Por Jotavê
Num texto brilhante reproduzido aqui há poucos dias, o jornalista
Mauro Santayana fazia uma obervação da qual eu gostaria de discordar.
Dizia o texto, lá pelas tantas:
"Esse é um dos paradoxos da democracia moderna: sem dinheiro, não há o
exercício do voto; com ele, e no volume exigido, a legitimidade do
sufrágio é posta em dúvida."
Essa é, a meu ver, a grande mentira que todos estão assumindo como se
fosse uma verdade - a de que a democracia contemporânea está CONDENADA a
ser cara, e a exigir, por isso, financiamentos bilionários. As pessoas
precisam começar a perceber que isso não é verdade. Pela primeira vez na
história temos a possibilidade de fazer com que a democracia tenha
custo ZERO. Pela primeira vez é possível conciliar a mais completa e
absoluta liberdade de expressão com o BANIMENTO dos financiamentos
milionários, sejam públicos ou privados. Não se faz isso porque o
sistema atual de financiamento interessa a todos os envolvidos, com
exceção do contribuinte. Por uma lado, lucram os políticos, pois o
sistema os envolve numa teia de corrupção tacitamente consentida na qual
eles fazem fortuna. E lucram também as empresas, pois em troca das
contribuições elas têm a perspectivas de ganhos muitos mais certos e
volumosos do que teriam sem o concurso de seus aliados políticos. Como
políticos e empresários estão satisfeitos com o sistema, criou-se o mito
de que ele é inescapável. Todos reconhecem que o sistema é imperfeito,
mas argumentam que a democracia contemporânea só sobrevive a esse preço.
Ora, o contrário disso é que é verdade. Era necessário dinheiro,
talvez, ao tempo em que a propaganda política exigia grandes comícios
pelo país todo. Agora, que a campanha é feita pela televisão, o custo
pode perfeitamente descer a ZERO (ou a algo muito próximo disso). No que
a liberdade de expressão seria prejudicada caso fosse PROIBIDO fazer
qualquer propaganda política que não fosse pelo rádio e pela televisão?
No que a liberdade de expressão de CONTEÚDOS ficaria prejudicada caso
fosse proibido veicular esses conteúdos na FORMA de peças publicitárias
caríssimas, cheias de efeitos especiais, exigindo o concurso de um Duda
Mendonça, ou de um Marcos Valério? Por que não exigir que a propaganda
seja feita de forma padronizada, com o recado sendo dado pelos políticos
num estúdio, pedindo votos para um PARTIDO, e não para CANDIDATOS
isolados?
A manutenção do atual sistema atende a razões de ordem ideológica. O
financiamento privado é uma peça essencial no jogo de minar o poder do
Estado, reduzindo-o à insignificância. Todos os candidatos já entram na
disputa com o rabo preso, atrelados direta ou indiretamente a esquemas
criminosos de financiamento. A grande imprensa sabe disso, e passa a
utilizar o principal instrumento a seu dispor para manter o Estado
permanentemente acuado: a denúncia seletiva. O alvo raramente é o
partido A ou o partido B. O alvo é QUEM ESTIVER NO PODER. É ali que a
imprensa irá atirar. A grande glória para um jornalista, hoje, é
conseguir derrubar um ministro, ou (glória suprema!!!) um presidente da
república. É isso que faz uma carreira de sucesso no jornalismo: o
número de escândalos que o jornalista consegue "denunciar", e os efeitos
que têm essas denúncias. O resultado disso é a descrença generalizada
da população, a idéia de que todo político é corrupto, de que tanto faz
eleger este quanto aquele, que o resultado no final das contas será
exatamente o mesmo. O resultado líquido, portanto, é a DESCRENÇA NA
POLÍTICA como um todo. Ora, o que poderia ser mais funcional para o
capitalismo contemporâneo do que essa descrença?
Encontramos aqui o motivo profundo de as pessoas não enxergarem uma
verdade singela como a que enunciei mais acima. Esta é a razão pela qual
seguimos acreditando que é inevitável termos financiamentos milionários
numa época em que eles são OBVIAMENTE dispensáveis - em que, repito,
PELA PRIMEIRA VEZ NA HISTÓRIA, poderíamos nos livrar da praga do
controle dos políticos pelo poder econômico. Esta verdade simples tem
que ser afastada porque ela NEGA a essência do capitalismo
contemporâneo, que é a aniquilação do Estado enquanto força independente
no interior da sociedade. O Estado tem que ser colonizado, mantido sob
controle, neutralizado de todas as maneiras. A principal maneira de se
conseguir isso é BANDITIZANDO A POLÍTICA. Obrigamos os políticos a atuar
fora da lei, e o mantemos assim a uma distância segura de decisões mais
ousadas. O domador com o chicote na mão dentro da jaula é a grande
imprensa.
