terça-feira, 7 de agosto de 2012

Apesar do apelo da mídia, desmobilização marca julgamento

 Apesar da imprensa insistir na tese de que este é o maior julgamento da história, o povo parece pouco interessado. Na área externa ao STF, nada de manifestações ou protestos. Mesmo dentro da corte, sobressaem os espaços vazios. O público passa, posa para foto e segue. “Essa desmobilização é uma frustração para muita gente que esperava o clamor das ruas pedindo a condenação dos réus”, diz o advogado Márcio Thomaz Bastos.


Brasília - O enredo até parecia favorável à sustentação da tese defendida pela imprensa de que o julgamento da ação penal 470, o chamado “mensalão do PT”, seria o maior da história do país: 38 réus, 5.508 folhas de processos, 600 testemunhas ouvidas, dezenas de perícias, 150 advogados, 500 jornalistas credenciados, expectativas de grandes protestos e mobilizações. Mas a realidade do Supremo Tribunal Federal (STF) e seu entorno nesses quatro dias de julgamento revela um cenário bastante adverso. Pelo menos até agora, a desmobilização social é a principal marca.

“Essa desmobilização é uma frustração para muita gente que esperava o clamor das ruas pedindo a condenação dos réus”, ironiza o advogado Márcio Thomaz Bastos, que defende o ex-executivo do Banco Rural, José Roberto Salgado. Animado com as sustentações orais já apresentadas pelos colegas, o ex-ministro da Justiça do governo Lula acredita que o ambiente real em que se dá o julgamento, ao contrário do criado pela imprensa, é bastante favorável à defesa. “Ah, está muito tranquilo”, observou, após dar uma longa mirada no vazio que imperava na área externa à corte.

Os 38 réus, para preservarem suas imagens, não apareceram. Os 150 advogados, por dever de ofício, se revezam durante as sessões. Pelo menos os ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes já foram flagrados dormindo. A ministra Carmen Lúcia se ausentou após o intervalo desta terça.

O público dá uma passada, registra uma foto e segue caminho. Na maioria das vezes, são estudantes de direito ávidos por comprovar tempo de tribunal, que ajuda a contar pontos para o estágio obrigatório. “É uma oportunidade e tanto estar na corte no dia de um julgamento desses. O público é que parece pequeno. Mas se eu conseguir o certificado, já valeu o esforço”, afirmou o estudante da Universidade Católica de Tocantins, Ítalo Schelive, que acompanhou o julgamento, nesta terça, com um grupo de 40 colegas. Eles posaram para fotos, ajudaram a compor as imagens que estarão nos jornais amanhã e, após meia-hora, preferiram seguir o passeio turístico por Brasília.

Mesmo o número de jornalistas presentes míngua a cada dia. Na segunda (6), a assessoria de comunicação do STF consultou jornalistas não credenciados sobre o interesse de acompanharem o júri no plenário. Menos de um terço dos 75 cadastrados inicialmente poucos ocupavam seus postos na corte. Mas a repescagem parece não ter surtido efeito. Mesmo com o reforço, apenas 19 ocupavam seus postos na corte, nesta terça, às 15:40 horas, no auge da sessão. Dos 90 que conseguiram credenciais para ocupar a sala de imprensa, no andar superior, haviam 31. No pátio externo, não mais do que 50, incluindo técnicos e motoristas.

Um único manifestante solitário compareceu à Praça dos Três Poderes, parcialmente isolada com cercas de ferro pela segurança do tribunal. E não era para criticar a corrupção ou o PT, mas sim o próprio Judiciário. “Ainda bem que temos a Eliana Calmon para salvar o Judiciário” e “O STF também está no banco dos réus” diziam as duas faixas que postava. Era o dentista Francisco Lima, morador da cidade satélite de Sobradinho, que confessou sua decepção com a desmobilização em torno do tema. “No primeiro dia, havia mais três manifestantes. Hoje, só eu. O que está em julgamento, aqui, é o próprio STF que, por conta da sua inoperância, demorou sete anos para colocar o processo em julgamento. Agora, a população nem se lembra mais o que foi o mensalão”, considerou.

O ambulante Antônio Monteiro, que já contabiliza um prejuízo nas vendas de mais de 50%, desde o início do julgamento e o consequente isolamento da praça, faz uma outra análise, porém com sustentação no mesmo descrédito imputado à corte. “O STF já está desenganado pela população. Ninguém mais se interessa por seus julgamentos políticos viciados. As pessoas querem é mais escolas e hospitais”, opinou.


Fotos: Najla Passos
Carta Maior

Nenhum comentário:

Postar um comentário