Não
deve ser fácil ser Aécio Neves. Aos 53 anos, ele parece desconfortável
com o papel que lhe coube na política nacional: de herdeiro do avô
Tancredo e a grande esperança branca do PSDB. Aécio é presidenciável,
seja lá o que isso quer dizer, mas foge do protocolo sempre que pode,
num impulso irresistível para por em prática seu bordão favorito: “a
alegria é a coisa mais séria da vida” (a frase foi emprestada do pintor e
escritor português Almada Negreiros). É o que parece mostrar o vídeo em
que ele aparece cambaleante num boteco do Rio dando uma gorjeta de 100
reais ao rapaz que o atendeu. As imagens não têm nada, mas, como no
episódio das fotos da balada do príncipe Harry, se alastraram feito
rastilho de pólvora na internet.
Em 2010, ele foi um dos Homens do
Ano da revista Alfa, que eu dirigia. Quem o entrevistou foi o excelente
repórter Lucas Figueiredo, mineiro também, conhecedor do personagem.
Foi uma negociação longa. Queríamos humanizar Aécio, abordando aspectos
pouco conhecidos de sua vida pessoal. Mas, até publicarmos, tivemos de
lidar com a turma de Aécio, que não sabe muito bem como lidar com Aécio.
Simpático, prosador, ele apareceu
no estúdio de JR Duran, na Vila Madalena, em São Paulo, para fazer as
fotos. Topou a ideia do fotógrafo de posar no papel de “candidato”: com
uma criança no colo; dando uma entrevista coletiva; colocando os pés
numa salmoura após uma caminhada de campanha. Fez piadas sobre José
Serra, seu arquiinimigo, mandou um abraço para a avó da editora de moda,
que também era de Minas. Enfim: um político.
Lucas conversou com cientistas
políticos, com a ex-namorada Maitê Proença, com amigos, gente do
governo etc. Encontrou Aécio em seu apartamento em Belo Horizonte. Aécio
indagou se ele gostava de cachaça (o alambique da família produz a
marca Matusalém). Relembrou suas aventuras na estrada. Queria percorrer o
litoral brasileiro de moto. Já tinha feito 2600 quilômetros, certa vez,
passando pelos Lençois Maranhenses e as praias de Santa Catarina. Disse
o que gostava de comer, suas bebidas prediletas (“uísque, no geral. Na
fazenda, cachaça”), seu perfume (Issey Miyake). Falou da filha. Até que
Lucas lhe perguntou sobre o uso de drogas. Aécio deu a resposta: “Todo
mundo teve 18 anos… Ah, experimentou um baseado com 18 anos? Sim. E
ponto-final”. A entrevista acabou ali.
Lucas entregou o perfil e nós
decidimos que iríamos publicá-lo no final do ano. Meses depois de
terminado o trabalho, Lucas ingressaria na campanha de Hélio Costa,
adversário do candidato de Aécio, Anastasia (que acabou eleito). A
assessora de imprensa de Aécio começou a me ligar. Insinuava que havia
uma armação para prejudicá-lo, que estava preocupada. A matéria, a
rigor, mostrava Aécio sendo Aécio. Nenhuma fofoca, nenhum dossiê, nenhum
escândalo. Mas não havia meios de tranquilizá-la. A pressão continuava.
Por fim, falaram com Roberto Civita, editor e dono da Editora Abril,
que publica Alfa. Civita me telefonou na redação e pediu,
gentilmente, para ler o texto. Mandei para ele, que leu e me devolveu na
seqüência, afirmando que não via problema nenhum.
A figura central na vida de Aécio
é Andrea Neves, sua irmã. Ex-presidente do Servas (Serviço Voluntário
de Assistência Social), ela é responsável pela coordenação de
comunicação dele. Tenta cuidar de sua imagem e controlar tudo o que o
cerca. Reservada, assertiva, de personalidade forte, Andrea é a antítese
e o complemento do irmão mais novo. Em seu blog,
ela se define candidamente: “Tenho péssima memória, mas acredito na
força das lembranças. E do destino. Tenho ido a São João Del Rei menos
do que gostaria. E, como Olavo Bilac, acredito que – de vez em quando – é
possível ouvir estrelas”.
Demos o perfil em dezembro.
Aécio era o nosso “político do ano”. Na foto da capa, ele está lá, todo
pimpão, segurando um bebê. Como eu disse, era o perfil de um homem, com
boas histórias contadas, sobretudo, por ele mesmo. Em abril de 2011,
Aécio foi parado numa blitz carioca e se recusou a fazer o teste do
bafômetro. Alguns jornais se lembraram do que ele contou para Alfa a
respeito das bebidas de que mais gostava. Como no caso do vídeo que caiu
na internet, Aécio estava sendo Aécio. Isso, aparentemente, é um enorme
empecilho – não apenas para ele, mas, eventualmente, para as pessoas
que enxergam em Aécio Neves algo que Aécio Neves, talvez, não saiba ou
não queira ser.
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