Jovem adia busca de trabalho e compensa estagnação do PIB. “Em 10 anos, teremos reflexos econômicos muito positivos”, diz o ministro da Educação, que dará lugar a Cid Gomes em 2015
por André Barrocal
Elza Fiuza / Agência Brasil
Para o ministro, investimento que está sendo feito é de longo prazo
Dados recentes mostram o Brasil com um baixo índice de diplomados entre 25 e 34 anos. Embora tenha quase dobrado para 15% desde 2004, é pouco perto, por exemplo, dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Na geração seguinte, o quadro está relativamente melhor. Os universitários de 18 a 24 anos somam 16,5% da população total da faixa etária, segundo a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), um recorde nacional.
Os novos graduandos parecem mais propensos a dedicar-se só aos estudos, até porque o aumento da renda e o barateamento dos cursos nos últimos anos deram uma folga ao orçamento doméstico. A proporção atual de trabalhadores com 18 a 24 anos é das menores do século, de 60%, diz a Pnad.
A expansão do ensino superior e a redução do trabalho jovem estão entre as causas de um aparente paradoxo: a queda da taxa de desemprego em 2014, ano de estagnação econômica.
Em entrevista a CartaCapital, o ministro da Educação, Henrique Paim, que em 2015 dará lugar a Cid Gomes (Pros-CE), analisa este cenário e aponta o que considera sua principal consequência: “Temos uma outra perspectiva de país, de um país mais desenvolvido e uma mão de obra mais qualificada”.
CartaCapital: Segundo a Pnad, há mais jovens no ensino superior e uma proporção menor de jovens no mercado de trabalho. Por quê?
Henrique Paim: Tivemos um crescimento grande de matrículas no ensino superior nos últimos anos, praticamente dobramos de 2003 a 2013. Isso reflete políticas federais como o Prouni, o Fies e a expansão das universidades públicas, especialmente das federais. Aumentaram as oportunidades educacionais, o que certamente se reflete no interesse dos jovens de estudar mais. De 2003 a 2014, a população de 18 a 24 anos teve uma queda de 5%, mas na população economicamente ativa [PEA] a proporção do segmento caiu 23%. Essa queda acentuada na PEA começou em 2009, 2010. De 2010 a 2014, o número de jovens caiu 3%, enquanto na PEA caiu 16%. Por que chama a atenção a queda do desemprego, mesmo sem crescimento do PIB? Porque caiu a PEA na faixa etária de 18 a 24 anos.
CC: Que consequências essa situação terá para o País nos próximos anos?
Paim: Teremos uma ampliação da qualificação da mão de obra, o País necessita disso. Um conjunto significativo dessas novas vagas, tanto privadas quanto públicas, é voltada para cursos tecnológicos. Em 2011 tivemos uma mudança importante na trajetória do número de ingressantes no ensino superior. Os cursos da área tecnológica ultrapassaram cursos como Direito, uma novidade. O reflexo para a economia é muito positivo. Com uma mão de obra mais qualificada, vamos melhorar nossa produtividade no trabalho. No médio e longo prazos, teremos um incremento no valor agregado dos nossos produtos, o que vai permitir um maior crescimento de renda e de PIB.
CC: Quando essa massa de jovens universitários terá impacto na produtividade da economia?
Paim: Os resultados em educação são de médio e longo prazos. Para formar um jovem no ensino superior, levamos em torno de quatro anos e meio na graduação. Acredito que a partir dos nossos investimentos, da melhoria das condições de acesso ao ensino superior, teremos daqui 10 anos, 15 anos, resultados importantes. E vale lembrar que taxa de retorno na educação é muito elevada, de 9,5% em termos reais.
CC: Que taxa é essa?
Paim: É quanto o investimento em educação gera de retorno para o País. Uma taxa de retorno nominal de 12% em qualquer projeto já é elevada. De 9,5% em termos reais, é bem alta. Mas o que eu acho que deveríamos ressaltar também é o seguinte: houve uma mudança de imaginário dos jovens e das famílias brasileiras. Hoje, mais gente pode sonhar em ter um curso superior. Os brasileiros estão vendo que para avançar socialmente é preciso estudar mais, uma mudança de mentalidade que só ocorreu devido à ampliação das oportunidades proporcionada pelo governo. A partir do momento que o País muda a mentalidade, que as pessoas querem estudar mais, fazem um esforço maior, temos uma outra perspectiva de país, de um país mais desenvolvido, uma mão de obra mais qualificada. É um fenômeno importante que tem de ser registrado.
