quarta-feira, 2 de setembro de 2015

'PELO AMOR DE DEUS, MUDE A POLÍTICA ECONÔMICA'



Em entrevista exclusiva ao 247, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) reafirmou seu apoio ao governo da presidente Dilma Rousseff, mas pediu mudanças urgentes na política econômica, capitaneada pelo ministro Joaquim Levy; segundo ele, a alta taxa de juros é a principal responsável pelo problema fiscal do País; "Concretamente, nós não temos como avançar neste País com essa taxa de juros, e vale dizer: o impacto sobre a inflação não existe", diz; o petista afirma que o problema do déficit tem que ser resolvido fazendo justiça tributária: "Não aceitaremos cortes em programas sociais, na Educação ou na Saúde"

2 DE SETEMBRO DE 2015 ÀS 05:12


247 - O senador petista Lindbergh Farias (PT-RJ) voltou a criticar a política econômica de Joaquim Levy, embora reafirme seu apoio ao governo Dilma Rousseff. Em entrevista exclusiva ao 247, ele se diz convencido de que a política de altas taxas de juros é responsável pelo déficit primário de R$ 30,5 bilhões previsto no projeto de orçamento da união.

Ontem, em discurso no plenário do Senado, ele apelou para que a presidente Dilma assuma as rédeas e promova uma guinada na atual política monetária, para evitar o agravamento da crise. “Está aqui um Senador do PT que vai defender a Presidenta Dilma até o último instante, mas, pelo amor de Deus, mude essa política econômica! Falo isso porque a gente quer que este Governo dê certo, dê a volta por cima”.

Lindbergh diz que o problema do déficit tem que ser resolvido fazendo justiça tributária. “Não aceitaremos cortes em programas sociais, na Educação ou na Saúde”, adianta o senador. “Desta vez, não podem ser os mais pobres, os trabalhadores, que têm que pagar a conta; é o andar de cima, que paga muito pouco imposto no País quando comparado aos trabalhadores e à classe média”, defende Lindbergh, que apresentará um projeto para ressuscitar a cobrança de tributos sobre distribuição de lucros e dividendos, extinta no governo Fernando Henrique Cardoso. A proposta, diz ele, pode ter impacto fiscal suficiente para resolver o déficit nas contas do governo.

O senhor tem feito pressão contra a política econômica do governo. Por quê?

Fui contra o ajuste fiscal. O ministro (Joaquim) Levy (Fazenda) dizia: “Nós vamos fazer esse esforço porque, no ano passado, houve um déficit nominal de 6,7% do PIB, e a gente tem que melhorar a situação fiscal para o País avançar, para as expectativas melhorarem.” Foi isso que ele vendeu ao Brasil. Foi isso que ele disse à presidenta Dilma e disse aqui, no Congresso Nacional.

Eu votei contra porque eu não acreditava naquilo. Esses planos de austeridade mundo afora têm resultado no aumento da recessão econômica, na redução da arrecadação e na elevação da dívida. Só que aqui, no Brasil, dessa vez, nós tivemos um aperto fiscal em conjunto com uma política monetária esquizofrênica, que tem um impacto fiscal gigantesco.

Cada ponto que sobe da taxa de juros significa R$15 bilhões a mais, e, de outubro para cá, nós já aumentamos em 3,25% os juros do nosso País.

O que fizemos esse ano? O governo fez um ajuste fiscal. Cortamos investimentos em R$ 20 bilhões. O Congresso votou as Medidas Provisórias que tratavam de abono, seguro-desemprego e, segundo o governo, a economia seria de R$ 14 bilhões. O que aconteceu? A situação fiscal piorou. Nós tínhamos fechado o ano passado com um déficit de 6,7% do PIB (Produto Interno Bruto) e, agora, o acumulado até julho já está em 8,8%.

Qual a causa disso?

Além da desaceleração da arrecadação, algo em torno de 3% a menos que no ano passado, o problema foi a política monetária, a taxa de juros. Pagamos, nos últimos 12 meses acumulados até julho, R$ 451 bilhões, que corresponde a 7,92% do PIB. Eram 5,6% do PIB no mesmo período do ano passado. Não é preciso ser matemático. O déficit está aqui. No ano passado, de janeiro a julho, pagamos R$148 bilhões de juros. Em 2015, somando juros e swaps cambiais, foram R$288,6 bilhões.

Concretamente, nós não temos como avançar neste País com essa taxa de juros, e vale dizer: o impacto sobre a inflação não existe. A inflação está em nove pontos. Estava em seis pontos e está em nove pontos. Todos os economistas sabem que a inflação que nós estamos tendo é a inflação de preços administrados, como energia elétrica e gasolina, de alimentos, além do impacto do câmbio, mas não é inflação de preços livres. A taxa Selic só pega os preços livres, e a economia está desaquecendo, está lá embaixo.

O que espera do governo?

O que eu peço à presidenta Dilma é que assuma as rédeas desse processo, que surja a Dilma Coração Valente, com o programa que foi vencedor das eleições, e que mude essa política econômica. A questão central é a retomada do crescimento econômico e a proteção dos empregos. Não é o ajuste fiscal. Se não mudarmos essa política econômica, mergulharemos em uma recessão, que pode superar 2,5% este ano, e em uma recessão em cima da recessão no ano que vem, com desaceleração que pode chegar até a um ponto. E isso vai continuar alimentando a crise política.

Como resolver o problema do déficit?

Não aceitaremos cortes em programas sociais, na Educação ou na Saúde. Desta vez, não podem ser os mais pobres, os trabalhadores que têm que pagar a conta; é o andar de cima, que paga muito pouco imposto no País quando comparado aos trabalhadores e à classe média. Não podemos jogar a conta desse déficit nas costas do povo trabalhador, que já está pagando muito com desemprego, com redução da massa salarial.

Há um conjunto de medidas que podem ser tomadas no sentido de deixar nosso sistema tributário mais justo e progressivo.
Nós, à luz da discussão desse orçamento, vamos apresentar medidas em relação à tributação e à forma de superar esse déficit.

Estamos apresentando um projeto para voltar a cobrança do imposto sobre distribuição de lucros e dividendos no país e em casos de remessa ao exterior.

Esse tributo era cobrado até 1995, quando foi extinto pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Com a volta da alíquota de 15%, o governo poderá ter um incremento de R$ 50 bilhões na sua arrecadação. E tem mais! Esse é um imposto que atinge principalmente os muito ricos do País, que pagam muito pouco.

Para se ter uma ideia, os 10% mais pobres comprometem 32% de seus rendimentos com impostos. Os 10% mais ricos, 22%. Segundo estudo dos economistas Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair, do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), os 0,3% mais ricos, o equivalente a 71.440 pessoas que concentram 14% da renda do País e 22,7% de toda a riqueza declarada, pagam em média de 2,6% de impostos sobre sua renda total.

A questão é simples: um funcionário que recebe R$ 5 mil de salário desconta 27,5% de imposto. Já um multimilionário não paga nada se recebe a título de lucros e dividendos.


Brasil 24/7

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