21.junho.2013 22:31:16
Às 17h30 da quinta-feira, 20, a esquina da Avenida Paulista com a Rua
Augusta era uma festa. Vinha gente de todo lado com cartazes defendendo
causas e causas. Alguns eram sofregamente improvisados ali mesmo, nas
calçadas, com cartolina e pincel atômico. Os mais divertidos e criativos
eram os que atacavam o pastor Marco Feliciano e seu projeto de lei
sobre a “cura gay”.
Foi mais ou menos nessa hora que apareceu o grupo de representantes
de partidos e sindicatos, com suas bandeiras e bumbos. Eram poucos,
pouquíssimos para o tamanho da manifestação, e foram recebidos com vaias
e gritos de "Oportunistas" e "Sem partido".
Eu estava ali por acaso. Havia ido ao Conjunto Nacional para uma
entrevista com dois antigos militantes de esquerda, os dois torturados
pela ditadura, hoje atuando em movimentos de direitos humanos. Ao
encerrar a conversa, fomos para a esquina, ver a manifestação organizada
pelo Movimento do Passe Livre para comemorar a redução das tarifas de
ônibus na cidade.
Os dois falaram com entusiasmo da mobilização popular. Diante das
vaias, dirigidas sobretudo ao PT, um deles, que já militou no partido,
comentou: “Isso é bom. O PT precisa aprender, precisa ver o quanto se
distanciou dos movimentos sociais.”
Os dois foram embora e eu fiquei. Acompanhei, da calçada, o grupo de sindicalistas e militantes partidários.
Ele foi hostilizado a cada passo. Sempre que alguém puxava palavras
de ordem contra sua presença na marcha, imediatamente surgiam vozes
dispostas a repicar. Logo se ouvia: “PT, vai tomar no cu”, “Puta que o
pariu, o PT é a vergonha do Brasil” e “Mensaleiro” .
Mas não foi só grito à distância. Desde que entrou na Paulista, o
grupo teve no seu encalço, quase colado, um bloco de pessoas dedicado a
insultá-lo e provocá-lo.
Às vezes saltava desse bloco algum manifestante. Geralmente bem
mais forte que a média, aparentando indignação desmedida e falta de
controle, fazia provocações cara a cara, xingava, erguia o
punho, até ser contido por alguém de seu próprio grupo ou por
manifestantes defensores da não violência.
Os pró-partido iam adiante, protegidos por um cordão humano, cujos integrantes tentavam não se descontrolar. Cheguei a imaginar que, em algum momento, chegaria algum reforço. Mas ele não veio. Na verdade, o grupo encolheu na caminhada.
Reconheci vários rostos entre os militantes que caminhavam de
costas – para poder encarar as investidas do bloco antipartido. Já
estive com eles em entrevistas e coberturas de ações de movimentos
populares. Em sua maioria são pessoas ligadas à luta pela reforma
agrária, por moradia, direitos dos indígenas, direitos humanos. Gente
que fica mais à esquerda, critica as alianças do PT com setores
conservadores e defende a presença dos manifestantes na rua.
O bloco dos antipartido, em determinados momentos se aproximava, depois recuava. Parecia uma tática para aumentar o medo. A
certa altura, o bloco foi dividido: de maneira organizada, uma parte
passou para a outra pista da Paulista e se alinhou ao grupo pró-partido.
Começou a provocá-lo pela lateral.
Em três momentos da minha caminhada, que foi da esquina da
Augusta ao Edifício Cásper Líbero, entre as alamedas Campinas e Joaquim
Eugênio de Lima, presenciei palmas e urros de vitória ao redor de rodas
que surgiam do nada. Nas três vezes o motivo era o mesmo: bandeiras
subtraídas à força dos militantes pró-partido estavam sendo rasgadas e
queimadas. De todos os lados se erguiam mãos empunhando celulares para
registrar a cena.
Nas proximidades do Edifício Cásper Líbero, a marcha parou. Me
afastei um pouco do grupo, para ver o que ocorria adiante e encontrei um
bloco isolado, ameaçando seguir para a sede da Assembleia Legislativa.
Na linha de frente, esses manifestantes estendiam a faixa mais bem
produzida que vi na marcha, uma espécie de banner com quase cinco metros
de comprimento. Dizia: “Lula, o câncer do Brasil”.
Ao voltar, só encontrei confusão.
O grupo antipartido que havia saído pela lateral retornara à pista
original, mas dessa vez à frente do pró-partido. Com essa manobra,
conseguiu cercar e isolar os militantes e desfechar o ataque final. Após
quase duas horas de humilhações, o grupo pro-partido se retirou, sem
bandeiras, sob chutes, socos e gritos.
Entre os agressores, muitos traziam o rosto coberto com máscaras e
toucas ninja. As bandeiras que eles arrancavam das mãos dos militantes
eram destruídas sob aplausos e celulares.
Um militante da turma petista, a mais perseguida, me contou
depois que levou vários socos e só conseguiu escapar porque partidários
do PSOL o acolheram como se fosse um deles.
Ao buscar meu carro, num estacionamento da Alameda Santos, encontrei a
moça do caixa assistindo à marcha pela TV. Antes de me atender, ela
comentou com o chefe, atrás dela: “Viu? Não sei o que esse PT foi fazer
na Paulista. Tudo isso que está acontecendo é contra eles, não é?”
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O MOVIMENTO DO PASSE LIVRE APOIOU A PRESENÇA DE PARTIDOS
O ataque aos partidos já era esperado. Em São
Paulo, em duas manifestações anteriores, militantes do PSOL e do PSTU,
os partidos que mais apoiaram as marchas, haviam sido hostilizados e
sofrido violências. Isso tornava temerária a proposta de voltar à
Paulista.
A questão foi avaliada na reunião de organização da marcha, na
sede do Sindicato dos Advogados, na tarde de quarta-feira. A maior parte
dos participantes concluiu que seria um recuo inaceitável, do ponto de
vista das liberdades democráticas, abdicar da presença dos partidos. na
manifestação. Ao final da discussão, representantes do PT, PSOL, PSTU e
PCB decidiram ir e levar suas bandeiras.
Os representantes do Movimento do Passe Livre apoiaram a
decisão. Deixaram claro que são apartidários, mas não se opõem à
existência dos partidos. A única exigência do movimento tem sido quanto à
organização: as reivindicações sobre transporte coletivo devem aparecer
com destaque. Bandeiras de partidos não podem se sobrepor à faixas do
Passe Livre.
Blog do Luis Nassif
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