Voto em partidos, não em indivíduos. Propaganda EXCLUSIVAMENTE feita
pela televisão e pelo rádio. Proibição de campanhas publicitárias.
Restrição da comunicação política a programas simples, rodados em
estúdio, com os principais líderes políticos falando à nação sentados
numa poltrona, com uma câmera diante de si. Se alguém puder me dizer o
que a democracia perde com isto, eu agradeço. Parece-me óbvio o que ela
GANHA.
Não são todos os políticos que se elegem com base em esquemas
criminosos, isso é uma generalização inaceitável. Concordo com o voto em
lista partidária, mas faltou comentar sobre o financiamento público
exclusivo das campanhas, que é fundamental. Essa história de fazer
campanha política utilizando única e exclusivamente o rádio e a TV não
existe, é impossível, seja no Brasil ou em qualquer lugar do mundo,
substituir o contato direto entre os candidatos e a população através de
carreatas, passeatas, comícios, panfleteações nas praças, nas fábricas,
nos bairros, etc. E é bom que seja assim!!!
Por último, quero discordar radicalmente dessa tese de que todos os
candidatos tenham que fazer campanha olhando fixamente para uma câmera e
permanecendo sentados numa poltrona velha... Com todo o respeito, os
golpistas de 64, aqueles que destruíram a vibrante democracia brasileira
e implantaram um regime de terror cujos efeitos são sentidos até hoje,
implantaram sistema semelhante nas campanhas políticas aqui no Brasil,
tudo em nome da "ética, da moral e dos bons costumes"... O cidadão tinha
que ir para a frente da câmera, dizer seu nome, aí passava a legenda do
partido e ponto final. Ora bolas, isso aí não tem nada a ver com a
democracia, isso é sim um abuso e um cerceamento da própria
democracia!!! Democracia não é tutelar a maneira como os candidatos
fazem ou deixam de fazer suas campanhas, antes disso, é propiciar aos
candidatos condições de disputarem os pleitos com igualdade ou
proporcionalidade de recursos materiais. Daí a importância do
finaciamento público exclusivo para barrar o poder corruptor do dinheiro
legal e ilegal oriundo das grandes empresas e do crime organizado. Sou
totalmente contra a reedição das campanhas insípidas, inodoras e
incolores da ditadura militar...
Por Bento de Abreu
O financiamento público é a melhor saída para o combate à corrupção,
porém não pode ser visto como um milagre que salvaria a democracia.
Mesmo com o financiamento público, a prática de caixa 2 e portanto a
influência do capital nas eleições continuariam, o controle seria
difícil. Pode haver subfaturamento de produção de material de um lado e
produção clandestina de outro, por exemplo.Não existe "verdade simples"
em casos complexos.
Concordo com o Diogo quanto a crítica ao Jotavê, não existe campanha
somente na televisão, isso seria o fim da democracia. Alguns candidatos
tem sua força exatamente no corpo a corpo, outros no palanque e assim
vai. O Jotavê se prende as campanhas majoritárias, mas esquece que em
eleições presidenciais temos milhares de candidatos a deputado federal e
estadual, além de governador, senador e presidente. Não há como um
candidato a deputado fazer campanha pela TV numa eleição desse porte.
Jotavê, você é um cara bem ponderado e um bom crítico, não se prensa a
"verdade simples" existem muitas verdades pra tudo nessa vida, existem
opiniões e versões.
Ele exagerou em alguns pontos Diogo, mas no essencial eu concordo, ele também é a favor do financiamento exclusivamente público.
Quanto a proibição de campanhas nas ruas isso é absurdo e impossível
de ser feito e também não precisa ser só o candidato e a camera no
estúdio, acho que foi mais força de expressão. O que precisa é REDUZIR
os custos de campanha e isso é simples. Limitar a propaganda eleitoral
televisiva, que é a mais cara em alguns pontos (quem é da área
facilmente vai saber definir quais), e OBRIGAR as tvs a ceder o horário
de graça ou quase isso.
Como o Nassif bem falou, financiamento exclusivamente privado não
acabaria com o caixa 2, por óbvio, - até mesmo porque 90% ou mais das
empresas têm caixa 2, e não têm nada a ver com campanhas politicas, -
mas diminuiria e muito. Todos saberiam o valor da campanha e se os
gastos extrapolassem - os famosos sinais exteriores de riqueza - todos
poderiam agir para denunciar, desde colegas de partido, partidos
adversários e até mesmo órgãos de controle, TCU., CGU, etc.
Infelizmente me parece que esse projeto do deputado Henrique Fontana saiu da pauta da camara, precisaria voltar urgentemente.
Blog do Luis Nassif
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