CC: Juntos, o Fies, o Prouni e a expansão das federais acrescentaram quantas vagas novas?
Paim: No caso das federais, nós triplicamos entre 2003 e 2013. Tínhamos 120 mil, hoje são 360 mil. Mas vaga não é um bom indicador. Quando eu trabalho com instituições privadas, nem todas as vagas aprovadas [no Prouni, no Fies] são utilizadas. O melhor é observar o número de matrículas. Nas matrículas totais, saímos de 3,5 milhões para 7,3 milhões, considerando instituições privadas e públicas. Nas federais também dobrou, de 500 mil para um milhão.
CC: Essa expansão do ensino superior exige mais investimento em qualidade. O que está sendo feito sobre isso?
Paim: Nas universidades federais, todo esse crescimento foi acompanhado de um processo muito forte de inclusão social. Elas passaram por uma mudança de fisionomia de seus estudantes, hoje temos mais estudantes oriundos de escolas públicas, negros, indígenas. Os críticos diziam que teríamos queda de qualidade. Não ocorreu isso, pelo contrário. As federais têm avançado nos indicadores de desempenho. Nas privadas, tanto no Prouni quanto no Fies, nós temos controle dos cursos, eles obrigatoriamente têm de ter um desempenho satisfatório. Além disso, nós criamos uma secretaria exclusiva para regulação do ensino superior. Temos critérios muito mais rígidos. Mas precisamos ampliar os instrumentos de controle. Por isso queremos criar uma entidade reguladora, o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior.
CC: O senhor falou em mudança de perfil dos estudantes. Segundo a última Pnad, o número de universitários negros e pardos aproximou-se do de brancos. Em 2001, era de pouco mais de um terço.
Paim: No Fies, 92% dos estudantes estão numa faixa de dois salários mínimos de renda familiar per capita. No Prouni, a exigência é de 1,5 salário mínimo para a bolsa integral e de 3 salários mínimos para a bolsa parcial. São programas que realmente atingem a população de baixa renda. O Prouni tem cotas, 51% são negros. No Fies, os negros são quase 50%. Nas universidades federais, a última seleção tinha 37% das vagas para negros, chegaremos perto de 45% na próxima. Aquela velha ideia de que quem estuda em escola pública faz universidade privada está se modificando.
CC: Por que o instituto regulador ainda não foi aprovado pelo Congresso depois de dois anos?
Paim: Em geral, projetos de lei de criação de novas autarquias, estruturas governamentais, levam um certo tempo mesmo, passam por várias comissões, discussões.
CC: As universidades privadas têm, de alguma forma, trabalhado contra?
Paim: Elas sabem do rigor do MEC na supervisão e na regulação. Temos tomado medidas bastante duras, que vão desde a interrupção do processo seletivo e a redução do número de vagas até o descredenciamento de instituições. Então, independentemente da aprovação do instituto, o setor tem se adequado a essas regras porque sabe qual é o posicionamento do MEC. Considerando Prouni e Fies, hoje mais de 45% das matrículas em instituições privadas são bancadas a partir de políticas federais. Temos que ter muito rigor e compromisso com a qualidade.
CC: Um colega jornalista tem dois filhos na Europa pelo programa Ciência sem Fronteiras e diz que eles só viajam, não estudam. Que controle existe contra isso?
Paim: Aí tem de analisar a situação específica, que eu não sei qual é. Mas temos pouquíssimos registros deste tipo de situação e, quando ocorre, os estudantes são afastados imediatamente. Como funciona o programa? Nós selecionamos os alunos pelo Enem, eles pleiteiam uma vaga em países como Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha, Itália, aí vemos as regras das instituições, e geralmente são regras rígidas, estamos falando das melhores instituições do mundo. Em cada país, temos instituições intermediadoras acompanhando. Se houver problemas, estas são informadas e informam imediatamente ao Brasil. Até agora, nossa avaliação do programa é muito boa.
