Constitucional.

No caso, pode-se afirmar,  sem erro,  há respaldo na Constituição Federal no sentido de vedação ao retrocesso em matéria de direitos e garantias fundamentais, dentre os quais, indubitavelmente se encontra a possibilidade recursal, a ser concretizada mediante a oposição de embargos infringentes junto ao Supremo Tribunal Federal , eis que, tal recurso mostra-se intrinsecamente ligado a ampla defesa.

Tal garantia encontra-se expressamente albergada junto ao contido no artigo 5º, §2º, da CF/88, in verbis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...) omissis
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Em relação a importância dos embargos infringentes, o  Ministro Celso de Mello, ao defender sua manutenção, apóia-se na garantia do duplo grau de jurisdição (princípio que ainda que não positivado constitucionalmente é tido como parte integrante dos adotados pela CF/88), o qual refere como sendo parte da ampla defesa.

Neste ponto, faço a ressalva, o caso em comento, prescinde de qualquer discussão acerca da aplicabilidade do duplo grau de jurisdição, pois se insere diretamente na ampla defesa, não necessitando desta via obliqua,  e discutível doutrinariamente, para reafirmar a pertinência da manutenção de suas disposições perante a normatização pátria.

Friso, não se trata de simples recurso ordinário, mas de aparato recursal essencial, posto a disposição da defesa dos indivíduos, e, sem dúvida, também  ao Estado na busca da verdade real, visto que, amparado constitucionalmente nas garantias postas num regime que se denomina  democrático de direito.

No sentido de que o referido Regimento tem força de lei (foi recepcionado com este status legal) , trago a colação decisão do STF sobre a matéria, explicitando e afastando eventuais dúvidas.
"Não se mostram suscetíveis de conhecimento os embargos de divergência nos casos em que aquele que deles se utiliza descumpre a determinação contida no art. 331 do RISTF. A utilização dos embargos de divergência impõe que o embargante demonstre, cabalmente, a existência de dissídio interpretativo, expondo, de modo fundamentado, as circunstâncias que identificam ou que tornam assemelhados os casos em confronto, para fins de verificação da relação de pertinência que deve necessariamente existir entre o tema versado no acórdão embargado e a controvérsia veiculada nos paradigmas de confronto. (...) O STF, sob a égide da Carta Política de 1969 (art. 119, § 3º, c), dispunha de competência normativa primária para, em sede meramente regimental, formular normas de direito processual concernentes ao processo e ao julgamento dos feitos de sua competência originária ou recursal. Com a superveniência da Constituição de 1988, operou-se a recepção de tais preceitos regimentais, que passaram a ostentar força e eficácia de norma legal (RTJ 147/1010 – RTJ 151/278), revestindo-se, por isso mesmo, de plena legitimidade constitucional a exigência de pertinente confronto analítico entre os acórdãos postos em cotejo (RISTF, art. 331).” (AI 727.503-AgR-ED-EDv-AgR-ED, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 10-11-2011, Plenário, DJE de 6-12-2011.)

Transcrevo, por oportuno, o teor do artigo 333, do Regimento Interno do Supremo tribunal Federal:
Art. 333. Cabem embargos infringentes à decisão não unânime do Plenário ou  da Turma:
I – que julgar procedente a ação penal;
Omissis (...)
Parágrafo único. O cabimento dos embargos, em decisão do Plenário, depende da existência, no mínimo, de quatro votos divergentes, salvo nos casos de julgamento criminal em sessão secreta.
Neste mesmo sentido, outras decisões recentes do Supremo Tribunal Federal não desbordam de tal entendimento, de que, efetivamente são cabíveis embargos infringentes.
As decisões abaixo com os links para verificação do inteiro teor.
Ementa: PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUESTIONADA QUE NÃO SE INSERE NAS HIPÓTESES DO ART. 333 DO RISTF. REITERADA JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. EMBARGOS NÃO CONHECIDOS. I – Entre as hipóteses de cabimento deste recurso, elencadas no art. 333 do Regimento Interno do STF, não se inserem as decisões não unânimes proferidas pelo Plenário ou pela Turma, que negam provimento a agravos regimentais interpostos em agravos de instrumento criminais. II – Embargos infringentes não conhecidos.
(AI 828792 AgR-EI, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 28/06/2011, DJe-155 DIVULG 12-08-2011 PUBLIC 15-08-2011 EMENT VOL-02565-04 PP-00617)

