Jornal que, em 1997, denunciou a compra de votos
para aprovação da emenda à reeleição do ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso, afirma que Narciso Mendes, personagem central do livro "O
Príncipe da Privataria", do jornalista Palmério Doria, é mesmo o
personagem que a Folha apresentava como "Senhor X" em suas reportagens;
Mendes gravou deputados admitindo terem recebido propina de R$ 200 mil
para votar a favor da reeleição; segundo o jornal, revelação é
"histórica"; no caso Watergate, a identidade de Mark Felt, fonte das
notícias que derrubaram Richard Nixon, foi preservada durante 33 anos;
aqui, o escândalo de FHC não deu em nada
247 - Na reta
final do julgamento da Ação Penal 470, um discurso do ministro Celso de
Mello chamou a atenção. Segundo ele, o tratamento conferido ao réu José
Dirceu foi "benigno", uma vez que se tratava de corromper as
instituições para permitir que um determinado grupo se perpetuasse no
poder.
Curiosamente, neste fim de semana,
chega às livrarias a obra "O Príncipe da Privataria", do jornalista
Palmério Doria, que aborda uma compra efetiva de votos para que um
determinado grupo se perpetuasse no poder. Em 1997, para que a emenda
que permitiu a reeleição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso
fosse aprovada, parlamentares foram comprados, alguns receberam R$ 200
mil, e o pagamento foi operado por personagens que hoje despontam no
escândalo do metrô.
Nada foi feito, ninguém foi
denunciado e nenhum dos personagens se transformou em réu.
Naquele ano
de 1997, o principal denunciante da história era apontado pela Folha
como "senhor X", um personagem que gravou deputados admitindo terem
recebido a propina. No livro, Palmério revela que ele era o empresário e
ex-deputado Narciso Mendes.
Na edição deste sábado, pela
primeira vez, a Folha confirma que Mendes foi efetivamente o "senhor X"
ou o seu "garganta profunda". Num texto de Ricardo Mendonça, o jornal
classifica a revelação de Palmério Doria, que é também colunista do 247,
como "histórica".
No Brasil, Mendes permaneceu
incógnito durante 16 anos. Nos Estados Unidos, a identidade de Mark
Felt, o vice-presidente do FBI que denunciou o escândalo Watergate, foi
preservada durante 33 anos. A diferença é que, lá, o presidente Richard
Nixon caiu. Aqui, FHC festeja a prisão de réus, que, como diz Celso de
Mello, corromperam as instituições para se perpetuar no poder.
Abaixo, a reportagem de Ricardo
Mendonça, em que a Folha confirma a identidade do seu informante e
lembra que o caso nunca foi investigado:
Livro contra FHC revela fonte que provou compra de votos
"Senhor X" gravou deputados que disseram receber para aprovar reeleição em 97
Empresário Narciso Mendes assume identidade 16 anos após escândalo que abalou governo tucano
Empresário Narciso Mendes assume identidade 16 anos após escândalo que abalou governo tucano
RICARDO MENDONÇA
DE SÃO PAULO
O livro "O príncipe da privataria",
um libelo contra o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que está
sendo lançado pelo jornalista Palmério Dória, traz uma revelação
histórica sobre a compra de votos no Congresso a favor da emenda
constitucional da reeleição, esquema denunciada pela Folha em 1997.
Tratado pelo jornal como "Senhor X"
em diversas reportagens, o homem que naquele ano gravou deputados
admitindo a venda de votos assumiu sua real identidade.
Trata-se do empresário e ex-deputado
Narciso Mendes, 67 anos, dono de um jornal e de uma retransmissora do
SBT em Rio Branco (AC). Em 16 anos, ele nunca havia falado publicamente
sobre o assunto. A seu pedido, seu nome era preservado pelo jornal.
O depoimento de Mendes admitindo ter
colhido as provas da compra de votos é tema dos capítulos 11 e 12 de "O
príncipe da privataria" (399 páginas, Geração Editorial).
Na época, Mendes já era ex-deputado.
Com bom trânsito na bancada do Acre, ele afirma que aceitou gravar os
colegas e entregar o material ao repórter Fernando Rodrigues, autor da
série de reportagens da Folha sobre a compra de votos, porque era "intransigentemente contra" a emenda que viria a favorecer FHC.
Seu único pedido era a manutenção do
anonimato, condição que o jornal aceitou por entender que o interesse
jornalístico se sobrepunha à necessidade de revelação de seu nome. Com a
iniciativa do próprio em revelar sua identidade, a Folha entende que o
acordo está encerrado.
HISTÓRICO
Nas gravações do "Senhor X" em 1997,
dois deputados do Acre, Ronivon Santiago e João Maia (ambos do PFL,
hoje DEM) diziam ter votado a favor da emenda da reeleição em troca de
R$ 200 mil, o equivalente a R$ 530 mil hoje.
Outros três deputados eram citados
de forma explícita nas gravações. As conversas sugeriam que dezenas
teriam participado do esquema.
A denúncia causou abalo no governo,
mas o assunto nunca foi investigado. A tentativa de criação de uma CPI
foi abafada. O então procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro,
não pediu a abertura de inquérito.
Em 21 de maio de 1997, oito dias
após o caso ter sido publicado, Santiago e Maia renunciaram. Os ofícios
enviados ao presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), eram
idênticos.
Ambos alegaram "motivos de foro íntimo".
Dez anos depois, em sabatina na Folha,
FHC não negou que tenha ocorrido compra de votos, mas disse que a
operação não foi comandada pelo governo. "O Senado votou [a reeleição]
em junho [de 1997] e 80% aprovou. Que compra de voto? (...) Houve compra
de votos? Provavelmente. Foi feita pelo governo federal? Não foi. Pelo
PSDB: não foi. Por mim, muito menos."
APANHADO
Apesar do tom escandaloso do
subtítulo, "A história secreta de como o Brasil perdeu seu patrimônio e
FHC ganhou sua reeleição", o livro não traz material exclusivo sobre a
venda de estatais durante o governo tucano (1995-2002).
As várias denúncias citadas, muitas
vezes apresentadas de forma confusa e imprecisa, são reproduções de
notícias publicadas em jornais e revistas da época. Já os argumentos
econômicos são colagens de artigos publicados nos anos 90 pelo
jornalista Aloysio Biondi (1936-2000), ex-colunista da Folha.
A informação mais polêmica do livro
não está no material de Dória, mas na "Carta do Editor", assinada na
introdução por Luiz Fernando Emediato, dono da Geração.
Emediato diz que em 1991, quando
denúncias contra o então presidente Fernando Collor começaram a
surgir,ouviu uma confissão de uso de caixa dois da boca do próprio FHC
numa viagem aos EUA.
Ele diz ter ouvido de FHC o
seguinte: "A diferença entre nós e eles [a turma de Collor] é que nós
gastamos o dinheiro em campanhas, enquanto eles enfiam uma boa parte em
seus próprios bolsos".
Por escrito, o assessor do Instituto
FHC Xico Graziano afirmou que o ex-presidente não se lembra de ter
estado com Emediato nos EUA. Graziano classificou a frase atribuída a
ele como "absurda" e disse que ela "jamais teria sido por ele
pronunciada".
O PRÍNCIPE DA PRIVATARIA
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