Dados recentes mostram o Brasil com um baixo índice de diplomados entre 25 e 34 anos. Embora tenha quase dobrado para 15% desde 2004, é pouco perto, por exemplo, dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Na geração seguinte, o quadro está relativamente melhor. Os universitários de 18 a 24 anos somam 16,5% da população total da faixa etária, segundo a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), um recorde nacional.
Os novos graduandos parecem mais propensos a dedicar-se só aos estudos, até porque o aumento da renda e o barateamento dos cursos nos últimos anos deram uma folga ao orçamento doméstico. A proporção atual de trabalhadores com 18 a 24 anos é das menores do século, de 60%, diz a Pnad.
A expansão do ensino superior e a redução do trabalho jovem estão entre as causas de um aparente paradoxo: a queda da taxa de desemprego em 2014, ano de estagnação econômica.
Em entrevista a CartaCapital, o ministro da Educação, Henrique Paim, que em 2015 dará lugar a Cid Gomes (Pros-CE), analisa este cenário e aponta o que considera sua principal consequência: “Temos uma outra perspectiva de país, de um país mais desenvolvido e uma mão de obra mais qualificada”.
CartaCapital: Segundo a Pnad, há mais jovens no ensino superior e uma proporção menor de jovens no mercado de trabalho. Por quê?
Henrique Paim: Tivemos um crescimento grande de matrículas no ensino superior nos últimos anos, praticamente dobramos de 2003 a 2013. Isso reflete políticas federais como o Prouni, o Fies e a expansão das universidades públicas, especialmente das federais. Aumentaram as oportunidades educacionais, o que certamente se reflete no interesse dos jovens de estudar mais. De 2003 a 2014, a população de 18 a 24 anos teve uma queda de 5%, mas na população economicamente ativa [PEA] a proporção do segmento caiu 23%. Essa queda acentuada na PEA começou em 2009, 2010. De 2010 a 2014, o número de jovens caiu 3%, enquanto na PEA caiu 16%. Por que chama a atenção a queda do desemprego, mesmo sem crescimento do PIB? Porque caiu a PEA na faixa etária de 18 a 24 anos.
CC: Que consequências essa situação terá para o País nos próximos anos?
Paim: Teremos uma ampliação da qualificação da mão de obra, o País necessita disso. Um conjunto significativo dessas novas vagas, tanto privadas quanto públicas, é voltada para cursos tecnológicos. Em 2011 tivemos uma mudança importante na trajetória do número de ingressantes no ensino superior. Os cursos da área tecnológica ultrapassaram cursos como Direito, uma novidade. O reflexo para a economia é muito positivo. Com uma mão de obra mais qualificada, vamos melhorar nossa produtividade no trabalho. No médio e longo prazos, teremos um incremento no valor agregado dos nossos produtos, o que vai permitir um maior crescimento de renda e de PIB.
CC: Quando essa massa de jovens universitários terá impacto na produtividade da economia?
Paim: Os resultados em educação são de médio e longo prazos. Para formar um jovem no ensino superior, levamos em torno de quatro anos e meio na graduação. Acredito que a partir dos nossos investimentos, da melhoria das condições de acesso ao ensino superior, teremos daqui 10 anos, 15 anos, resultados importantes. E vale lembrar que taxa de retorno na educação é muito elevada, de 9,5% em termos reais.
CC: Que taxa é essa?
Paim: É quanto o investimento em educação gera de retorno para o País. Uma taxa de retorno nominal de 12% em qualquer projeto já é elevada. De 9,5% em termos reais, é bem alta. Mas o que eu acho que deveríamos ressaltar também é o seguinte: houve uma mudança de imaginário dos jovens e das famílias brasileiras. Hoje, mais gente pode sonhar em ter um curso superior. Os brasileiros estão vendo que para avançar socialmente é preciso estudar mais, uma mudança de mentalidade que só ocorreu devido à ampliação das oportunidades proporcionada pelo governo. A partir do momento que o País muda a mentalidade, que as pessoas querem estudar mais, fazem um esforço maior, temos uma outra perspectiva de país, de um país mais desenvolvido, uma mão de obra mais qualificada. É um fenômeno importante que tem de ser registrado.
