Por que os opositores cobram do governo e do PT
comportamentos aos quais nunca se sentiram obrigados? Por esperteza
É possível que as oposições
brasileiras tenham, de si mesmas, uma péssima imagem. E que seus
porta-vozes uma ainda pior. Haveria outra razão para que cobrem, do
governo e das lideranças petistas, comportamentos aos quais nunca se
sentiram obrigadas? Que clamem aos céus quando seus adversários fazem o
que sempre foi sua marca registrada?
Por que só o governo e os petistas pecariam ao fazer como
elas? Qual o motivo de denunciá-los, se suas práticas, em tantos
momentos, foram iguais? Só pode ser porque, do PT, esperavam mais.
Porque, no fundo, no fundo, achavam que o PT deveria ser diferente
delas.
Por ser formado
por pessoas mais idealistas e menos conspurcadas pelos velhos vícios de
nosso sistema político, o PT não deveria agir do mesmo modo. O que
seria admissível para elas, considerando uma compreensível falta de
escrúpulos, seria indesculpável em um petista.
Há, no entanto, outra hipótese. Talvez não seja uma
espécie de pundonor envergonhado que as leve a exigir do PT que seja o
que elas não conseguem ser. Talvez seja puro cinismo. Se, por decência, o
PT não deveria fazer o que elas fazem, seriam elas as indecentes. Se,
ao contrário, não era condenável o que fizeram quando estavam no poder,
exigir que o PT deixasse de fazê-lo quando chegasse a sua vez chegaria a
ser desfaçatez.
Tomemos, como ilustração, o debate dos últimos meses sobre
a “antecipação” da eleição presidencial de 2014. O responsável por
tê-la deflagrado seria Lula, ao afirmar que Dilma Rousseff é a candidata
natural do PT na sucessão do ano que vem.
Nove em dez lideranças oposicionistas passaram a
“denunciar” o gesto do ex-presidente, como se tivesse dito algo além do
evidente: que Dilma faz um bom governo e tem todo o direito de buscar a
reeleição. Os funcionários da mídia ligada à oposição, achando que
faziam “jornalismo crítico”, engrossaram o coro de repúdio à
“antecipação”.
Em primeiro lugar, a própria ideia faz
pouquíssimo sentido. Reclamar da “antecipação” implica acreditar que
exista uma “hora certa” para que o eleitorado de um país possa começar a
discutir seu futuro. Que, até lá, todos deveriam ser proibidos de
tratar do assunto. Quem ouviu a grita das lideranças oposicionistas e
da “grande imprensa” pode ter pensado que nunca tínhamos tido a
“antecipação” que questionaram. Que, antes de Lula “antecipar” a eleição
de 2014, as anteriores aconteceram em sua “hora natural”.
Mas o fato é que a mais radical
“antecipação” de uma eleição presidencial em nossa história aconteceu no
governo tucano. Mais precisamente, quando Fernando Henrique Cardoso
levou a maioria parlamentar que o apoiava a aprovar uma emenda
constitucional que lhe dava o direito de
pleitear um segundo mandato. Exposto o interesse do Planalto na emenda
da reeleição e revelados os bastidores da atuação de seus operadores
para fazê-la passar no Congresso, ficou evidente que FHC era candidato a
permanecer no cargo. Tanto que estava disposto a pagar para ter o
direito de disputá-lo.
O que significa dizer que a eleição de 1998 começou,
oficialmente e em razão do comportamento e das declarações do presidente
da República e de seus assessores, quase dois anos antes da hora. Se
alguém quisesse falar de “antecipação”, melhor exemplo que esse não
haveria.
Algo semelhante
ocorre em relação a outra “denúncia” oposicionista, de que Dilma, após
lançada “precipitadamente” sua candidatura, estaria “usando o governo”
com “fins eleitoreiros”. O momento mais extraordinário de “uso
eleitoral do governo” em uma sucessão presidencial moderna no Brasil
ocorreu na eleição de 1994, a primeira vencida por FHC. Mas todas as
manifestações recentes das oposições, aparentemente, o esquecem.
Existiria exemplo de uso eleitoral do governo maior que o
lançamento do Plano Real em 1994? Seria possível fazer mais que
implantar um programa anti-inflacionário em um cronograma fixado de
forma a coincidir com o calendário eleitoral?
De teatro em teatro, o que as oposições partidárias e a
direita midiática pretendem é atar as mãos do governo e do PT, impedindo
que faça o jogo político dentro das regras que elas próprias
escreveram. Na verdade, não é por autocrítica ou cinismo que fazem
assim. É apenas por esperteza.
Carta Capital
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