por Conceição Lemes
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e a mídia têm
entalado o ministro Ricardo Lewandoswki, do Supremo Tribunal Federal
(STF).
No julgamento do “mensalão”, Lewandowski não cedeu à
espetacularização do Ministério Público (MP) e às condenações
midiáticas. Rejeitou a pressão maciça da chamada grande imprensa,
encarando-a com dignidade e seriedade. Honrou a toga e o Direito
brasileiro. Fez o que se esperava de alguém na sua posição: Justiça e
defesa do Estado democrático no País.
Perguntado por esta repórter o que achava de Lewandowski ter sido até insultado pela mídia, o professor Dalmo de Abreu Dallari, um dos mais renomados e respeitados juristas brasileiros, respondeu:
A mesma imprensa que faz referências
agressivas ao ministro Lewandowski é a que vem exigindo a condenação e
não um julgamento imparcial e bem fundamentado de todos os casos. É a
mesma imprensa que aplaudiu o STF, quando ele, no início do julgamento
do chamado mensalão, passou por cima das nossas leis, extrapolando a sua
competência. Nesse caso, o ministro Lewandowski tem sido o verdadeiro
guardião da Constituição brasileira.
Pois neste final de semana o ministro sofreu novo ataque, pesadíssimo.
A revista Época publicou
matéria sobre a prisão do britânico Michael Misick pela Polícia
Federal. A ordem partiu de Lewandowski, após ser alertado pela embaixada
do Reino Unido sobre um mandado de prisão contra Misick. Tempos depois,
Lewandowski teve de soltá-lo. Misick já havia pedido refúgio no Brasil e
o Reino Unido não juntou aos autos os documentos originais relativos à
extradição dentro de 60 dias, que é o prazo exigido por lei.
Lewandowski tomou ainda uma série de precauções: Misick teve de
entregar o passaporte ao STF, está sendo monitorado pela PF, não pode
deixar o Estado de São Paulo e é obrigado a visitas semanais a um juiz.
A matéria, porém, é um assassinato de reputação. Acusa Lewandowski
de parcialidade em favor de advogados do PT. Só que não explica as
razões jurídicas para duas decisões distintas e, ainda, diz uma série de
inverdades.
Para Luis Nassif,
a fonte da matéria é a própria Procuradoria Geral da República — do
Procurador Geral Roberto Gurgel, diretamente ou através de emissários:
“A baixeza do ataque reforça as suspeitas sobre os jogos políticos da
PGR. E dão um argumento a mais para os inimigos do Ministério Público”.
Já uma fonte do Judiciário põe essa matéria difamatória mais na conta da empresa que edita a Época — leia-se Globo — e um dos jornalistas que a fez.
De qualquer forma, por trás dessa vilania, estariam a indicação do
próximo ministro do STF pela presidenta Dilma em substituição a Ayres
Britto, que se aposentou, e as eleições presidenciais de 2014.
Em nota ao Viomundo, a assessoria do ministro Ricardo Lewandowski esclarece:
1) A nova orientação jurisprudencial do STF sobre a extradição evoluiu no sentido de não mais exigir a prisão preventiva automática dos extraditandos, salvo em situações excepcionais, a saber, quando estes apresentem periculosidade ou exista risco de fuga iminente.
2) Essa alteração jurisprudencial deu-se porque a Corte passou a
entender que não se poderia manter uma pessoa presa, em meio a
criminosos com condenações definitivas, durante todo processo de
extradição, por ser ele muito complexo e demorado, não sendo raro que se
conclua pelo indeferimento do pedido extradicional.
3) O caso do Miscik é distinto dos demais, assemelhando-se ao caso
Battisti, por ter aquele, tal como este, buscado formalmente refúgio no
País e, portanto, encontrar-se sob a proteção do Estado brasileiro.
4) O tratado de extradição firmado entre o Brasil e o Reino Unido
determina que, se os documentos originais relativos à extradição não
forem juntados aos autos do processo dentro de 60 dias, a prisão do
extraditando deve ser imediatamente relaxada.
5) O prazo do tratado foi ultrapassado, sem que o Reino Unido tivesse
apresentado no Supremo os documentos exigidos, nos autos do processo.
Isso é fato.
6) A Lei de Refúgio, ademais, determina a suspensão dos processos de
extradição pelo tempo em que o pedido de refúgio estiver sendo
apreciado pelo Ministério da Justiça.
7) Tecnicamente, pois, o indivíduo que ingressa com pedido de refúgio não ostenta a condição de extraditando.
8) Tendo em conta que inexiste prazo para a apreciação do pedido de
refúgio, não se mostra razoável manter-se alguém preso indefinidamente
no aguardo de uma decisão administrativa, ou seja, que não depende do
Judiciário.