CC: Juntos, o Fies, o Prouni e a expansão das federais acrescentaram quantas vagas novas?
Paim: No caso das federais, nós triplicamos entre 2003 e 2013. Tínhamos 120 mil, hoje são 360 mil. Mas vaga não é um bom indicador. Quando eu trabalho com instituições privadas, nem todas as vagas aprovadas [no Prouni, no Fies] são utilizadas. O melhor é observar o número de matrículas. Nas matrículas totais, saímos de 3,5 milhões para 7,3 milhões, considerando instituições privadas e públicas. Nas federais também dobrou, de 500 mil para um milhão.
CC: Essa expansão do ensino superior exige mais investimento em qualidade. O que está sendo feito sobre isso?
Paim: Nas universidades federais, todo esse crescimento foi acompanhado de um processo muito forte de inclusão social. Elas passaram por uma mudança de fisionomia de seus estudantes, hoje temos mais estudantes oriundos de escolas públicas, negros, indígenas. Os críticos diziam que teríamos queda de qualidade. Não ocorreu isso, pelo contrário. As federais têm avançado nos indicadores de desempenho. Nas privadas, tanto no Prouni quanto no Fies, nós temos controle dos cursos, eles obrigatoriamente têm de ter um desempenho satisfatório. Além disso, nós criamos uma secretaria exclusiva para regulação do ensino superior. Temos critérios muito mais rígidos. Mas precisamos ampliar os instrumentos de controle. Por isso queremos criar uma entidade reguladora, o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior.
CC: O senhor falou em mudança de perfil dos estudantes. Segundo a última Pnad, o número de universitários negros e pardos aproximou-se do de brancos. Em 2001, era de pouco mais de um terço.
Paim: No Fies, 92% dos estudantes estão numa faixa de dois salários mínimos de renda familiar per capita. No Prouni, a exigência é de 1,5 salário mínimo para a bolsa integral e de 3 salários mínimos para a bolsa parcial. São programas que realmente atingem a população de baixa renda. O Prouni tem cotas, 51% são negros. No Fies, os negros são quase 50%. Nas universidades federais, a última seleção tinha 37% das vagas para negros, chegaremos perto de 45% na próxima. Aquela velha ideia de que quem estuda em escola pública faz universidade privada está se modificando.
CC: Por que o instituto regulador ainda não foi aprovado pelo Congresso depois de dois anos?
Paim: Em geral, projetos de lei de criação de novas autarquias, estruturas governamentais, levam um certo tempo mesmo, passam por várias comissões, discussões.
CC: As universidades privadas têm, de alguma forma, trabalhado contra?
Paim: Elas sabem do rigor do MEC na supervisão e na regulação. Temos tomado medidas bastante duras, que vão desde a interrupção do processo seletivo e a redução do número de vagas até o descredenciamento de instituições. Então, independentemente da aprovação do instituto, o setor tem se adequado a essas regras porque sabe qual é o posicionamento do MEC. Considerando Prouni e Fies, hoje mais de 45% das matrículas em instituições privadas são bancadas a partir de políticas federais. Temos que ter muito rigor e compromisso com a qualidade.
CC: Um colega jornalista tem dois filhos na Europa pelo programa Ciência sem Fronteiras e diz que eles só viajam, não estudam. Que controle existe contra isso?
Paim: Aí tem de analisar a situação específica, que eu não sei qual é. Mas temos pouquíssimos registros deste tipo de situação e, quando ocorre, os estudantes são afastados imediatamente. Como funciona o programa? Nós selecionamos os alunos pelo Enem, eles pleiteiam uma vaga em países como Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha, Itália, aí vemos as regras das instituições, e geralmente são regras rígidas, estamos falando das melhores instituições do mundo. Em cada país, temos instituições intermediadoras acompanhando. Se houver problemas, estas são informadas e informam imediatamente ao Brasil. Até agora, nossa avaliação do programa é muito boa.
Carta Capital
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