Sanção da lei pela presidenta Dilma Rousseff sofreu dois vetos, mas determina a definição de políticas e novos programas de inclusão social e aperfeiçoamento para jovens carentes com idade entre 15 e 29 anos
por Hylda Cavalcanti e Rodrigo Gomes, da RBA
05/08/2013
antonio cruz/abr
Brasília – Mais políticas públicas voltadas para os
jovens, por meio de uma declaração de direitos da população com idade
entre 15 e 29 anos e benefícios como o pagamento de meia-entrada em 40%
do total de ingressos para eventos culturais, reservas de duas cadeiras
gratuitas e outras duas vagas nos ônibus ao preço de meia-passagem para
pessoas dessa faixa etária são alguns dos pontos do estatuto da
juventude, que foi sancionado esta tarde (5) pela presidenta Dilma
Rousseff.
O texto passou nove anos em tramitação no Congresso e foi aprovado
apenas em julho passado, como parte da agenda positiva imprimida pelos
parlamentares depois das manifestações dos últimos meses. Sua rápida
sanção também foi considerada reflexo do esforço que vem sendo feito
pelo Executivo no sentido de passar a ter maior sintonia com a geração
que liderou e participou de tais manifestações.
Não à toa, a cerimônia de sanção da nova lei contou com a
participação, além do vice-presidente da República, Michel Temer, do
secretário-geral da Presidência, ministro Gilberto Carvalho, e da
secretária nacional de Juventude (vinculada à Presidência da República),
Severine Macedo, do presidente da Câmara dos Deputados, Henrique
Eduardo Alves (PMDB-RN) e alguns parlamentares, além de representantes
da União Nacional dos Estudantes (Une), universidades e entidades do
ensino médio. Terminou sendo marcada como uma forma, ao menos simbólica,
de transmitir nova temperatura ao relacionamento entre Executivo e
Legislativo, de agora até o final do ano. E também entre os dois poderes
no atendimento às vozes que partiram das ruas.
Ao sancionar a lei, Dilma destacou a importância de se combater a
violência contra os jovens negros e pobres e disse que pretende fazer
com que o texto tenha o caráter de “um novo pacto no país, contra a
desigualdade”. “Temos que construir dentro do Estatuto da Juventude essa
questão, a questão da violência contra mulheres e homens negros e
pobres. Esse pacto, como todos os pactos importantes, é baseado numa
visão de que o que compromete qualquer processo no Brasil é a
desigualdade. Então, é um pacto pela igualdade, por mais oportunidades,
para garantir maior participação. É um pacto fundado em valores éticos e
na certeza de que nosso país tem como foco principal suas crianças e
seus jovens”, acentuou.
Mais direitos
O Estatuto da Juventude só foi aprovado depois das passeatas – prevê a
criação de conselhos para definir programas destinados a este público
por parte dos governos municipais e estaduais, além do Executivo
Federal, para a inclusão e melhor preparação dos jovens brasileiros.
Permite, conforme o teor da legislação sancionada, que direitos já
previstos em lei como educação, trabalho, saúde e cultura, sejam
aprofundados para atender às necessidades específicas dos jovens,
respeitando as suas trajetórias e diversidade.
Passam a ser discutidos, ainda, direitos à participação social, ao
território, à livre orientação sexual e à sustentabilidade por esse
público. O estatuto também traz como outra novidade o fato de
estabelecer como obrigatória, por parte dos governos, daqui por diante, a
organização de políticas da juventude e criação de espaços para ouvir
os jovens, bem como a criação de conselhos estaduais e municipais.
Segundo informações da Secretaria de Políticas para a Juventude, os
brasileiros com idades entre 15 e 29 anos são, atualmente, cerca de 51
milhões – número que é considerado o maior já registrado nessa faixa
etária, na história do país. “A intenção é que as normas definidas pelo
estatuto permitam maior inclusão e que a declaração de direitos passe a
ser vista como instrumento fundamental para o aprofundamento de
políticas públicas e avanços”, afirmou Severine Macedo.
Para adiantar a política, a presidenta Dilma também assinou, em
paralelo à sanção da lei, decreto que cria o Comitê Interministerial da
Política de Juventude, e o termo de lançamento do primeiro edital do
Programa Estação Juventude. O programa, orçado em R$ 20 milhões, tem
como objetivo promover a inclusão e emancipação dos jovens, por meio de
equipamentos públicos, com o oferecimento de informações sobre programas
e ações para os jovens e suas formações profissionais e pessoais.
