Diferentes advogados dos
réus condenados no chamado mensalão levantam a mesma questão em seus
embargos declaratórios ao STF: contradição de datas em que José Dirceu
"fechou o pacote" de R$ 20 milhões com José Carlos Martinez; para
Joaquim Barbosa, isso teria acontecido em dezembro de 2003; Martinez,
porém, morreu em 4 de outubro daquele ano, em desastre de avião; antes
disso, penas que puniam corrupção eram mais leves; elas foram agravadas
em novembro, por iniciativa do governo Lula; assim, alteração no dia do
encontro acarretaria revisão da pena estabelecida por legislação mais
dura; comparações foram feitas por jornalista Paulo Moreira Leite, em
sua coluna na revista Istoé; leia
247 – Um erro crasso cometido pelo presidente do
Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, pode mudar as penas do
julgamento da Ação Penal 470, o chamado 'mensalão'. Trata-se de uma
simples troca de datas, mas que traz uma grande consequência para os
envolvidos no crime, especialmente o ex-ministro José Dirceu, uma vez
que as punições contra a corrupção mudaram de um período a outro.
Para Barbosa, o encontro entre Dirceu e o presidente do PTB José
Carlos Martinez, quando teria sido acertado um "pacote" de R$ 20
milhões, ocorreu em dezembro de 2003. Em novembro daquele ano, as penas
para corrupção, por iniciativa do governo Lula, foram ampliadas.
Martinez, na verdade, morreu em 4 de outubro de 2003, em desastre de
avião. Caso o encontro tenha realmente acontecido e com o teor apurado
pelo Supremo, esse crime foi cometido quando a legislação previa penas
menores para aquele tipo de ato.
A questão foi trazida à tona por vários advogados em seus embargos
declaratórios ao STF, como lembrou em artigo o jornalista Paulo Moreira
Leite, da revista Istoé. A grande questão, aqui, é em relação às leis
vigentes no período. Se o encontro tivesse ocorrido em dezembro, a
punição para o crime teria sido maior – mínima de dois anos e máxima de
12 anos, como foi de fato definido pela corte. Porém, se ocorreu, o
encontro só pode ter acontecido antes de 4 de outubro, data em que
Martinez morreu. Naquela data, a punição para crime de corrupção era
menor: mínima de um ano e máxima de oito anos.
O erro, tão básico, poderia ter sido evitado com uma simples consulta ao Wikipedia, como lembrou Paulo Moreira Leite. No site, há a data exata em que Martinez morreu: repita-se, 4 de outubro de 2003.
Assista vídeo com as declarações dos ministros sobre o caso e, abaixo, artigo do jornalista Paulo Moreira Leite publicado no site da revista Istoé:
Uma ressurreição assombra o STF
Vários advogados dos réus do mensalão levantaram uma questão
interessante em seus embargos declaratórios no Supremo. Eles mostram uma
contradição de datas para a realização de um crime que teve um impacto
considerável na hora de definir a pena de cada um.
Como você poderá acompanhar neste vídeo, o que se debatia em 2012 era
a data em que José Dirceu havia "fechado o pacote" de R$ 20 milhões com
José Carlos Martinez, presidente do PTB.
A data correta, como se verá, era outubro de 2003.
Mas os juízes, após diversas intervenções de Joaquim Barbosa, se
convenceram que o encontro havia sido em dezembro de 2003. Não é uma
questão de calendário.
Em outubro de 2003, as leis que puniam a corrupção no país previam
penas relativamente leves. A mínima era de 1 ano de prisão. A máxima, 8
anos.
Mas, por uma iniciativa do governo Lula, em novembro daquele ano se
consumou uma mudança no código penal. As penas foram agravadas. A pena
mínima tornou-se de 2 anos. A máxima, 12 anos.
Basta reparar que era um erro muito fácil de ser evitado.
Bastava um assessor do STF entrar no Google e conferir quando o ex-deputado Martinez havia morrido.
Não foi um fim banal, mas um desastre de avião.
A data foi 4 de outubro de 2003. Está lá, na Wikipédia. Fiz isso há alguns minutos.
Em 12 de novembro de 2012, no entanto, a ressurreição de Martinez fez seus efeitos.
Numa postura que trai alguma desconfiança, Marco Aurélio chegou a
sublinhar: "é importantíssimo saber a data em que o pacote foi fechado".
Com a mesma dúvida, Gilmar Mendes questionou Joaquim:
- Portanto, a data em que Vossa Excelência o identifica é de?
- É posterior à lei, é dezembro de 2003.
Outro ministro, Celso de Mello, esclareceu, concordando com Joaquim,
que Martinez faleceu "quando estava em vigor a leis mais gravosa".
Foi assim, nesse ambiente, que vários réus foram condenados pelo
crime de corrupção ativa. O advogado Rogério Tolentino chegou a dizer
que os réus condenados por corrupção passiva receberam a data correta,
enquanto os condenados por corrupção ativa, como Dirceu e Jose Genoíno,
receberam a data errada.
Dirceu foi condenado a 7 anos e 11 meses por corrupção ativa.
Faltou um mês para que fosse punido pela pena máxima – pelo critério
antigo. Mas, pela nova legislação, foi uma punição menos grave.
O contexto das discussões entre os ministros mostra que eles votaram numa coisa quando a realidade era outra.
Será que as penas teriam sido tão longas se eles tivessem consciência de que os parâmetros eram outros?
Essa é a pergunta.
Nenhum ser humano está livre de cometer lapsos e erros de todo tipo.
Quantas vezes isso já aconteceu aqui neste espaço? Quantas correções já publiquei em minhas reportagens?
Perdi a conta.
Então não quero fingir que tenho muita lição a dar.
Mas estamos falando de um julgamento, apresentado como o mais importante da história do tribunal.
Estavam em jogo a liberdade e os direitos dos cidadãos, num país
democrático. Os ministros questionaram, suspeitaram de um erro, mas ele
foi cometido mesmo assim. Votaram a partir de um dado falso.
Essa é a questão que sobra aqui.
Os condenados terão suas penas reduzidas por causa desse erro? Ou vamos fingir que não aconteceu nada?
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