No Sirio, em tratamento, Lula soube que seu arquiinimigo, Roberto
Civita, também estava internado, câncer na próstata, só que em situação
bem mais grave. Assim que foi informado, decidiu visitá-lo, apesar da
resistência de dona Marisa.
Desceram ao apartamento de Roberto Civita acompanhado do oncologista
de Lula, Roberto Kalil. Civita se emocionou com a visita e pediu
desculpas pelos ataques a Lula e ao filho. Lula lhe disse para não se
emocionar muito para não atrapalhar o tratamento.
Kalil viu sinais de ironia no alerta de Lula. Quem o conhece, viu a solidariedade para com o próximo.
A visita foi para a pessoa de Roberto Civita. Mas em nada mudou o julgamento de Lula sobre o publisher Roberto Civita.
Desdobramentos
Algumas deduções e desdobramentos da notícia acima.
Ganha consistência o rumor de que João Roberto Marinho esteve na Casa
Civil do governo Dilma, solicitando o empenho do governo para a não
convocação de Roberto Civita pela CPI, devido à doença. Da Abril ele
seria a única pessoa a poder responder pelos movimentos da Veja nos
últimos anos. Nenhum executivo - com exceção de Fábio Barbosa - tem
acesso às instâncias mais altas da República.
A notícia do agravamento da doença, além disso, lança nuvens de
suspeita sobre o futuro da editora. Os herdeiros não demonstram pique
para segurar o timão. Analista do mercado - com quem acabo de conversar
agora - julga que se encerra o ciclo Civita na mídia brasileira, sem
conseguir chegar até a terceira geração. Não significa o fim da Abril,
mas, a médio prazo, dos Civita à frente do grupo.
Roberto recebeu uma editora sólida do pai e teve oportunidades de
criar um império. A influência da mídia sobre o governo Sarney
permitiu-lhe conquistar uma rede de TV a cabo, a TVA. Depois, com a BOL,
foi o primeiro grupo de mídia a tentar explorar as possibilidades da
Internet.
Na segunda metade dos anos 90, junto com Otávio Frias de Oliveira,
tentou adquirir a Rede Bandeirantes. Na época, fiz uma espécie de meio
campo entre ele, Frias e João Saad.
Gradativamente, o grupo foi fracassando em todas as frentes. A BOL
acabou fundindo-se com a UOL - da Folha. Mais à frente, Civita foi
engolido por Luiz Frias que, na primeira capitalização do grupo,
adquiriu a participação da Abril. De um lado, Civita tentava reduzir o
endividamento. De outro, julgava que na hora em que quisesse, o conteúdo
do grupo permitiria montar uma nova UOL. Perdeu o bonde.
Mais tarde, também para reduzir a dívida, vendeu a TVA para o grupo
Telefonica, matando sua última oportunidade de virar um grupo
multimidia.
Finalmente, houve um processo de capitalização em que o sul-africano
Nasper adquiriu 30% da Abril. Outros 20% ficaram com duas holdings de
Delaware, cujo controle nunca foi revelado. Quando vendeu a TVA,
provavelmente a Abril recomprou os 20% adicionais.
Alguns anos atrás, a Abril lançou a toalha do lado midiático. Civita
passou a investir em educação, montando cursos apostilados e adquirindo
editoras de livros didáticos. O poder de intimidação da Veja, as
parcerias políticas permitiram avançar em algumas frentes.
Montou estratégias de ataques a concorrentes. Atacou um curso de
Ribeirão Preto com informações mentirosas. Depois, apoiou-se em uma ONG
recem aberta para ataques macartistas contra concorrentes. A aproximação
com jornalistas de outros veículos fez com que, uma semana depois de
conceder duas páginas ao livro de um deles, este publicasse em O Globo
artigo criminalizando politicamente livro de história de editora
concorrente.
Ainda há chão pela frente.
Mas a saga dos Civita, no Brasil, será conhecida por duas fases: a do
velho Victor Civita com suas histórias em quadrinhos, suas coleções de
livros de economia, filosofia e música, a ousadia em lançar Realidade,
Quatro Rodas e Veja. E a era de Roberto Civita, que errou em todas suas
estratégias e transformou a menina dos olhos da Abril - a revista Veja -
no mais repelente modelo de jornalismo que o país jamais teve em toda
sua história.
Blog do Luis Nassif
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