Educação e renda
A sanção do texto também agradou a parlamentares vinculados a
projetos voltados para jovens e atuantes na defesa de direitos humanos,
como a deputada Manuela D’Ávila (PC do B-RS). Ex-presidente da Comissão
de Direitos Humanos da Câmara e relatora do projeto na Casa, Manuela
destacou a importância da proposta, que a seu ver “assegura à população
entre 15 e 29 anos acesso a educação, profissionalização, trabalho e
renda, além de determinar a obrigatoriedade de o Estado manter programas
de expansão do ensino superior, ofertando bolsas de estudos em
instituições privadas e financiamento estudantil”. “Em um país em que o
desemprego, os salários baixos e a informalidade tendem a afetar mais
jovens do que adultos, as novas regras tornam-se fundamentais para
garantir oportunidades de vida à juventude”, acentuou.
Já o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), relator da proposta na
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, afirmou
que o estatuto representa um “marco legal” na consolidação das políticas
públicas voltadas para a juventude. “A nova lei assegura a visibilidade
e a prioridade desse público tão heterogêneo e dinâmico quanto
fundamental para o desenvolvimento do país”, enfatizou.
Vetos e gratuidade
A lei sancionada pela presidenta, no entanto, sofreu dois vetos. Um
deles, relativo a temas que tinham sido objeto de discussões iniciais na
Câmara e foram depois aprovados na votação em plenário, durante o calor
das manifestações e o afã de deputados e senadores em beneficiar os
manifestantes. No item que garante a meia-entrada em eventos culturais e
esportivos de todo o país para jovens de baixa renda e estudantes, a
presidenta vetou artigo que previa meia-passagem em transporte
interestadual para jovens de baixa renda e estabeleceu a obrigatoriedade
de serem oferecidos, nestes transportes, quatro vagas. Duas delas,
serão gratuitas e as outras duas, serão oferecidas mediante
meia-passagem, conforme a ordem de chegada. O segundo veto diz respeito à
destinação de recursos recursos extraorçamentários para o transporte
público.
A presidenta da UNE, Virgínia Barros, disse que o momento merece ser
comemorado e que o estatuto representa o "aprofundamento da democracia,
por integrar de forma protagonista a juventude na sociedade que
queremos". “A sanção dialoga com as vozes que foram para as ruas nos
meses de junho e julho”, disse. O presidente do Conselho Nacional de
Juventude, Alessandro Belchior, por sua vez, deu uma declaração mais
sintonizada com as preocupações expostas pela presidenta da República.
Belchior disse que os jovens têm feito da rua um “espaço privilegiado de
vivência”, mas a violência na repressão policial das manifestações pelo
país é um ponto negativo neste avanço. “Agora as ruas pedem mais: mais
direitos, mais liberdade e mais democracia. Não conseguiremos
materializar os direitos dos jovens sem falar nas recentes e violentas
repressões”, colocou.
Ao falar da importância do estatuto, Dilma
ressaltou a importância de ouvir os jovens e destacou o projeto do
Observatório Participatório, que vai ouvir as demandas deste segmento
através das redes sociais, sem descartar os canais físicos dos
Conselhos de Juventude que deverão ser instalados nos estados e
municípios. “Nós vamos ficar cada vez mais conectados.
Não só com a voz
das ruas, mas com as das redes também”, afirmou.
Dilma defendeu a aplicação integral dos
recursos dos royalties do petróleo em educação. “O governo federal
considera fundamental que sejam destinados à educação. Nós consideramos, inclusive, que essa destinação tem uma função ainda mais decisiva no combate à desigualdade.
O grande caminho para sair da desigualdade é a educação”, explicou.
O presidente do Conselho Nacional de Juventude,
Alexandre Melquior, lembrou que a definição de políticas públicas
específicas para a juventude é uma determinação de Organização das
Nações Unidas desde os anos 1980. Ele também cobrou a democratização dos
meios de comunicação, como forma de ampliar a democracia, e que se
efetive uma reforma política que garanta o financiamento público de
campanhas. “Nosso sistema político está falido, pois o financiamento
privado é a mãe da corrupção”, afirmou.
O rapper Genival Oliveira Gonçalves, o GOG, leu
uma carta elaborada por artistas negros em que destacou a necessidade
urgente do enfrentamento à violência contra a juventude negra. “Pedimos
a desmilitarização da polícia e o fim dos autos de resistência. No
lugar de investimento em armamento e presídios, escolas e cultura.
Ainda vivemos em uma ditadura, com mortes, desaparecimentos. Não
queremos viver perdendo amigos, parentes, vizinhos, para polícias,
milícias e traficantes”, disse.
GOG lembrou o caso do pedreiro Amarildo de
Souza, desaparecido dia 14 de julho após ser levado, por policiais
militares, à sede da Unidade de Polícia Pacificadora da favela da
Rocinha, no Rio de Janeiro. “Estamos felizes com a sanção do estatuto,
mas queremos mais. Queremos políticas públicas pensadas para a juventude
negra e pobre deste país.”
Rede Brasil Atual
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