9) A ilegalidade da prisão do extraditando era manifesta e poderia ser atacada por meio de um habeas corpus junto ao Plenário do Supremo.
10) O extraditando está sob a supervisão de um juiz criminal em São
Paulo, ao qual deve apresentar-se semanalmente para justificar as suas
atividades, achando-se também sob a vigilância da Polícia Federal, não
lhe sendo lícito sair do Estado, sem autorizão judicial.
11) De resto, o seu passaporte está retido no STF.
12) Transcrevo abaixo, em negrito, alguns trechos da Lei de Refúgio que se aplicam ao caso:
REFUGIADOS
LEI N. 9.474, DE 22 DE JULHO DE 1997
Define mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951, e determina outras providências.
O Presidente da República:Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:TÍTULO IDos Aspectos CaracterizadoresCAPÍTULO IDo Conceito, da Extensão e da ExclusãoSEÇÃO IDo ConceitoArtigo 1º – Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;II – não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;III – devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.SEÇÃO IIDa ExtensãoArtigo 2º – Os efeitos da condição dos refugiados serão extensivos ao cônjuge, aos ascendentes e descendentes, assim como aos demais membros do grupo familiar que do refugiado dependerem economicamente, desde que se encontrem em território nacional.(…)
CAPÍTULO IIDa Condição Jurídica de RefugiadoArtigo 4º – O reconhecimento da condição de refugiado, nos termos das definições anteriores, sujeitará seu beneficiário ao preceituado nesta Lei, sem prejuízo do disposto em instrumentos internacionais de que o Governo brasileiro seja parte, ratifique ou venha a aderir.Artigo 5º – O refugiado gozará de direitos e estará sujeito aos deveres dos estrangeiros no Brasil, ao disposto nesta Lei, na Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951 e no Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967,cabendo-lhe a obrigação de acatar as leis, regulamentos e providências destinados à manutenção da ordem pública.Artigo 6º – O refugiado terá direito, nos termos da Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, a cédula de identidade comprobatória de sua condição jurídica, carteira de trabalho e documento de viagem.(…)
CAPÍTULO IIDa Autorização de Residência ProvisóriaArtigo 21 – Recebida a solicitação de refúgio, o Departamento de Polícia Federal emitirá protocolo em favor do solicitante e de seu grupo familiar que se encontre no território nacional, o qual autorizará a estada até a decisão final do processo.§ 1º – O protocolo permitirá ao Ministério do Trabalho expedir carteira de trabalho provisória, para o exercício de atividade remunerada no País.§ 2º – No protocolo do solicitante de refúgio serão mencionados, por averbamento, os menores de quatorze anos.Artigo 22 – Enquanto estiver pendente o processo relativo à solicitação de refúgio, ao peticionário será aplicável a legislação sobre estrangeiros, respeitadas as disposições específicas contidas nesta Lei.
(…)Artigo 30 – Durante a avaliação do recurso, será permitido ao solicitante de refúgio e aos seus familiares permanecer no território nacional, sendo observado o disposto nos §§ 1º e 2º do artigo 21 desta Lei.
(…)
TÍTULO V
Dos Efeitos do Estatuto de Refugiados Sobre a Extradição e a Expulsão
CAPÍTULO I
Da Extradição
Artigo 33 – O reconhecimento da condição de refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio.
Artigo 34 – A solicitação de refúgio suspenderá, até decisão definitiva, qualquer processo de extradição pendente, em fase administrativa ou judicial, baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio.
Artigo 35 – Para efeito do cumprimento do disposto nos artigos 33 e 34 desta Lei, a solicitação de como refugiado será comunicada ao órgão onde tramitar o processo da extradição.
(…)
TÍTULO VIII
Das Disposições Finais
Artigo 47 – Os processos de reconhecimento da condição de refugiado sério gratuitos e terão caráter urgente.
Artigo 48 – Os preceitos desta Lei deverão ser interpretados em harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, com a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, com o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967 e com todo dispositivo pertinente de instrumento internacional de proteção de direitos humanos com o qual o Governo brasileiro estiver comprometido.
Artigo 49 – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Em tempo 1: Roberto Gurgel ficou sentado anos sobre a
denúncia contra o ex-senador Demóstenes Torres. A feita contra o
senador Aécio Neves (PSDB-MG) e sua irmã Andrea Neves por sonegação
fiscal e ocultação de patrimônio está caminhando para isso. Ela já dorme na gaveta do procurador-geral da República há quase 2 anos.
Em tempo 2: Os detratores se esquecem que estão
difamando o futuro presidente do Supremo Tribunal Federal. Em novembro
de 2014, o ministro Joaquim Barbosa deixa a presidência do STF e
Lewandowski, atual vice, assume-a. Certeza de Justiça, defesa
intransigente do Estado democrático e das garantias individuais. Um
verdadeiro guardião da Constituição brasileira.
Viomundo
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