E M E N T A: "HABEAS CORPUS" - IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO COLEGIADA DE TURMA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - INADMISSIBILIDADE - EXTINÇÃO LIMINAR DO PROCESSO DE "HABEAS CORPUS" POR DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR DA CAUSA - LEGITIMIDADE - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - Não cabe, para o Plenário, impetração de "habeas corpus" contra decisão colegiada de qualquer das Turmas (ou do próprio Pleno) do Supremo Tribunal Federal, ainda que resultante do julgamento de outros processos de "habeas corpus" (Súmula 606/STF) ou proferida em sede de recursos em geral, inclusive aqueles de natureza penal (RTJ 88/108 - RTJ 95/1053 - RTJ 126/175). Precedentes. - Não se mostram admissíveis embargos infringentes contra decisão majoritária do Plenário (ou das Turmas) do Supremo Tribunal Federal, se tal decisão vem a ser proferida em causa diversa daquelas enunciadas, taxativamente, em rol exaustivo ("numerus clausus"), no art. 333 do RISTF. Precedentes. - Não se revela viável a interposição de embargos de divergência contra acórdãos proferidos, pelo Supremo Tribunal Federal, quer em sede originária de "habeas corpus", quer, ainda, no âmbito de recurso ordinário em "habeas corpus". Precedentes.
(HC 88247 AgR-AgR, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 17/09/2009, DJe-218 DIVULG 19-11-2009 PUBLIC 20-11-2009 EMENT VOL-02383-01 PP-00080 LEXSTF v. 31, n. 372, 2009, p. 332-343)

A matéria, embargos infringentes, já foi objeto de apreciação em outros julgados  do STF, inclusive, tendo como Relator o Ministro Joaquim Barbosa(AO 1046 – vide ementa abaixo).
Em relação a referida decisão do Ministro Joaquim Barbosa, observa-se, novamente, um fenômeno recorrente, a partir do julgamento da AP 470, ou seja, a mudança abrupta de entendimento, sem que, no caso, seja devidamente explicitada a fundamentação que deu azo a tal alteração.

 O voto do Ministro Joaquim Barbosa, ao qual me refiro tem a seguinte ementa, in verbis:
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITOS INFRINGENTES. IMPOSSIBILIDADE. OMISSÕES ALEGADAS QUANTO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS APRESENTADOS PELA DEFESA, À ALEGADA SUSPEIÇÃO DO JUIZ PRESIDENTE DO TRIBUNAL DO JÚRI E CONSPIRAÇÃO EM GABINETE DE MINISTRO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E À FUNDAMENTAÇÃO PARA DOSIMETRIA DA PENA. INEXISTÊNCIA. ACÓRDÃO QUE SE PRONUNCIOU SOBRE TODOS OS TEMAS REFERIDOS. AMBIGÜIDADES: CONDENAÇÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS, VIOLAÇÃO À INCOMUNICABILIDADE DOS JURADOS, EXCESSO DE JURADOS CONVOCADOS E IRREGULARIDADE NA REPRESENTAÇÃO DA OAB COMO ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO. INCONSISTÊNCIA. OBJETIVO DE REFORMA DO ENTENDIMENTO JÁ EMITIDO PELO PLENÁRIO. REJEIÇÃO. INTUITO MANIFESTAMENTE PROTELATÓRIO. EMBARGOS REJEITADOS. IMEDIATA EXPEDIÇÃO DE MANDADO PRISIONAL. 1. Não cabem embargos infringentes no caso presente, tendo em vista que não houve divergência de quatro votos em qualquer questão decidida no acórdão embargado. Artigo 333, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Tratando-se de embargos declaratórios, não se admite modificação meritória do entendimento já exarado. Precedentes
(...) omissis  (...)
(AO 1046 ED, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 28/11/2007, DJe-031 DIVULG 21-02-2008 PUBLIC 22-02-2008 EMENT VOL-02308-01 PP-00016)(grifei)



Blog do Luis Nassif

Nenhum comentário:

Postar um comentário