Ouço agora o discurso do procurador da República Marlon Alberto Weichert, no lançamento do Brasil Nunca Mais Digital.
É um discurso histórico, no qual Marlon faz um balanço da resistência
ao arbítrio, chama todos os setores da sociedade para uma autocrítica e
mostra a covardia institucional brasileira, de não acompanhar as
decisões da Corte Internacional contra torturadores.
Por que não fomos capazes de resistir à ascensão do autoritarismo?
Por que ficamos inertes ao avanço da tortura? Por que o Poder Judiciário
e o Ministério Público não foram capazes de defender a Constituição?
Diz ele: "O primeiro passo para a ladeira escorregadia na qual o país
caiu foi não reconhecer a Constituição. Independenrtemente de
ideologias, tinha que se impedir que se rasgasse a constituição definida
por Assembleia Constituinte. Quando se permitiu isso, o país foi
ladeira abaixo e os brasileiros não conseguiram escapar da prática da
tortura e dos atropelos dos direitos humanos".
Em seu discurso relembrou o trabalho de advogados que defenderam
presos políticos, não por honorários, mas correndo riscos em nome da
dignidade da profissão.
A questão central é que, por trás dos fatos e episódios históricos,
há o caráter humano, de personagens que atravessam sua trajetória
profissional enganchando-se em todos os oportunismos.
No distante ano de 1977, a OAB de Raimundo Faoro lutava pela volta do
estado de direito; advogados de presos políticos corriam risco
profissional defendendo direitos humanos; pastores, cardeais, rabinos se
juntavam contra a tortura e em defesa da legalidade.
Aqui na sala do MPF em São Paulo vejo antigos batalhadores, de Luiza
Erundina e Aloyzio Nunes Ferreira, assisto Marlon enaltecendo advogados
como Sigmaringa Seixas e Luiz Eduardo Greenghalgh, Belisário e José
Carlos Dias, jornalistas como Ricardo Kotscho e Frei Betto.
Na outra ponta, juristas oportunistas, advogados oportunistas se
valiam do momento para pavimentar sua carreira. Dentre eles, o jovem
advogado Carlos Ayres Britto, que em um artigo de 1977 fazia
uma candente defesa da primazia do AI5 sobre a Constituinte.
Dizia ele:
"O último padrão legislativo (...) é qualificado de "autoritário" -
que não se confunde com "arbitrário" - em confronto com o paradigma
liberal da ordem constitucional. Entretanto (...) por se consubstanciar
em esquemas normativos previamente estabelecidos, esse modelo não fere
do Estado de Direito vigente no país".
"Todavia, a possibilidade de entrechoques (entre a ordem liberal e a
autoritária) de prescrições é inevitável por incidirem, ambos os
sistemas, sobre as mesmas pessoas e o mesmo território político. Nesse
caso, um dos ordenamentos é necessariamente sacrificado , para que outro
possa cumprir sua destinação histórica".
Nas conclusões finais, Ayres é taxativo, de defesa do AI-5 "enquanto
não se completar o ciclo de institucionalização da Revolução Democrática
de 31 de março de 1964.
Ayres Britto fez sua aposta na ditadura e perdeu. Nos anos seguintes
tornou-se petista e amigo dos defensores dos direitos humanos. Por
compadrio com grandes juristas de esquerda, conseguiu de Lula a nomeação
para Ministro da mais alta corte.
Lá, deu-se conta de que, depois da nomeação, devia loas a outros
poderosos. O poder do presidente sobre o Ministro termina no exato
momento em que o escolhido assume o cargo.
Votou contra a revogação da Lei da Anistia. No AP 470 percebeu que o verdadeiro poder estava na mídia, e tornou-se midiático.
Por isso, seria conveniente que se deixasse de lado o julgamento
benevolente de Ayres de que sua mudança de atitude teria sido resultado
do receio de que a mídia explorasse as estripulias de seu genro,
oferecendo seus préstimos (dele, Ayres Britto) a políticos em
dificuldades.
Ayres Britto é o que sempre foi.
Blog do Luis Nassif

Nenhum comentário:
Postar um comentário